Título: STJ acaba com crédito-prêmio de IPI
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 10/11/2005, Brasil, p. A3

Tributação Decisão favorece o governo e impede compensação do tributo por exportadores

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, ontem, que as empresas não podem mais usar o crédito-prêmio de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) às exportações. A decisão foi tomada pela 1ª Seção do STJ, por cinco votos a três, e marcou uma derrota de empresas e tributaristas. O crédito existe desde 1969 e era utilizado para compensar tributos. Ao exportar, as empresas pediam ao governo um crédito equivalente à alíquota interna do IPI. Com a derrota, os tributaristas deverão recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar reaver o direito ao crédito. O governo calcula que as empresas tiravam dezenas de bilhões de reais dos cofres públicos com esse benefício fiscal. O procurador-geral-adjunto da Fazenda Nacional, Francisco Tadeu Barbosa de Alencar, afirmou que existiam pedidos das empresas junto à Receita Federal para compensar R$ 15 bilhões apenas em 2002 e 2003. Os tributaristas que acompanharam o julgamento lamentaram o resultado, pois o STJ vinha concedendo o crédito até junho de 2004, quando resolveu rever a questão. Para o advogado Nabor Bulhões, existia "jurisprudência pacífica do STJ" a favor das empresas. "A mudança na jurisprudência do STJ é preocupante, pois compromete a credibilidade de seus pronunciamentos como tribunal da Federação", criticou Bulhões. Para o tributarista Ives Gandra Martins, a decisão foi um retrocesso no setor exportador, justamente o que, segundo a avaliação dele, tem o melhor desempenho do governo Lula. "Durante todos estes anos, as empresas simplesmente seguiram a orientação do governo e, agora, com a mudança de orientação, o ônus será suportado apenas pelos exportadores", afirmou Martins. "Claro que o setor terá que ver com cautela qualquer estímulo futuro à exportação que o governo estabelecer", advertiu o tributarista. O fim do crédito-prêmio de IPI foi decidido no julgamento da empresa Selectas contra a Fazenda Nacional. A Selectas obteve o direito a compensar tributos com suas exportações na 1ª instância da Justiça. O governo recorreu ao Tribunal Regional Federal de Brasília e perdeu novamente. Houve, então, novo recurso, dessa vez ao STJ. O tribunal já possuía mais de cem decisões favoráveis às empresas e a expectativa era a de que a Selectas também conseguisse o benefício. Mas, a 1ª Seção do STJ, responsável por definir temas tributários controversos no tribunal, resolveu rediscutir o assunto. Em setembro do ano passado, os ministros Teori Zavascki, Francisco Falcão e Luiz Fux votaram a favor do governo. Eles concluíram que, em 1979, o governo impôs um cronograma para extinguir o benefício fiscal em 30 de junho de 1983. O cronograma previa reduções progressivas de 10% e 20% no crédito de IPI e foi detalhado no Decreto-lei nº 1658. O ministro João Octávio de Noronha pediu vista do processo em 22 de setembro de 2004 e, ontem, levou o caso de volta a julgamento. Noronha disse que o benefício nunca foi revogado. Segundo ele, outros decretos-lei citaram a existência do crédito-prêmio de IPI, antes e depois de junho de 1983, o que provaria a sua validade. Os ministros Castro Meira e José Delgado seguiram Noronha. Meira e Noronha alertaram para a necessidade de o STJ preservar os entendimentos de decisões anteriores. "É interessante manter a jurisprudência firmada há tempos pelo tribunal, pois não existe Justiça sem segurança jurídica", enfatizou Noronha. "O cidadão tem que ter segurança e certeza da estabilidade do Judiciário", completou Meira. Mas, os ministros Peçanha Martins e Denise Arruda decidiram o processo a favor da Fazenda. Ambos seguiram o entendimento de Luiz Fux de que o benefício fiscal acabou em 1983. "O Decreto-lei nº 1658 dispôs taxativamente acerca da extinção do crédito-prêmio", disse Fux. O resultado do processo da Selectas será a nova orientação do STJ para todos os casos em que empresas pedem o crédito de IPI. O procurador-geral da Fazenda Nacional, Manoel Felipe Rêgo Brandão, afirmou ontem que a decisão definitiva do STJ, contrária à tese das empresas sobre o crédito prêmio de IPI, vai permitir que as 1,5 mil ações em andamento na Justiça tenham sentenças favoráveis à União. Comentando as "perdas potenciais" do Tesouro, se o governo tivesse sido derrotado ontem no STJ, Brandão afirmou que o rombo seria de US$ 5,5 bilhões por ano. Considerando o câmbio de R$ 2,20, o valor anual é de R$ 12,1 bilhões. Esses cálculos são diferentes dos que foram feitos pelo mesmo procurador há dois dias, em entrevista ao Valor. Ele explicou que essa conta de ontem é "arredondada" para facilitar a compreensão dessa complexa questão. Ele considerou exportações de US$ 115 bilhões nos últimos 12 meses. Além disso, tomou como 50% a participação de manufaturados na pauta de vendas externas. Mas, segundo Brandão, esses não são os únicos números corretos para expressar a ameaça que a Fazenda conseguiu evitar. (Colaborou Arnaldo Galvão).