Título: Sombra diz foi também foi vítima
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 18/11/2005, Política, p. A6
O empresário Sérgio Gomes da Silva, principal suspeito de ser o mandante do assassinado de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André (SP), prestou ontem à CPI dos Bingos um dos depoimentos mais confusos da comissão até hoje. Nervoso e cheio de contradições, o Sombra, como é conhecido, demonstrou falta de memória a responder muitas questões e se emocionou ao falar do petista morte, amigo pessoal de longa data. "Tinha perdido meu melhor amigo. Sofria um linchamento público. Fui vítima neste caso", disse. Sérgio Gomes disse desconhecer dezenas de depósitos feitos na conta dele entre 1997 e 2002, quando Celso Daniel morreu. O dinheiro, suspeitam os senadores, seria proveniente de propina cobrada junta a empresários. Sérgio se confundiu com os repasses e disse que fazia saques de sua própria conta e repassava às pessoas. "O que o senhor está dizendo é ainda mais grave. Além de receber dinheiro, como aponta o seu sigilo bancário, o senhor está dizendo que fazia saques e repassava a outras pessoas", disse o presidente da CPI, senador Efraim Moraes (PFL-PB). "É possível também que eu tenha pedido para essas pessoas (citadas por Efraim) fazerem depósitos na minha conta", rebateu Sérgio. Contradição maior foi apresentada por Sérgio Gomes quando ele tentou explicar depósitos feitos em sua conta corrente por um empresário do setor dos transportes, Ângelo Gabrilli, pertencente à família que denunciou a cobrança de propina na prefeitura. Ele negou os depósitos na conta dele. Em seguida, disse ter emitido notas fiscais para o dinheiro recebido. Recai sobre Sérgio e também contra os empresários Klinger de Oliveira Souza e Ronan Maria Pinto, que também falaram à CPI na tarde de ontem, e outros empresários de Santo André, a acusação de terem participação no crime. O Ministério Público Estadual e os irmãos do prefeito morto, João Francisco e Bruno Daniel, sustentam a tese de que Celso Daniel foi morto por tentar confrontar o esquema de coleta de propina montado por eles em conluio com Gilberto Carvalho, chefe-de-gabinete do presidente Lula, para encher o caixa 2 petista. Em seu depoimento, Klinger reconheceu a intenção de parte da cúpula do PT de trabalhar para que os resultados das investigações não apontem para motivações políticas. "Gilberto Carvalho achava que o PT deveria entrar no debate para corrigir a rota das investigações sobre o caso, despolitizando-o", revelou. A afirmação de Klinger foi feita quando ele tentava desvincular a figura do deputado federal e ex-ministro José Dirceu (PT-SP) de qualquer influência na estratégia petista de confirmar a tese do crime comum. Ele respondia a pergunta feita pelo senador Álvaro Dias (PMDB-PR), para quem o PT tentou proteger Sérgio Gomes da Silva. "Não há nenhum registro do envolvimento do deputado Dirceu com a proteção ao Sérgio. Duvido que ele conheça o Sérgio", disse Klinger. Dias rebateu: "A convicção de Gilberto Carvalho e Dirceu era garantir a construção de uma versão de crime comum quando há indícios de morte política. Há, sim, uma estratégia do PT para se provar a tese do crime comum". "Nunca soube que havia recolhimento de propina pela prefeitura ou por ninguém", disse Klinger, de forma incisiva, em diversos trechos do depoimento. Ronan também refutou a existência de cobrança de propinas. "Nunca soube de cobrança de propina nem pelo Sérgio nem por ninguém. Nem nunca me procuraram para cobrar propina", disse. Klinger negou também qualquer discussão com Celso Daniel antes da morte do prefeito. Segundo algumas testemunhas do caso, houve uma desentendimento ríspido entre os dois às vésperas do assassinato. "Não é verdade. Vivíamos em lua-de-mel", defendeu-se.