Título: Okamotto não esclarece quitação de dívida
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 23/11/2005, Política, p. A5

Crise Presidente do Sebrae diz que pagou dívida de Lula com o próprio bolso sem comunicar ao presidente

O presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, em depoimento à CPI dos Bingos, admitiu ter pago uma dívida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o PT. Ele não conseguiu ser convincente, porém, ao falar sobre a origem do montante repassado ao partido, sobre os motivos que o levaram a quitar o empréstimo de R$ 29 mil em dinheiro vivo e porque fez os saques em Brasília e os depósitos em São Paulo. Okamotto começou o depoimento com uma versão fechada. Disse ter sido pressionado pelo ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, para resolver o problema da dívida de Lula, de quem é amigo pessoal. "Ele disse que o partido estava cobrando de todos os filiados e não poderia abrir exceção nesse caso", afirmou. O débito de Lula, segundo Okamotto, apareceu quando o partido decidiu afastar o presidente da direção da legenda depois da eleição. Na rescisão do contrato, Delúbio cobrou repasses de diárias e adiantamentos de viagens para Lula e a primeira-dama Marisa Letícia no valor de R$ 29,4 mil. Okamotto tentou, por vários meses, evitar que Delúbio cobrasse de Lula. "Eu não concordava com a cobrança, porque o presidente tinha viajado em missões partidárias, representando o partido", disse. Sem conseguir convencer Delúbio, Okamotto diz ter resolvido pagar o partido do próprio bolso. Fez quatro depósitos, em dinheiro, de aproximadamente R$ 12 mil, dois de R$ 6 mil e um último de R$ 5 mil: "O dinheiro foi sacado da minha conta e da de minha mulher, no Bradesco e no Banco do Brasil". O presidente do Sebrae diz que pagou a dívida e não avisou Lula: "Não havia necessidade de levar isso a ele. Achava o pagamento injustificado". Nesse momento, Okamotto começou a se complicar. Ao responder a perguntas formuladas pelo senador José Agripino (PFL-RN), disse que um dos saques foi feito em uma agência de Brasília. "Se o senhor sacou dinheiro em Brasília e fez depósitos em São Paulo, o senhor carregou malas de dinheiro? Por que não fez uma transferência bancária? Por que não pagou em cheque? É estranho, não bate", disse o pefelista para, em seguida, fazer outra pergunta: "E como é que o office-boy que fez o depósito apresentou uma cópia da identidade do presidente se o depósito era feito pelo senhor? Não estou entendendo. O senhor faz o depósito mas o registro é de que o presidente levou o dinheiro?". Okamotto não explicou o uso da identidade do presidente. Nem se manifestou sobre o saque feito em Brasília. Disse apenas que fez o depósito em dinheiro por orientação de Delúbio. Não poderia dar um cheque ou transferir de suas contas porque, na contabilidade do partido, o dinheiro apareceria como uma doação de Okamotto à legenda e não a quitação de uma dívida. O senador Jefferson Péres (PDT-AM) perguntou ao presidente do Sebrae se Lula teve influência em sua escolha para o cargo que ocupa hoje. Okamotto disse ter sido escolhido pelo Conselho Deliberativo da instituição, mas que "deve ter tido uma indicação do governo". Péres protestou: "A promiscuidade entre o público e o privado nesse país, mais precisamente nesse caso, é antológica. A classe política apodreceu". Agripino tentou desmontar a versão de Okamotto, de que a dívida se referia a diárias e adiantamentos. Ele leu um trecho do depoimento prestado por Delúbio à CPI dos Correios, no qual disse que o partido "tem a prática de fazer empréstimos aos filiados e receber o pagamento sem juros". Na ocasião, o ex-tesoureiro chegou a reconhecer que Lula recebera um empréstimo. E lembrou proibição expressa na Lei dos Partidos Políticos de as legendas fazerem empréstimos. "Esse dinheiro tem como fonte o dinheiro público, vem do Fundo Partidário", disse Agripino. O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), pediu a palavra e procurou esclarecer a situação de Lula. Ele leu uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral, referente ao PFL, que proíbe o pagamento, pelos partidos políticos, de diárias e passagens a militantes. O senador mostrou que o TSE considerou ilegais repasses feitos pelo PFL a dirigentes da legenda e determinou a devolução de R$ 91 mil ao Fundo Partidário. "A decisão é idêntica à uma outra decisão sobre o PT. A diferença é que o PFL recorreu e ninguém ainda devolveu o dinheiro. No caso do PT, diante da incompetência conhecida da tesouraria do partido, em vez de recorrer, o partido cobrou dos filiados. Eu mesmo tive de devolver dinheiro de diárias", disse Mercadante. Okamotto foi perguntado sobre denúncia feita por Paulo de Tarso Venceslau em 1996, quando disse a Lula que seu amigo Roberto Teixeira tinha um esquema de arrecadação de dinheiro junto a prefeituras petistas. Okamotto era dirigente do PT à época. Sem conseguir avançar no assunto, a oposição decidiu pedir a convocação de Teixeira e Venceslau.