Título: Petróleo ajudará contas externas
Autor: Roberto Rockmann
Fonte: Valor Econômico, 22/11/2005, Valor Especial / CENÁRIOS PARA 2006, p. F3

No próximo ano, o Brasil deve obter uma marca histórica, ao atingir a auto-suficiência na produção de petróleo. Apesar da necessidade de continuar importando petróleo mais leve para fazer seu "blend", o país ganhará, com esse salto, uma proteção extra nas contas externas contra as oscilações da commodity no mercado internacional. Esse feito é fruto de um avanço mais intenso observado desde o fim da última década. Em 1997, a Petrobras chegou ao primeiro milhão de barris por dia e neste ano, oito anos mais tarde, o país deve chegar perto da barreira dos dois milhões de barris produzidos por dia. "O petróleo deixou de ser uma preocupação central nas planilhas", diz o economista da GRC Visão Jason Vieira. Em 1981, quando o Brasil ainda engatinhava na produção e a exploração na Bacia de Campos ainda era um sonho, o país importou US$ 11 bilhões em petróleo e derivados, quase metade de todas as importações brasileiras no período. A corrente de comércio do país, a soma das compras e das vendas externas, era então de apenas US$ 45 bilhões. Naquela época, as oscilações do preço da commodity tinham um impacto brutal para a economia, que iniciou a chamada década perdida com as cotações assombrando todo o setor produtivo. Com o aumento da produção interna e a chegada de novas empresas, o cenário mudou. E a Petrobras tornou-se uma das maiores exportadoras brasileiras. Mesmo assim, pelas estimativas da Tendências Consultoria, o setor de petróleo ainda poderá registrar um déficit comercial de US$ 3 bilhões neste ano e de US$ 3,5 bilhões em 2006. As importações de óleo e derivados podem superar US$ 12 bilhões neste ano e US$ 13 bilhões em 2006, mas terão nas exportações um contrapeso considerável. A ampliação da capacidade de refino e o aumento da produção poderiam, segundo a consultoria, fazer o país chegar a US$ 9,2 bilhões em embarques de petróleo e derivados, superando esse valor em 2006. Outros analistas são mais cautelosos e prevêem que o déficit setorial poderá chegar a US$ 5 bilhões neste ano e no próximo. Nada muito preocupante, no entanto. O valor das exportações tende a crescer ainda mais nos próximos anos, uma vez que, em 2010, a Petrobras prevê produção de 2,3 milhões de barris por dia, dos quais 300 mil seriam consumidos fora do Brasil. "Se nada tivesse sido feito, o petróleo seria uma eterna fonte de preocupação", afirma o sócio-diretor da MS Consult, Fabio Silveira. Não é para menos. A forte demanda de China e Índia, refinarias mundiais operando no limite, desastres naturais atingindo pólos de extração próximos aos EUA (consumidor de 20% do petróleo mundial) se somaram a outro ingrediente explosivo neste ano: investidores interessados em ganhar dinheiro e enxergando o mercado do petróleo como um prato cheio. O enredo resultou num barril de petróleo sendo cotado acima de US$ 70, um recorde histórico. "O mercado financeiro entrou com força e ajudou a fazer o preço disparar", diz Jason Vieira. Prever a cotação do produto em 2006 é uma tarefa complicada. A maioria dos analistas projeta que o barril possa ficar na casa dos US$ 50. Durante o inverno no hemisfério norte, a média pode subir para US$ 60. Pesquisa feita com vinte instituições financeiras de grande porte nos EUA apontou cotação média de US$ 57 no próximo ano. Já o Banco Mundial, em seu relatório para 2006, indica US$ 56 o barril - algo próximo ao patamar verificado nesse ano. Se para as contas externas a situação parece ser estável, para a inflação, alguns analistas acreditam que pode haver riscos, mas moderados. Neste ano, pouco depois de o petróleo manter-se por três meses acima dos US$ 60, a estatal reajustou, em 9 de setembro, os preços internos dos derivados em 10%. Desde novembro de 2004 a empresa não fazia reajustes. Essa decisão, que foi o principal motivo para que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechasse com alta de 0,75% em outubro, acabou levando economistas a revisarem suas previsões de inflação. Há dois meses, a maioria dos economistas projetava um IPCA de 5,2% neste ano. Agora, a pesquisa Focus, coletada com as instituições financeiras, indica IPCA em 5,52%. Esse quadro inflacionário deve ser beneficiado por uma tendência de estabilidade no preço da gasolina em 2006, segundo os especialistas. "Uma decisão de aumentar a gasolina observará a lógica eleitoral", diz Luiz Caetano, do Banco Brascan.