Título: Credor reluta em entrar no conselho da Varig
Autor: Vanessa Adachi e Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 21/11/2005, Brasil, p. A6

Últimas Notícias-Empresas Demissão da equipe de Zylbesztajn cria dúvidas sobre futuro da companhia aérea

A Fundação Ruben Berta surpreendeu na sexta-feira ao demitir o presidente do conselho de administração da Varig, David Zylbersztajn, e outros três conselheiros alinhados com ele, sob o argumento de abrir espaço para que os credores da companhia passem a ocupar parte dos assentos. Mas não parece certo que os credores aceitarão a idéia. As conversas em torno da possibilidade devem começar de fato hoje, mas muitos já indicam não ter o menor interesse, enquanto outros estabelecem condições. Entre os credores estatais, o Valor apurou que Infraero e Banco do Brasil não estão dispostos a integrar o conselho. Quatro grandes credores estrangeiros da aérea também assumem a mesma posição, pois acreditam que, além de não haver vantagem em participar da gestão, existem riscos em assumir tal responsabilidade. "Quem vai querer? Só se alguém for louco", diz o executivo de uma empresa estrangeira que tem créditos da Varig. Muito se especulou ao longo do fim de semana sobre o papel do fundo de pensão Aerus nessa mudança de comando. Odilon Junqueira, presidente do fundo, já havia declarado em algumas oportunidades que os grandes credores deveriam tomar as rédeas do processo de recuperação judicial da Varig em vez de andar a reboque das decisões de seus executivos. Com créditos de R$ 2 bilhões, o Aerus é o maior credor da companhia e responde por 45% dos votos na assembléia de credores. Mas mesmo o Aerus agora mostra-se reticente com o rumo tomado pela FRB. "Só aceitamos participar do conselho de administração se os credores forem majoritários dentro dele", afirma Junqueira. De acordo com ele, o mínimo aceitável é que os credores tenham seis dos nove assentos existentes. "E se os outros credores não quiserem, nós também não queremos." Mas a FRB sinaliza que pretende oferecer quatro assentos e ficar com cinco, composição rejeitada pelo Aerus. O conselho da Varig vinha funcionando com oito membros, mas pode ter até nove. A FRB abriu quatro vagas ao demitir Zylbersztajn, Omar Carneiro da Cunha (que também deve deixar a presidência executiva hoje), além de Eleazar de Carvalho Filho e Marcos Azambuja. Mas ocupou uma delas ao indicar Humberto Rodrigues, que foi diretor de logística da empresa há alguns anos e é cotado para presidir o conselho. Ele se juntou a Gesner de Oliveira, Harro Fouquet, Brigadeiro Sergio Xavier Ferolla e Sergio de Almeida Bruni, que foram mantidos em suas funções. Hoje, o conselho de administração da Varig se reúne e deve indicar um novo presidente executivo. Marcelo Bottini, atual vice-presidente da área comercial, é o mais cotado. A demissão dos conselheiros pegou os credores de surpresa. Ninguém havia sido avisado com antecedência. Todos souberam na própria sexta-feira. A equipe liderada por Zylbersztajn e Carneiro da Cunha havia sido contratada pela própria Fundação em maio, com o objetivo declarado de profissionalizar a gestão da empresa. "Demos total liberdade de gestão e eles assumiram a responsabilidade pelas decisões que tomaram", afirma Cesar Curi, presidente do conselho de curadores da Fundação, deixando transparecer que houve desentendimentos. Um interlocutor de Zylbersztajn diz que a avaliação dele é que "deu a lógica". Como em outras tentativas de reestruturação da Varig feitas no passado, a Fundação desiste de ir em frente quando tem seus interesses ameaçados. No caso, estava cada vez mais claro que o plano de recuperação tocado pelos executivos demitidos passava por pesadas demissões e por um calote parcial no Aerus. "Nenhuma solução para a Varig que não contemple os interesses do Aerus será aprovada", reage Junqueira. A demissão dos executivos suscitou muitas dúvidas entre os credores acerca das reais motivações. Alguns acreditam que a FRB pode ter feito acordo com algum grupo interessado em assumir a Varig e que não contava com a simpatia da equipe de Zylbersztajn. Esse seria o caso, por exemplo, do empresário Nelson Tanure. Cesar Curi nega a existência de um investidor. De acordo com ele, a demissão dos conselheiros não interrompe as negociações com a TAP. "Continuam as conversas com todos." António Monteiro, porta-voz da TAP, diz que até agora não houve indicação de que a companhia tenha sido afastada das conversas. Ao menos uma coisa não muda com a demissão dos conselheiros. As subsidiárias VEM e a VarigLog foram mesmo vendidas e isso não tem volta, explica uma fonte que acompanhou o processo. O controle está nas mãos da sociedade de propósito específico que foi criada e o que pode mudar é o controlador dessa sociedade. Hoje ele está nas mãos da TAP, do investidor chinês Stanley Ho e dos sócios da firma brasileira de private equity Stratus. Mas está previsto um leilão em dezembro para tentar aumentar o valor pago, que foi de US$ 62 milhões. Chamou a atenção de alguns credores o "timing" da reestruturação implementada pela FRB. Curi diz que um fato relevante publicado pela Fundação em outubro já prenunciava a mudança. O fato relevante afirmava que a FRB estava disposta a abrir espaço no conselho aos credores. No entanto, só depois que o BNDES fechou o empréstimo à companhia estatal portuguesa TAP para comprar a Varig Log e a VEM é que os conselheiros foram demitidos, observam alguns credores. O empréstimo do banco estatal serviu para pagar as companhias de leasing e afastar o risco imediato de arresto das aeronaves, que teria paralisado a Varig. A visão geral entre os credores é que a troca do conselho a pouco mais de um mês do prazo final para a aprovação do plano de recuperação judicial pelos credores, no dia 22 de dezembro, aumentou muito as incertezas sobre o desfecho. Muitos avaliam que aumentou muito o risco de quebra da Varig. "A saída do grupo do Zylbersztajn só vai piorar a situação", diz um grande credor. Junto com os conselheiros demitidos, já se sabe que sairá também a equipe do advogado Sérgio Bermudes, que vinha representando a Varig no processo de recuperação. "Fomos convidados a permanecer no caso, mas entramos com os conselheiros e esse tipo de operação cria um vínculo", diz o advogado Daltro Borges. É também quase certo que a Lufthansa Consulting e o banco UBS deixarão o processo. Tantas baixas na equipe que tinha o histórico da recuperação judicial deve complicar o processo. "Passaremos tudo para a nova equipe", diz Borges. Os credores estatais esperam que a FRB defina logo a sucessão no conselho e na presidência da Varig. Além de estarem preocupados em ter um novo canal de diálogo com a Varig, os credores estatais querem ter a certeza de que os curadores da fundação não pretendem colocar qualquer obstáculo à reestruturação da companhia.