Título: Gastos do governo explodem
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 01/05/2010, Economia, p. 22

CONJUNTURA

Desembolsos desenfreados em ano eleitoral comprometem as contas públicas e ameaçam o cumprimento da meta de superavit

População e empresas vêm pagando impostos elevados. A realidade, somada ao reaquecimento da economia, é sinônimo de arrecadação maior. Mas, apesar da aparente folga nas contas públicas, a situação é completamente adversa. A gastança desenfreada do governo em ano de eleições presidenciais exibiu a ferida. Pela primeira vez em muitos anos, o país poderá não cumprir a meta de superávit primário ¿ a economia necessária, inclusive, para baixar a relação entre a dívida e o Produto Interno Bruto (PIB) ¿ de 3,3%. Os dados divulgados ontem pelo Banco Central são os piores da série iniciada em 2001. O deficit nas contas do mês passado atingiu R$ 216 milhões, o pior para os meses de março.

O número reflete o resultado das contas do setor público (governo federal, estados, municípios e empresas estatais) sem considerar o pagamento de juros da dívida. O quadro mensal ruim se repetiu no trimestre, período em que o deficit nominal de R$ 28,15 bilhões foi o mais elevado da série e a apropriação de juros, de R$ 44,98 bilhões, também foi a mais elevada para os períodos de janeiro a março. Já o superavit primário no primeiro trimestre, de R$ 16,82 bilhões, correspondeu a 2,11% do PIB, o mais baixo para os primeiros três meses do ano, segundo a série histórica.

A situação não melhora quando a análise avança para o período de 12 meses terminados em março. O superavit primário acumulado até o mês, equivalente a 1,94% do PIB, ficou bem abaixo da meta de 3,3% prevista para o ano. Já o pagamento de juros nominais, da ordem de R$ 174,17 bilhões, foi o mais alto desde agosto de 2008. O deficit nominal acumulado de R$ 111,63 bilhões também já é o mais elevado desde novembro de 2009. Com tanto número ruim, nem mesmo o sempre otimista chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, cravou que a meta de superavit será cumprida em 2010. ¿Essa é a expectativa do governo¿, limitou-se a comentar.

Preocupação De acordo com Altamir, o superavit acumulado em 12 meses, de 1,94% do PIB, está mais compatível com a meta ajustada, que abate os investimentos e, por isso mesmo, fica um ponto percentual abaixo da meta cheia. O ex-presidente do Banco Central e sócio-diretor da Tendências

Consultoria Gustavo Loyola disse que está muito preocupado com a situação. ¿Indo nesse ritmo, vamos virar a Grécia¿, disse. Ele classificou de ¿absurda¿ a gastança do governo e criticou o fato de as contas públicas estarem ficando cada vez menos transparentes.

Altamir tentou demonstrar que março foi um mês atípico. Segundo ele, as receitas ainda foram fracas e ocorreu uma concentração de precatórios e decisões judiciais. Só de precatório, o governo pagou no mês R$ 6,7 bilhões. A conta que o Tesouro Nacional teve que arcar para cobrir o rombo da Previdência criou um deficit de R$ 3,912 bilhões para o governo federal, o Banco Central e o próprio INSS.

Dívida Por força do resultado, a dívida líquida do setor público voltou a subir, fechando março em R$ 1,366 trilhão, o equivalente aos 42,4% do PIB. Em fevereiro, a dívida líquida estava em 42,1% e em janeiro, 41,6% do PIB. Segundo Altamir, o aumento da arrecadação nos últimos meses indica que as contas públicas devem reagir. Já a dívida bruta do setor público caiu mais de dois pontos percentuais em março. Segundo os dados do BC, a relação dívida bruta /PIB caiu de 63,1% em fevereiro para 60,4% em março. Com essa variação, o valor absoluto da dívida bruta passou de R$ 2,014 trilhões para R$ 1,947 trilhão.

Indo nesse ritmo, vamos virar a Grécia¿

Gustavo Loyola, sócio-drietor da Tendências Consultoria

Reforço no BNDES

Deco Bancillon

O Tesouro Nacional vai ceder quotas de participações acionárias e direitos de posse de ativos de empresas estatais ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O objetivo é aumentar a capacidade do banco de conceder empréstimos e fortalecer a participação do Estado em empreendimentos, como o da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu. Com a operação, o governo vai aumentar em R$ 36 bilhões a capacidade de financiamento da instituição.

Ontem, o governo publicou dois decretos presidenciais autorizando a capitalização. Um deles trata da troca de ações em poder do BNDES por papéis sob a guarda do Tesouro. Conforme explicou o coordenador de participações societárias do órgão, Charles Carvalho Guedes, o banco irá repassar R$ 1,3 bilhão em títulos do Banco do Brasil ao governo, que irá ceder o mesmo valor em ações da Eletrobras.

A outra operação envolve a cessão de direitos de R$ 2,7 bilhões pertencentes à União aportados na Eletrobras. Guedes explicou que o dinheiro é parte da injeção dada na estatal para manter posição majoritária do governo caso a empresa venha a fazer um aumento de capital no futuro. ¿Mesmo que a Eletrobras não faça essa operação agora, esse montante já será incorporado ao capital do BNDES¿, afirmou. Ele contou que o objetivo é fortalecer o patrimônio de referência do banco. ¿Estamos aumentando o capital do BNDES em R$ 4 bilhões, pois o banco pode alavancar isso em até nove vezes¿, assinalou.