Título: Argentina anuncia pacote contra inflação
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 11/11/2005, Internacional, p. A10

Preços em alta Governo quer desestimular exportação de produtos básicos e vai elevar compulsório dos bancos

Superada a etapa eleitoral, o governo argentino anunciou ontem um pacote de medidas para tentar conter o avanço da inflação. O país deve fechar o ano com uma taxa superior a 11%. A iniciativa tenta fazer com que o ritmo dos aumentos desacelere por meio da queda nos custos das empresas, incremento da oferta de produtos básicos e diminuição da quantidade de dinheiro em circulação. O pacote foi anunciado ontem pelo ministro da Economia, Roberto Lavagna, e marca uma mudança de atitude das autoridades em relação ao que vinha sendo feito no período anterior às eleições de outubro. Até a eleição, o governo vinha colocando em prática medidas de estímulo à demanda, ao mesmo tempo em que culpava o empresariado por aumentos abusivos que estariam provocando a escalada inflacionária. "O sentido de todas as medidas tem a ver com reduzir custos e trabalhar a favor da estabilidade de preços", disse Lavagna em entrevista coletiva na Casa Rosada, depois de reunir-se com o presidente Néstor Kirchner. Para aumentar a oferta de produtos no mercado interno, foram suspensas restituições de impostos concedidas a exportadores de 200 artigos básicos, principalmente alimentos como carne de boi, frango, peixe, leite e derivados, farinha e óleos vegetais. Lavagna admitiu haver um conflito entre o objetivo de combater a inflação e o de estimular exportações, mas disse que, no momento, a prioridade será dada à contenção dos preços. O ministro também reconheceu que uma das causas da inflação argentina é a dificuldade em conseguir atender a demanda, já que a economia deve encerrar esse ano com crescimento de 9%. Muitos setores estão operando no limite da capacidade instalada. Até poucas semanas atrás, o governo dizia considerar a inflação consequência de ajustes de preços relativos como rescaldo da desvalorização de janeiro de 2002. "Há uma contradição [entre oferta e demanda] de curto prazo que se resolve à medida que a produção aumenta, mas isso requer tempo", afirmou, referindo-se à necessidade de que a economia receba mais investimentos. O custo maior da medida cai sobre o setor agropecuário, que já tem suas vendas externas taxadas com um imposto de importação, que varia de 5% a 20%, e perde a compensação parcial do reembolso, que na média era de 5% sobre o valor exportado. O ministro também informou ter pedido ao Banco Central que aumente o compulsório, proporção de dinheiro que os bancos têm de manter imobilizado, para diminuir a liquidez. As medidas serão operadas pelo BC, e até ontem não haviam sido detalhadas. A iniciativa busca retirar pesos de circulação, ao mesmo tempo em que o Banco Central poderia seguir sua política de compra de dólares para manter a moeda argentina desvalorizada. O peso "competitivo" é um dos principais eixos da política econômica. Lavagna afirmou que, por esse mecanismo, a retirada de pesos da economia ocorrerá "sem custo", e as autoridades vão elaborar um esquema para que os recursos retidos com a ampliação do compulsório possam ser liberados, desde que sejam investidos em projetos de longo prazo. Outros itens do pacote visam baixar custos de operação das empresas. Foi reduzida a indenização paga aos trabalhadores do setor privado que são demitidos, de 180% do salário por ano trabalhado para 150%. Também haverá modificações nas regras para indenizar trabalhadores em caso de acidente no exercício da função. Segundo Lavagna, a legislação aprovada no ano passado, que passou a permitir que o trabalhador entre na Justiça contra o empregador, está dando origem a uma "indústria de processos" que vem tendo um impacto negativo sobre a estimativa de custos das empresas. Uma proposta de reforma será apresentada em duas semanas.