Título: Taxa de expansão de manufaturados é a menor em 28 meses
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 16/11/2005, Brasil, p. A3

Comércio Exterior Câmbio e economia global afetam exportações, ao contrário do que ocorre na Argentina

O ritmo de crescimento das exportações brasileiras diminuiu nos últimos meses. De acordo com números da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), as vendas externas de manufaturados cresciam 28,5% em fevereiro pelo critério de média móvel em 12 meses. Esse percentual vem caindo mensalmente e alcançou 17,6% em setembro - o menor desde maio de 2003. Para analistas, a valorização do câmbio e um crescimento global um pouco menos intenso em 2005 levaram a essa menor expansão do volume exportado de bens industrializados. A perda de dinamismo não ocorre apenas nos bens industrializados. Também ocorre em básicos e em semimanufaturados. Um estudo do Credit Suisse First Boston (CSFB) confirma a desaceleração. O banco construiu um índice com 80 setores, que revela o percentual de segmentos em que houve crescimento do volume exportado nos últimos três meses em relação ao mesmo período do ano anterior. Segundo o CSFB, em setembro, 51% dos setores registraram expansão, o menor percentual desde os 49% de junho de 2002. Apesar desses sinais, os economistas não prevêem efeitos nocivos para a balança comercial no curto prazo, uma vez que 2006 também deve registrar saldo comercial robusto, na casa de US$ 35 bilhões ou mais. Números divulgados segunda-feira pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio apontam saldo comercial acumulado no ano de US$ 38,17 bilhões , 30,26% acima de igual período do ano passado. O superávit até o final do ano deve se aproximar dos US$ 42 bilhões. O saldo comercial somente na semana passada foi de US$ 939 milhões. Para o economista Fernando Ribeiro, da Funcex, o crescimento mais lento do volume exportado de manufaturados se deve em grande parte à combinação do dólar barato com alguma desaceleração do PIB global - depois de crescer 5% em 2004, o mundo deve ter expansão de 4,4% neste ano, projeta o CSFB. Para o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados, até maio os exportadores de manufaturados conseguiam compensar parte da valorização do câmbio com aumentos dos preços em dólar de seus produtos. A partir daí o cenário mudou, afirma ele, relatando conversas com empresários pelo país. Com dificuldades para reajustar seus preços e acossados pela queda livre do dólar, muitos exportadores perdem competitividade. "Nesse cenário, é natural que haja redução do crescimento das quantidades exportadas", diz Mendonça de Barros, lembrando que isso é mais verdadeiro para setores como calçados e têxteis, que têm perdido mercado para produtos chineses. Para Ribeiro, da Funcex, a manutenção do câmbio valorizado por muito tempo afetará, em algum momento, o dinamismo das exportações brasileiras, que nos últimos três anos têm crescido acima da média do comércio global. O risco é que elas passem a crescer num ritmo igual ou inferior, diz ele. Em 2004, por exemplo, as vendas externas brasileiras aumentaram 32% em valor, enquanto as exportações globais cresceram 21%. Um estudo do Barclays Capital mostra que também os saldos comerciais brasileiros começaram a diminuir, em um caminho oposto ao traçado pela balança comercial da Argentina, considerando um cálculo de média móvel trimestral, em termos dessazonalizados. O modelo de Michael Hood, do Barclays, indica que o superávit brasileiro está em queda desde agosto, e o do país vizinho cresce desde julho. Segundo o Barclays, em julho o saldo brasileiro estava em US$ 3,95 bilhões, número que caiu para US$ 3,.28 bilhões em outubro. No país vizinho o superávit subiu de US$ 720 milhões em junho para US$ 1,12 bilhão em setembro (último dado disponível). Para Hood, o real valorizado ajuda a explicar esse movimento, assim como uma demanda doméstica razoável e alguma desaceleração das importações de produtos brasileiros pela Argentina. Ele nota ainda que, como houve aumento muito forte das exportações de soja nos últimos dois anos, as séries dessazonalizadas mostraram um forte aumento das vendas externas no meio do ano, seguidas depois por uma queda. "Isso também ocorreu em 2004", afirma ele. Para Hood, é cedo para afirmar que a queda no superávit comercial se deve principalmente ao câmbio. Ele avalia, porém, que o dólar barato provavelmente já afeta investimentos em setores ligados ao comércio exterior. Mendonça de Barros - que também não vê problemas no curto prazo do ponto de vista da balança comercial - alerta quanto ao impacto do dólar barato sobre a vida das empresas. Há o risco de que algumas companhias já tenham saído do mercado quando o real voltar a se desvalorizar a ponto de estimular as exportações, avalia ele. O CSFB avalia que "o dinamismo das exportações brasileiras desde 2002 se deveu muito mais ao crescimento das quantidades exportadas do que dos preços dos produtos vendidos", mas ressalta que esse cenário está mudando. O efeito preço, segundo o CSFB, explica cerca de 40% do crescimento das exportações nos 12 meses terminados em setembro. Em fevereiro, esse percentual era de 35,7%. Para 2006, o CSFB projeta crescimento de 2,1% das exportações, que iriam de US$ 118,5 bilhões neste ano para US$ 121 bilhões, número muito abaixo dos 23% previstos para 2005. "O câmbio mais apreciado tem papel importante nesse processo", dizem os analistas do banco. Para eles, o dólar barato deve se refletir em maior dificuldade para as exportações crescerem a taxas elevadas, "mesmo num cenário internacional benéfico para as vendas externas".