Título: Lula adota agenda de candidato à reeleição
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 21/11/2005, Política, p. A7

Crise Presidente visita 34 cidades em quatro meses e promete uma semana de inaugurações até o fim do ano

Ao afirmar, na sexta-feira, que disputará a reeleição, recuando em seguida quando percebeu o ato falho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não surpreendeu ninguém. O presidente, embora evite assumir, vem fazendo campanha aberta e organizada há meses. A própria entrevista às rádios regionais, na qual admitiu a disputa eleitoral, já se enquadra no formato de campanha: Lula conversou com nove rádios, líderes de audiência nas cinco regiões brasileiras. Outras entrevistas, no mesmo formato, estão marcadas para os próximos dias. Nos últimos meses, especialmente depois da eclosão da crise no governo, Lula adotou uma agenda de candidato. De junho a outubro, Lula viajou para 34 cidades diferentes, fez discursos de campanha, inaugurou fábricas, usinas de transmissão de energia, entregou cartões de programas sociais, inspecionou obras em rodovias, jantou com políticos e até plantou mudas de Pau-Brasil. "Não há dúvidas, ele é candidatíssimo desde o primeiro dia de seu governo, em 2003", assinalou o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA). No longo roteiro de viagens, Lula foi nove vezes para São Paulo, quatro vezes para o Rio, duas vezes para Belo Horizonte, Recife e São Bernardo. Mas o leque mais amplo abriga as cidades menores. Lula passou por todas as regiões do país. Em cada uma das solenidades, discursou com entusiasmo, apontando as realizações de seu governo e criticando o desempenho de Fernando Henrique Cardoso nos oito anos em que presidiu o Brasil, numa indicação que o governo tucano continuará sendo seu contraponto no discurso de campanha. O roteiro é longo: em junho, foram cinco viagens: além de São Paulo e Rio, Lula passou por Santo André (SP), Diadema (SP) e Itaguaí (RJ). Na terra do prefeito assassinado Celso Daniel, Lula entregou cartões do Bolsa Família. Em Diadema, inaugurou unidades habitacionais do Programa de Arrendamento Residencial - PAR, certificados do Programa de Subsídio à Habitação - PSH, e mais cartões do Bolsa Família. Já no município fluminense, visitou o Centro de Treinamento Técnico da Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep). O ano foi avançando e a agenda de viagens foi ficando mais profícua. Em julho, este número aumentou para oito: mais uma vez Rio e São Paulo, e também Taubaté (SP), Recife (PE), Bagé (RS), Canoas (RS), Osório (RS). Em Taubaté, antes da visita à fábrica de telefones celulares da LG, Lula plantou uma muda de Pau-Brasil. Em Recife, participou da aula inaugural do ProJovem. E nas cidades gaúchas, comemorou a criação da Universidade Federal do Pampa, visitou obras na BR-101 e unidades de hidrotratamento de diesel. Em agosto, aparece a agenda de viagens mais extensa até o momento: foram 16 ao todo, em um mês com 31 dias. Foi também em agosto que o desejo de Lula em disputar a reeleição foi explicitado pela primeira vez nesta fase atual de campanha. Em sua cidade natal, Garanhuns (PE), diante de uma platéia de produtores rurais durante lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar Nordeste 2005/2006, o presidente lançou o desafio: "Eu nunca disse a ninguém se seria ou não candidato à reeleição, até porque eu tenho o compromisso de governar, no momento certo eu direi. E vou dizer: se eu for, com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir outra vez, porque o povo brasileiro vai querer". Além de Garanhuns, São Paulo, Recife e Belo Horizonte, Lula visitou, ainda no mês de agosto, Floriano e Eliseu Martins, no Piauí; Aparecida do Rio Negro, Peixe, Palmas e Gurupi, em Tocantins; Vitória da Conquista, na Bahia; Hortolândia e Campinas, em São Paulo; Cuiabá, em Mato Grosso; Quixadá, no Ceará e Uberlândia, em Minas Gerais. Setembro foi um mês mais moderado para o presidente, em que a intensidade da crise conseguiu paralisar completamente o governo. Mesmo assim continuou em campanha: além de São Paulo e Rio, ele deixou Brasília em viagens nacionais para Angico (RN), Maceió (AL), Salvador (BA) , Eunápolis e Belmonte (BA). Outubro foi também o mês em que o presidente mais viajou a São Paulo. Passou também por São Bernardo, Pouso Alegre (MG), Niterói (RJ). Em novembro, nos primeiros 20 dias, Lula foi a Assis (SP) e Teófilo Otoni (MG). Estavam previstas ainda mais duas viagens, no dia 11 de novembro - Mucuri (BA) e São Mateus (ES). Elas foram, no entanto, canceladas. A justificativa oficial do Planalto não foi aceita como real: "O presidente gostaria de encontrar-se com os movimentos sociais, mas não conseguiu agendar os encontros". Na verdade, Lula teria retornado a Brasília depois da visita a Teófilo Otoni para acompanhar a batalha, em vão, do governo, para evitar a prorrogação da CPI dos Correios. Os articuladores políticos do governo não têm dúvida de que Lula será candidato. Só não sabem quando ele anunciará oficialmente sua decisão, provavelmente apenas na convenção do seu partido, o PT. Na última semana, durante abertura da 3ª Convenção Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, em Brasília, Lula acusou a oposição de querer antecipar o debate eleitoral nas CPIs. A oposição registra que é o presidente quem já está em campanha aberta e que esta é uma das prerrogativas de quem já tem o cargo, está no poder e pode contar com audiência a qualquer hora. Enquanto não assume oficialmente, Lula vai anunciando os próximos passos. Pretende, ainda este ano, "fazer uma semana de inaugurações e o lançamento de pedras fundamentais de novas extensões das universidades federais". Para o vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS), Lula até que viaja pouco. "Tem tanta coisa boa que está sendo feita por esse governo e que está sendo ocultada pelas muitas coisas negativas que a oposição está levantando", resumiu o aliado governista.