Título: Ações têm peso de até 17% nos juros do crédito
Autor: Felipe Frisch
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2005, Legislação & Tributos, p. E1

Um estudo premiado ontem pelo Instituto Tendências de Direito e Economia (ITDE) mostra que as decisões contrárias aos credores nos tribunais superiores brasileiros têm um impacto entre 12% e 17% nos juros anuais praticados pelos bancos nos financiamentos com cláusula de alienação fiduciária. O levantamento é de Ivan César Ribeiro, mestre em administração de empresas pela Universidade de São Paulo (USP). Ele analisou 1.817 acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e 1.127 súmulas do Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dos extintos Tribunais de Alçada Cível (TACs) de São Paulo de 1998 até 2005. Dos 1.817 acórdãos do TJSP, em geral, quando houve apelação, segundo o estudo, esta foi promovida pela instituição financiadora, deixando clara a posição contrária ao credor da primeira instância da Justiça paulista. Em relação aos tribunais, o pesquisador criou um indicador relacionando o número de súmulas pró-credor vigentes sobre o total de súmulas pró-devedor. E descobriu uma relação de 2,75 súmulas favoráveis aos credores para uma favorável aos devedores em dezembro de 1990. Essa mesma relação chegou a 3,25 para uma em junho de 1991, a 1,3 em outubro de 1994 e a 1,08 em novembro de 1996, voltando a subir nos últimos anos a 1,36 súmula favorável ao credor para uma desfavorável em julho deste ano. Além do efeito nas taxas de juros pagas pelos devedores, a pesquisa conclui que as súmulas tiveram um efeito inibidor sobre as ações judiciais envolvendo a alienação fiduciária: elas tiveram uma redução de oito vezes entre os anos de 2001 a 2005. A redução dos litígios no período proporcionou uma diminuição dos juros entre 1,6% e 3,2%, na análise do pesquisador como prova dos efeitos da diminuição da insegurança jurídica. O economista Armando Castelar, estudioso da relação entre o Judiciário e a economia, faz coro com o autor da pesquisa. Ele estima que o risco jurídico represente cerca de 30% do chamado spread bancário - a diferença entre os juros pagos em aplicações e as taxas cobradas em operações de crédito. Isso representa hoje cerca de 15% ao ano, calcula. Ele lembra que o financiamento de veículos com alienação fiduciária, um dos alvos da pesquisa, é ainda o segmento de crédito que tem o menor ágio, de cerca de 22%, por ser o próprio automóvel a garantia. Castelar vai além: um estudo recente seu em conjunto com a professora Célia Cabral constatou que o volume de crédito nos Estados acompanha a qualidade - agilidade, imparcialidade e custos, de acordo com a avaliação dos usuários - do Judiciário. Segundo ele, os Estados em que os bancos são mais relutantes no fornecimento de crédito são os que têm mais "ativismo judicial". "O crédito é a área em que essa politização é mais intensa", diz. O caso emblemático citado por ele e por outros especialistas em direito bancário é do Rio Grande do Sul. Johan Albino Ribeiro, diretor jurídico da Febraban, confirma a tese e admite que as taxas nos mesmos bancos podem variar de Estado para Estado, conforme análise da equipe de crédito, que leva em conta até o CEP, no caso das mais sofisticadas. Segundo ele, 67% das ações revisionais de operações de crédito para veículos em 2004 eram do Rio Grande do Sul. Um "certo crescimento" era sentido em Goiás em relação ao tamanho do mercado. Já Rio de Janeiro e São Paulo concentravam apenas entre 3% e 4% dos processos, diz. Do total de ações revisionais no país, 70% eram do segmento de veículos. Para o advogado Rodrigo Guedes, a insegurança jurídica serve de discurso para os bancos. Um exemplo, segundo ele, é a luta em defesa da Lei de Falências, cuja demora na mudança era argumento para a incerteza institucional do Brasil. "Passada a aprovação, os bancos dizem que têm que ver como o Judiciário vai se comportar antes de reduzirem os juros", diz, lembrando que por Judiciário os bancos entendem as decisões superiores, que ainda podem levar dez anos para acontecer. Johan Ribeiro, da Febraban, avalia que a lei é apenas um ponto de partida e que os spreads já estão começando a baixar.