Título: PSDB e PFL querem ouvir Palocci sobre suposto financiamento de Cuba
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2005, Política, p. A6

O "pacto de amigos" da oposição com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, parece estar perto do fim. Dirigentes do PSDB e do PFL analisam hoje a possibilidade de convocar o ministro a prestar depoimento nos próximos dias, provavelmente na CPI dos Bingos, atitude que vinha sendo evitada até o momento. Pela primeira vez desde o início da crise política, o tom dos oposicionistas em relação a Palocci mudou, e não há mais excesso de cautela nem preocupação em blindar o ministro para evitar contaminações negativas no cenário econômico. O governo considera a ofensiva a Palocci uma irresponsabilidade política movida pela disputa eleitoral de 2006. "A eleição está chegando e a oposição não quer fazer o debate sobre a gestão da economia, o crescimento, a estabilidade e geração de empregos. Então essa é a forma de atingi-lo, levantando suspeitas sobre recursos de campanha. Não é possível tratar desse tema numa CPI para investigar os bingos", rebateu o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Palocci analisa a possibilidade de antecipar informações ao Congresso antes de ser convocado a depor. Os oposicionistas consideram "inevitável" que o ministro dê explicações sobre a última reportagem publicada na revista Veja, que trata da possível utilização de recursos do governo cubano na campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002. A operação teria sido executada por Vladimir Poleto, que trabalhou com Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto. Assim como Poleto, Palocci já viajou num avião do empresário Roberto Colnaghi, que teria sido utilizado para o transporte de dólares ao Brasil. "Nós da oposição temos um certo crédito na conta corrente do ministro Palocci. Demos sustentabilidade a ele no debate de metas de inflação e do câmbio flutuante; nos silenciamos por entendermos que não era possível mexer nos juros sem abalar a inflação; apoiamos convocações das mais ortodoxas para a equipe dele; evitamos a convocação de Ademar Palocci (irmão do ministro). Agora vamos ouvir o pulso da oposição", explicou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). "O ministro Palocci não é blindado", enfatizou o presidente nacional do PFL, Jorge Bornhausen (SC). Além da convocação de Palocci, tucanos e pefelistas começaram a recolher assinaturas para prorrogar o funcionamento da CPI Mista dos Correios até o próximo ano - a dos Bingos já foi prorrogada até abril - e apostam no bloqueio do repasse de verbas do Fundo Partidário ao PT para enfraquecer a legenda na disputa presidencial de 2006. "Sem dinheiro oficial, não há como fazer caixa 2", disse Virgílio. Para isso, a oposição solicitará ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma devassa contábil no PT de 2002 até agora. As novas denúncias envolvendo ex-auxiliares e empresários amigos de Palocci surgem no momento em que o clima entre oposição e governo é de total animosidade e os integrantes das CPIs manifestam preocupação com ameaças e grampos. "É preciso apurar tudo, mas com responsabilidade para não contaminar a economia. Os ministros deste governo sempre se dispuseram a prestar esclarecimentos", disse Mercadante. O clima tenso no Congresso fica ainda mais exacerbado pela "fogueira de vaidades" entre membros da CPI. O relator da CPI dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-PR), demonstrou a colegas o descontentamento com o fato de o sub-relator de Finanças, Gustavo Fruet (PSDB-PR), antecipar a decisão de propor ao Ministério Público o indiciamento do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares (ver matéria abaixo). O relatório deve ser formalmente lido na CPI quinta-feira. Nesta semana, a CPI dos Bingos ouvirá o depoimento de Vladimir Poleto. Também pode voltar a depor, na quinta-feira, o advogado Rogério Buratti, ex-secretário de Palocci em Ribeirão Preto que já havia feito denúncias referentes a ligações entre empresas de limpeza urbana. Todos os novos personagens supostamente envolvidos na "operação Cuba" - como o piloto do avião que transportou Poleto, Alécio Fongaro, e o empresário Roberto Colnaghi. Fongaro confirmou à "Veja" na semana passada ter transportado Poleto de Brasília a São Paulo, e também assegurou que ele transportava caixas de bebidas. A suspeita é que havia dólares nas caixas. Os oposicionistas consideram, ainda, que é equívoco político insistir na tese do impeachment. "Há uma grande dificuldade de ordem prática. É preciso 2/3 dos deputados para aprovar a admissibilidade do processo na Câmara, e por decisão monocrática do presidente da Casa pode haver arquivamento", disse Bornhausen. A Ordem dos Advogados do Brasil discutiu ontem o tema e considera precipitado o pedido. Todas as denúncias devem ser investigadas no âmbito das CPIs, opinou Bornhausen: "E eu não atravesso a rua com um governo que não tem credibilidade. Nós não temos nenhum motivo para dialogar com o governo".