Título: A crise e a agenda "desenvolvimentista"
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 14/11/2005, Brasil, p. A2
Quem sabe se , com o apedrejamento político do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e os rumores de que um de prováveis substitutos é o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, a chamada "MP do Bem 2" ganhe impulso no governo. Nem Palocci é, de fato, adversário impiedoso das bondades à indústria, defendidas por Furlan, nem o ministro do Desenvolvimento parece ter chances reais de se alçar ao coração do governo. Mas as propostas de melhoria do ambiente de negócios só têm a ganhar com eventual aumento do prestígio de Furlan, homem da cota da Fiesp na coalizão pela governabilidade sonhada por Lula na montagem do governo. Depois de atribulada aprovação no Congresso, com o empenho de Furlan, a "MP do Bem", com benefícios fiscais para investimentos das firmas exportadoras e para investimentos em inovação, deve ser finalmente regulamentada até o início da próxima semana, mas as equipes do governo, também sob pressão de Furlan, já se apressam para garantir a esperada complementação dessas medidas, discutidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), com a isenção de PIS e Cofins para cerca de 40 alimentos e produtos de higiene da cesta básica e mercadorias usadas no chamado comércio "formiga" da construção civil. Nesta semana, devem reunir-se técnicos dos ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, e da recém-criada Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), para discussão da futura "MP do Bem 2". Uma das medidas incentivadas pelo governo está a cargo do Congresso, e deve ganhar fôlego na quarta-feira, quando será votada em uma comissão e enviada ao plenário: é o projeto conhecido como Super Simples, que amplia os benefícios fiscais para pequenas e microempresas, até com redução drástica do FGTS pagos por empregadores. Participantes dessa discussão no governo prevêem ainda duas frentes para complementar o cenário de mudanças microeconômicas desejado pelos "desenvolvimentistas": a edição do projeto, que reduz prazos e exigências burocráticas para abertura e fechamento de empresas, e o reforço ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).
Destino do Super Simples está na pauta do Congresso
Esse último ponto pode parecer assunto exótico para quem não sabe da importância conferida pelos investidores ao sistema de registro de patentes, e não conhece as dificuldades do principal organismo do governo para defesa do direito de propriedade intelectual. O Inpi, que já teve cerca de mil funcionários - quando chegavam ao órgão aproximadamente 60 mil pedidos de registro de patentes -, hoje tem 640, e o os pedidos somam 150 mil anuais. Uma das prioridades é a contratação de novos técnicos para o órgão, para reduzir o absurdo tempo de análise dos processos, hoje de até nove anos - o presidente do instituto, Roberto Jaguaribe, quer reduzi-lo a, no máximo, cinco anos, como na Europa. Furlan, em conversa com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na semana passada, conversou sobre a conveniência de incluir na "MP do Bem 2", ou editar por medida provisória extraordinária, a autorização para concurso dos novos funcionários do Inpi (medida de urgência justificada pela proximidade das eleições, que impedirão novas contratações a partir de meados do ano que vem). Também na "MP do Bem 2", ou em medida separada, o governo editará em breve as mudanças necessárias para facilitar o registro e fechamento de empresas no país. Nas conversas que têm mantido com diplomatas e investidores externos, tanto Furlan quanto Palocci e Dilma têm ouvido elogios à condução da macroeconomia (acompanhadas, às vezes, de perguntas sobre a absurda taxa de juros, que Palocci consegue justificar para alguns com o argumento de que a taxa média brasileira é trazida para baixo pelo financiamento facilitado do BNDES, que torna menos eficaz o arrocho monetário); mas todos têm insistido na absoluta necessidade de melhorar, com mudanças microeconômicas, o ambiente de negócios no país. O destino do projeto do Super Simples, que também permitirá a criação da "pré-empresa", menos tributada por ter poucos empregados e faturamento baixo, poderá mostrar aos investidores que a crise não é suficiente para deter os avanços do governo em matéria de melhoria do clima para a iniciativa privada. O sucesso de Furlan, nas discussões com a Casa Civil e equipe econômica em torno das medidas da futura "MP do Bem 2", também mostrará se, mesmo atado politicamente pelas denúncias das CPIs, o governo ainda é capaz de executar sua agenda "desenvolvimentista".