Título: O caminho incerto da GM e da Ford
Autor: Marli Olmos
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2005, Empresas &, p. B6

A General Motors (GM) ainda insiste em referir a si mesma como "a maior fabricante de automóveis do mundo". Mas algumas pessoas - incluindo funcionários da companhia - começam a temer que ela também poderá se tornar a maior concordata já registrada no mundo. E a segunda maior montadora dos Estados Unidos, a Ford, também poderá fazer o mesmo. Em 17 de outubro, a GM foi bem sucedida ao destacar um ponto positivo em seu decepcionante relatório sobre os resultados do terceiro trimestre. As ações da companhia, inicialmente, deram um salto de 10% em resposta à sua afirmação de que começa a resolver o problema da disparada dos custos referentes a planos de saúde de funcionários e aposentados. Eliminar US$ 1 bilhão de sua conta anual de cuidados com a saúde, de US$ 6 bilhões, através de um acordo com os sindicatos, é de fato uma conquista. Mas a verdade é que a GM ainda perdeu US$ 1,6 bilhão no terceiro trimestre, elevando os prejuízos anuais para US$ 3,8 bilhões no ano, até agora. Apesar dos fortes números das operações chinesas e de um começo de recuperação na Europa, seu principal mercado, a América do Norte, respondeu pelas perdas. A GM está praticamente dando seus carros e picapes este ano, com um programa de incentivo que oferece aos clientes comuns descontos normalmente concedidos aos funcionários. Apesar disso, a participação de mercado da montadora registrou uma queda desastrosa no trimestre julho-setembro, para 25,6%, em comparação a 28,5% no mesmo período de 2004. Houve dois pequenos pontos positivos. A GMAC, unidade financeira do grupo, registrou um lucro líquido de US$ 675 milhões no trimestre, grande parte dele resultante dos financiamentos de vendas de automóveis e caminhões. E Rick Wagoner, o presidente do conselho de administração da GM, conseguiu anunciar as economias com os planos de saúde. Mas até mesmo essas concessões conseguidas a duras penas junto aos sindicatos poderão ser rapidamente superadas pelo rápido crescimento dos custos médicos nos EUA. O United Autoworkers Union (UAU) provavelmente não concordará com maiores concessões até 2007, quando deverá voltar à mesa de negociações para renegociar seu contrato de quatro anos com a montadora. Enquanto isso, a GMAC poderá ser vendida: Wagoner anunciou que estaria disposto a vender uma participação de controle da financeira, que vem conduzindo a controladora na maior parte das duas últimas décadas. Mesmo com a GM prometendo eliminar mais US$ 1 bilhão de sua conta de desenvolvimento de produtos, há muitos motivos para ceticismo em relação ao futuro da companhia. A montadora poderá ser sobrecarregada com bilhões de dólares em despesas previdenciárias adicionais e outros custos, como resultado da recentemente anunciada concordata da Delphi, seu ex-braço de autopeças. O aumento dos preços dos combustíveis pode ter feito muitos consumidores desistirem dos veículos utilitários esportivos (SUVs) que há muito vêm dando suporte ao balanço das montadoras de Detroit. O caro relançamento de SUVs, como o Chevrolet Tahoe, no início de 2006, pode não ser suficiente para reverter a tendência. Várias agências de classificação de crédito vêm sinalizando a possibilidade de novos rebaixamentos na classificação da dívida da GM. E mais e mais observadores se perguntam por quanto tempo mais Wagoner conseguirá ficar no cargo, especialmente com Kirk Kerkorian, o octogenário especialista em aquisições baseado em Las Vegas, começando a flexionar seus músculos. Kerkorian falhou em sua tentativa de adquirir a Chrysler uma década atrás, mas é cada vez mais provável que seu aliado, Jerry York, venha a conseguir um assento no conselho de administração da GM. A partir daí, York, ele mesmo um ex-executivo da Chrysler, poderia tornar-se uma substituição conveniente para Wagoner. Enquanto isso, a Ford apresentou seu primeiro prejuízo trimestral em dois anos, com perda de US$ 284 milhões no terceiro trimestre, em comparação ao lucro de US$ 266 milhões no mesmo período de 2004. A expectativa do mercado era de que os principais números não deveriam ser tão alarmantes quanto os da GM. Mas a situação fundamental da companhia poderá não se mostrar muito melhor. Sua participação de mercado está caindo, depois de um breve período de alta, liderada por incentivos, no começo do ano. E a Ford possui um número de novos produtos prestes a serem lançados menor do que a GM. Nas últimas semanas, vários executivos da cúpula pediram demissão, incluindo Phil Martens, diretor de desenvolvimento de produtos para a América do Norte. Em 1º de outubro Mark Fields assumiu o comando da unidade das Américas, a principal da Ford. Se isso prenuncia uma reestruturação necessária há muito tempo, algum dia desses boas notícias deverão soar em Detroit.