Título: Para setor privado, Brasil já ofertou o "máximo possível"
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 09/11/2005, Especial, p. A

O setor privado brasileiro classificou de "realista" a barganha proposta pelo Brasil nas negociações da Rodada Doha, da Organização Mundial de Comércio (OMC). O país aceitaria cortar em 50% as tarifas do setor industrial, caso a UE se comprometa com redução média de 54% das tarifas agrícolas. A oferta foi apresentada na segunda-feira pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, em Londres. Mesmo a indústria, que é quem paga a conta da negociação, não reclamou. Lúcia Maduro, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), disse que a proposta do Brasil "está alinhada" com a posição da entidade. A Coalizão Empresarial Brasileira (CEB) já havia informado ao governo que essa oferta era o "limite máximo suportável". O diretor de comércio exterior do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), Humberto Barbato, também afirmou que a proposta do Brasil é aceitável. "Representa um sacrifício, mas a indústria está fazendo isso para mostrar boa vontade na negociação", disse. Só que ele duvida que a UE atinja a contrapartida exigida pelo Brasil na agricultura. A atual oferta da UE prevê um corte médio de 39% das tarifas agrícolas. "Se eles não melhorarem a oferta, não vale a pena chegar nesse ponto na indústria", diz. Lúcia, da CNI, lembra que as negociações da OMC serão a base para os acordos regionais. Ou seja, se o Brasil quiser fechar a Acordo de (Alca) ou o acordo com a União Européia, a indústria terá que pagar mais uma vez. O Brasil se dispôs a adotar a fórmula Suíça com coeficiente 30 para a redução das tarifas industriais. Isso significa corte real para 2.474 produtos, ou 28% do total. Considerado um "sacrifício" pela indústria, está longe de atender a demanda dos países ricos. Ao oferecer o corte médio de 39% das tarifas agrícolas, a UE pediu que as taxas industriais fossem reduzidas com base na fórmula Suíça com coeficiente 10: corte real para 62% das taxas, ou 5.480 produtos. Mário Marconini, analista de comércio exterior e ex-economista da OMC, considerou a proposta européia um "blefe" e "falta de boa-fé", enquanto a proposta brasileira parece "realista" com equivalência "razoável". "Se a UE fosse mais ambiciosa em agricultura, poderíamos andar até um pouco mais em indústria", avaliou Marconini. "Dependendo da negociação, poderá haver exigências de mais movimentos do Brasil. Mas, no momento, não vale a pena", reconheceu. Ele reforça que a abertura na indústria só compensa se a UE colocar na mesa o que o Brasil pede em agricultura. André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), considerou a proposta equilibrada, mas está preocupado. "Do ponto de vista agrícola, não podemos restringir a negociação a um corte médio das tarifas agrícolas", diz. Ele ressalta que é preciso também reduzir o número de produtos sensíveis e conseguir cotas ambiciosas em contrapartida. Para Rubens Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a proposta brasileira está de acordo com o que foi discutido com a indústria. Mas ele alerta para o protecionismo da UE, que se recusa a melhorar sua proposta. Barbosa, que foi embaixador do Brasil em Washington, teme que os países reduzam as ambições para a reunião ministerial de Hong Kong em dezembro. Para salvar o encontro, ele avalia que existe o risco de os países aprovarem apenas um documento com as regras do acordo, deixando o tamanho dos cortes e os prazos para 2006.