Título: FMI aponta razões dos altos spreads na AL
Autor: Maria Christina Carvalho
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2005, Finanças, p. C2

Pouca competição, rigidez no mercado de trabalho, legado de instabilidade macroeconômica, distorções regulatórias e regras ultrapassadas sobre o direito de propriedade e falência explicam, segundo analistas do Fundo Monetário Internacional (FMI), por que o spread dos bancos da América Latina é o dobro do cobrado pelos bancos europeus e o triplo do apurado entre os asiáticos. Estudo coordenado pela economista sênior do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Meral Karasulu, com base em dados de 1997 a 2004, mostra que a margem líquida dos bancos latino-americanos ficou em 6%, em comparação com os quase 3% dos bancos europeus e os pouco mais de 2% dos asiáticos. Para calcular os dados da América Latina, Karasulu levou em conta os dados fornecidos pela publicação Bankscope dos bancos da Bolívia, Brasil, Chile, México, Peru e Uruguai. O estudo mostra que o sistema bancário da América Latina tem duas outras características que, em geral, os estudos sugerem que favorecem a redução dos spreads e, portanto, a maior eficiência: pouca concentração e percentual elevado de capital estrangeiro. Baseado em dados de 1995 a 2003, a concentração dos sistemas bancários da América Latina é bem menor do que a européia e praticamente igual à registrada na Ásia. O capital estrangeiro penetrou muito mais na América Latina, representando 30% do controle dos bancos, do que em outras regiões. Na Ásia, o índice fica perto de 20% e, na Europa, é ligeiramente superior a isso. No entanto, esses dois fatores não resultam em spreads mais baixos na América Latina. "Estudos empíricos não sugerem uma ligação forte entre concentração e competição. Isso pode refletir o fato de que a liberalização dos serviços financeiros ofereceu maior incentivo para se obter economias de escala através da fusões e integração internacional", diz Karasulu, no estudo. Em entrevista por e-mail, a economista sênior do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI afirmou que há "uma ampla evidência" de que a entrada de bancos estrangeiros é associada a uma maior eficiência no sistema bancário doméstico, pela introdução de inovações, transferência de tecnologia, fortalecimento da administração do risco de crédito e redução de despesas. Karasulu citou estudos recentes que avaliam o impacto positivo da entrada do capital estrangeiro na redução das despesas e na lucratividade dos bancos. "Em alguns casos, isso foi associado com margens mais baixas entre os bancos estrangeiros, mas não houve um contágio significativo nos bancos domésticos". Para a economista, isso significa que outros fatores, incluindo a competição interna, restrições internas e regulamentações, mecanismo de abertura ao capital estrangeiro - os bancos têm que sair do zero ou podem adquirir instituições domésticas existentes - e outras tendências podem explicar por que a entrada do capital estrangeiro não contribui para reduzir os spreads na América Latina. Karasulu não quis comentar o caso brasileiro, mas disse que os "spreads diminuiriam se os bancos estrangeiros competissem com os domésticos nos mesmos segmentos de mercado, forçando-os a reduzir os spreads". No entanto, quando enfrentam a competição estrangeira, os bancos domésticos "podem se dirigir para segmentos onde eles têm mais vantagens informais e maior poder de mercado, que os permite cobrar spreads maiores". A economista citou estudo feito em 2004 por Peria e Mody, que usaram dados da Argentina, Chile, Colômbia e México do final da década de 90 para investigar se os bancos estrangeiros podem operar com spreads menores, beneficiando os tomadores de crédito. Os pesquisadores queriam saber se o modo como o banco estrangeiro entrou no mercado - se comprou um banco existente ou começou do zero - pode influenciar sua eficiência. Avaliaram ainda se a participação estrangeira influencia os bancos locais. Os pesquisadores, disse Karasulu, descobriram que os bancos estrangeiros podem cobrar spreads mais baixos e têm custos menores do que os bancos locais. Mas, os bancos estrangeiros que compram instituições domésticas têm spreads maiores do que aqueles que começam novas operações, sugerindo alguma segmentação de mercado ou estratégias diferentes de preço para ganhar fatia de mercado. Mas eles não encontraram evidências consistentes de um efeito direto nos spreads. Pelo contrário, o grau de penetração do capital estrangeiro parece influenciar os spreads pelo efeito nos custos.