Título: Falta de coordenação afeta reação governista
Autor: Raymundo Costa e Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 07/11/2005, Política, p. A7
A crise ética que paralisa o governo levou de roldão o núcleo duro palaciano e provocou uma reformulação forçada na coordenação política que, no entanto, ainda não está agradando aos líderes aliados no Parlamento. No lugar da briga de egos petistas, com personalidades fortes vindas da campanha de 2002, que levou o quarto andar do Palácio a ser batizado de "Faixa de Gaza", há agora um grupo mais homogêneo e menos paulista. Só que a nova direção não pôs fim aos problemas. Os aliados continuam reclamando que falta orientação palaciana para enfrentar a guerra com a oposição e orientar rumos no plenário. "Não vi nenhum resultado concreto até o momento", cravou o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP). Do novo staff, fazem parte o ministro da Coordenação Política, Jaques Wagner, da Fazenda, Antonio Palocci, da secretaria-geral, Luiz Dulci, da Casa Civil, Dilma Roussef, da Justiça, Marcio Thomaz Bastos e da Integração Nacional, Ciro Gomes. Eles se encontram todo dia, das 8h às 9h, na sala de reuniões do 3º andar do Planalto. Analisam a conjuntura da crise, avaliam as investigações das CPIs, estudam as reações às denúncias, acompanham a pauta do Legislativo. Mantêm ainda a reunião da segunda, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As reuniões posteriores são, basicamente, para operacionalizar as decisões do encontro com Lula. Na sexta, é comum o grupo fazer um balanço e projetar os dias subseqüentes. Só que esse novo estilo ainda não surtiu efeitos no Congresso, onde o Executivo arde na fogueira desde o estouro do esquema de corrupção nos Correios, mais quente ainda agora, quando os parlamentares começam a identificar que parte dos recursos do esquema do publicitário Marcos Valério veio do Banco do Brasil. Petistas, líderes governistas e aliados do Planalto não conseguem esconder a desolação com a falta de articulação. Greenhalgh foi perdendo gradativamente o entusiasmo com as falhas da gestão Lula. Reconhece que o relacionamento entre as bancadas petistas, tanto na Câmara quanto no Senado, está mais harmônico. "Mas é um esforço nosso, no Congresso. Não tem nada a ver com o novo formato de coordenação". O líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE), admite que Jaques Wagner tem se esforçado para consertar os estragos de uma convivência tumultuada ao longo dos últimos três anos. O relacionamento do Planalto com sua base aliada só foi bem azeitado em 2003. Desde o início de 2004, os dois lados passaram a falar idiomas completamente diferentes. "O ministro está tentando parar um trem em alta velocidade. Pode conseguir, mas demora um pouco", acrescentou o petebista, mantendo uma dose de otimismo. Outro fator que ajuda na diminuição dos atritos, na avaliação de assessores governistas, é que a maior parte dos integrantes do gabinete de crise não pretende disputar eleições no próximo ano."A ausência de projetos pessoais diminui a necessidade de briga por espaço", reconhece outro interlocutor do Planalto. Do outro lado da Praça dos Três Poderes, nada de felicidade. Vice-líder do governo na Câmara e um dos deputados mais próximos do presidente Lula, Sigmaringa Seixas (PT-DF) chegou a ser irônico: "Há um grupo que vem se reunindo, é?". A ironia deu lugar ao desânimo. Para Sigmaringa, as conversas políticas no Parlamento estão acontecendo a partir de iniciativas isoladas. Ele reconhece que um líder ou vice-líder governista não precisa ficar recebendo ordens do Planalto para agir. "Mas precisa de respaldo político, até para ajudar no trânsito entre as bancadas", cobrou Sigmaringa. O parlamentar petista teme o acirramento. Atribui parte da crise à oposição. Mas admite que o Planalto também tem culpa. "Se estão de fato conversando para afinar o discurso, fazem isso ao largo de muitos parlamentares que poderiam contribuir", lamentou Sigmaringa. Outro vice-líder governista na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS), "saúda a iniciativa, ainda que não sinta a repercussão destes fatos na Câmara". É fundamental, para o parlamentar gaúcho, atenção nas ações cotidianas. "Continua havendo ministros de salto alto, que não recebem os parlamentares em audiência", reclamou o deputado do PSB. Sem citar nomes, Beto afirma que tenta, junto a um dos ministros da nova safra, uma audiência há três meses e nada de ser recebido. Em sua visão, se isso acontece com ele, que, teoricamente, tem um cargo de liderança, quem dirá com outros deputados. "Não adianta querer enganar que as coisas estão acontecendo. Não estão", resumiu Beto.