Título: Palocci articula sua defesa no Congresso
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 22/11/2005, Política, p. A9

O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, decidiu articular pessoalmente seu futuro político. Hoje, a CPI dos Bingos poderá adiar a votação do requerimento de convocação do ministro para prestar esclarecimentos sobre as denúncias de supostas irregularidades cometidas por seus ex-auxiliares em Ribeirão Preto e em órgãos sob a responsabilidade da Fazenda, como Banco do Brasil e Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). A interlocutores, Palocci disse claramente que considera constrangedora a convocação. Além disso, Palocci afirmou a amigos próximos que permanece incomodado com a queda de braço com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e acha que a convocação seria mais um explícito sinal de enfraquecimento político. Ou seja, o ministro acha que precisa de tempo político para resolver a situação interna. O afastamento do cargo não foi descartado. Palocci estará hoje em duas comissões na Câmara. Na disputa pela condução da política econômica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou novas decisões ontem: cobrou de seus ministros que encontrem um meio termo entre o ajuste fiscal defendido pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o aumento na liberação dos recursos para investimentos, pedido pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. O governo tem pressa em resolver essa equação para diminuir as especulações de que o Planalto vai abandonar a austeridade para alavancar a campanha de reeleição de Lula. "É lógico que inaugurar obras pode ajudar na campanha. Mas o país está parado, os ministérios precisam de recursos", alertou um assessor. A primeira tarefa, disse um aliado do presidente, é definir qual é o tamanho real da sobra orçamentária que extrapolou o limite de 4,25% do superávit primário. "Se deixar esse dinheiro parado, o Palocci vai querer pegar. E os ministros vão ter que interromper diversos projetos que estão em andamento". Outro desafio é como fazer para que essa flexibilização aconteça sem melindrar ainda mais Palocci, que se sentiu traído com as críticas públicas feitas pela ministra Dilma Rousseff. O governo quer fazer a mudança suavemente, sem a substituição de Palocci. "Mudar totalmente a política econômica, a um ano das eleições, é temerário. Tudo o que o governo tem a apresentar, até o momento, é fruto desta estabilidade", defendeu o auxiliar. Articuladores políticos adiantaram que as novas regras poderão estar explicitadas no decreto da junta orçamentária, mostrando a quantidade de verbas descontingenciadas mensalmente para os ministérios. Esse decreto deve estar sendo publicado ainda esta semana no Diário Oficial. "É importante agilizar essa liberação, para não deixarmos esses recursos como restos a pagar", declarou um assessor. No front do Congresso, onde o ministro Palocci tentava evitar a convocação, A oposição ainda resistia, até à noite, em postergar a votação do requerimento de convocação, por considerar que ficaria sem discurso. Espera-se uma decisão definitiva hoje, por volta das 10h. Uma das alternativas negociadas pelos governistas seria dar ao presidente da CPI dos Bingos, Efraim Morais (PFL-PB), a autonomia para, a qualquer momento, convidar Palocci, por telefone, a dar explicações na comissão, sem convocação. A resistência maior vinha do PFL, mas ainda assim há chances de adiamento da votação por pelo menos duas razões: a oposição considera que Palocci, a despeito do discurso do presidente Lula, está sim na corda bamba e sua saída pode desarticular a economia; o segundo motivo é que a saída de Palocci abriria possibilidades concretas de aumento do gasto público em ano eleitoral, o que favorece a reeleição de Lula e prejudica o PSDB e PFL. "Não gostaríamos de ter na nossa conta nem metade da responsabilidade pela derrubada do ministro", admitiu um parlamentar da cúpula oposicionista. O presidente do Senado, Renan Calheiros, também tratou de defender a permanência do ministro. "A política econômica é defensável, mas é claro que é preciso uma sintonia fina, em relação aos juros e execução orçamentária", disse ele. Renan rebateu enfaticamente o descontrole de gastos por conta do período eleitoral. "Não entendo que a alternativa seja a gastança e o desequilíbrio fiscal". Para o presidente do Senado, ninguém mais capacitado que Palocci para fazer a sintonia fina necessária na política econômica. A articulação para poupar novamente Palocci na CPI dos Bingos foi conduzida, no Congresso, pelo próprio ministro e pelo vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC). "A convocação deixaria a impressão de que existe uma dúvida moral em torno do ministro. O convite é um sinal de elegância, um ato de educação. Havendo um fato e necessidade, o ministro viria imediatamente", alegou Tião Viana. O petista conversou com o presidente da CPI, que deixou clara a disposição em colocar o requerimento em votação. Os aliados de Palocci na oposição asseguram que vão seguir a ordem partidária. O senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que foi procurado por Palocci na semana passada, admite ter uma posição mais moderada, mas avisa: "Sou um homem de partido. O que o PFL resolver será o meu voto". ACM, no entanto, considera que a sabotagem a Palocci parte do governo, e não vai ser alterada a despeito do discurso de Lula. "O Lula não pode ter dois amparos. Ele é dúbio porque não pode ser direto. O presidente deu cobertura hoje (ontem) a Palocci porque quem o está salvando somos nós da oposição", afirmou o pefelista. A avaliação dos moderados da oposição é que a queda de Palocci, inevitavelmente, vai gerar instabilidade econômica, independente do substituto. "A troca de Palocci seguramente desarrumará as finanças", afirmou o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN). Uma ala da oposição alerta ainda para o fato de que a saída de Palocci pode deixar manca a equipe econômica. "O Murilo Portugal (secretário-executivo da Fazenda), por exemplo, não fica se perceber sinais de mudança na política econômica. Nem o Meirelles (Henrique Meirelles, presidente do Banco Central)", arriscou um oposicionista. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), convocou todos os líderes da base a comparecerem amanhã nas comissões de Finanças e Tributação e de Educação, para defender a política econômica e o ministro. "Claro que o embate político não será feito apenas pelo ministro", disse. Chinaglia avaliou que o discurso de Lula colocou um basta nas especulações sobre a saída do ministro. "O presidente deu um recado claro: não existe política de ministro, mas de governo". (Colaborou Cristiano Romero)