Título: União Européia promete oferta agrícola melhor, mas só depois de Hong Kong
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 14/11/2005, Brasil, p. A2
A União Européia (UE) sinalizou pela primeira vez ao Brasil que vai melhorar sua oferta agrícola, mas só após a conferência ministerial de Hong Kong, que ocorrerá no mês que vem. Bruxelas estima que já terá de aumentar a importação de carne bovina para 600 mil toneladas com a atual oferta na mesa. Por sua vez, o Brasil acenou com a ampliação da oferta no setor de serviços (que inclui bancos, telecomunicações, informática etc.), mas insistiu que não aceitará fórmula quantificando o número de subsetores que devem ser liberalizados - os europeus queriam a abertura de 93 dos 137 subsetores de serviços nos emergentes. Números e limites políticos para melhorar as respectivas ofertas na Rodada Doha foram discutidas sábado, durante mais de quatro horas entre o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o comissário europeu do comércio, Peter Mandelson, na embaixada brasileira em Roma. Bruxelas não deu indicação de ir além do corte médio de 39% nas tarifas agrícolas, comparado aos 54% pedidos pelo G-20. A melhora na oferta deve vir com redução da lista de 200 produtos (8% das linhas tarifárias) designados como " sensíveis " , que continuarão tendo altas barreiras. Os sensíveis terão só um terço do corte tarifário dos outros produtos agrícolas. A UE mantém, porém, a exigência de " pivô " , uma flexibilidade para cortar menos a alíquota de determinados produtos na faixa de banda entre 1% e 30%. Isso pode afetar vários produtos processados de interesse brasileiro, como café solúvel. Os europeus consideram que sua oferta agrícola já traz ganhos para o Brasil, mesmo no caso de produtos atingidos pela barreira dos " sensíveis " . Exemplificaram com a carne bovina: o efeito do corte de tarifas e o aumento de cotas levarão a UE a importar 600 mil toneladas por ano. O Mercosul poderia captar parte do crescimento dessas importações também pela negociação com a UE. Negociadores brasileiros contestaram a cifra, utilizando cálculos que mostram que a expansão da cota européia (pelo fato de o produto ser sensível e não liberalizado como os outros) seria de apenas 33 mil toneladas. A importação total sob cota ficaria em 273 mil toneladas. Estudo do agronegócio da Argentina, obtido pelo Valor, mostra que a reforma da Política Agrícola Comum (PAC) já assegura o aumento de importações, que Bruxelas acenou em Roma, como resultado de cortes de tarifas na Rodada Doha. A previsão é que a baixa de subsídios na PAC derrubará a produção interna e fará a Europa importar mais carne bovina de alta qualidade, de 549 mil/t (dentro e fora da cota), em 2005, para 628 mil/t em 2012. Por sua vez, as importações de carne de frango passarão de 587 mil/t para 723 mil/t no mesmo período, com a entrada de partes de frango congelado e cozidas, substituindo a carne salgada. As importações de soja vão subir 1,5 milhão até 2012, resultado de queda na produção de oleaginosos e expansão do consumo. Os europeus não explicaram seus números. Mas puxaram da pasta uma lista de produtos industriais que dizem não ter abertura adicional no mercado brasileiro, se o Brasil só cortar 50% nas tarifas, como no setor automotivo e maquinários. O Brasil não deu sinal de ir além desse corte. Amorim observou que a " prioridade é a negociação na OMC " . Mas que o acesso ao mercado terá de ser complementado com acordo UE-Mercosul, assegurando preferências para seus exportadores. Na semana passada, Brasil e UE tinham trocado acusações de bloqueio das negociações na OMC. O encontro de Roma " não reduziu o impasse " , mas Mandelson acha que houve " desenvolvimentos " ? . Amorim reagiu a comentários de que a reunião teria servido para acalmar os ânimos, depois da troca de acusações durante a semana. " ´Se a reunião fosse para isso, teria chamado (Mandelson) para tomar chá de camomila´´, disse.