Título: Brasil busca fórmula para atender pedido
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 12/11/2004, Brasil, p. A4

Convencidos de que o principal objetivo da vinda do presidente chinês, Hu Jintao, ao Brasil, é obter o reconhecimento brasileiro do status da China como uma economia de livre mercado, os principais assessores do presidente Luis Inácio Lula da Silva decidiram buscar uma forma de ceder aos apelos chineses. Segundo um importante assessor do governo, o Brasil poderá adotar uma fórmula de reconhecimento da China como país de livre mercado baseada na experiência da Austrália e Nova Zelândia, que impuseram salvaguardas de forma a não deixar que esse reconhecimento afetasse os mecanismos de proteção contra exportações de produtos chineses a preços artificialmente baixos. Os chineses informaram ao governo que podem financiar até US$ 15 bilhões em investimentos no Brasil, e que talvez transformem parte desse dinheiro em participação direta nos projetos, mas somente se Hu Jintao obtiver o reconhecimento pedido ao Brasil. O não reconhecimento poderia representar um esfriamento nas relações dos dois países. "Eu poria a questão de outra forma: o reconhecimento ajudaria muito nossas relações de cooperação", resumiu o vice-presidente do grupo de construção civil da China Internacional Trust & Investment Corporation (Citic), Wang Guoxing. A Citic é a empreiteira chinesa, e funciona como um banco de desenvolvimento ao estilo do BNDES. Como Wang, em todo os encontros com autoridades brasileiras, os membros da comitiva da China que antecedeu a chegada do presidente Hu Jintao, ontem à tarde, enfatizaram o desejo de reconhecimento do novo status para o país. O Brasil representa menos de 1% do mercado mundial para as exportações chinesas. A insistência da delegação da China tem efeito principalmente simbólico. Ao ingressar na Organização Mundial do Comércio (OMC), a China teve de aceitar ressalvas de outras nações, que se reservaram o direito de impor barreiras diferenciadas aos produtos chineses com o argumento de que o país não é uma economia plena de mercado. Desde então, os chineses buscam o status de economia de livre mercado, como forma de reduzir a liberdade dos sócios na OMC para impor barreiras, como medidas anti-dumping (tarifas de importação sob a alegação de que as exportações são feitas abaixo do preço normal). As dificuldades para o reconhecimento por parte do Brasil foram expostas, na terça-feira, pelo diretor do departamento de Promoção Comercial do Itamaraty, Mário Vilalva, que chamou a atenção para o grande número de setores na economia chinesa ainda sob comando estatal ou beneficiado com fortes subsídios governamentais. O reconhecimento do país como economia de livre mercado dificulta o uso de preços de outros locais para comparação nos processos anti-dumping. Vilalva garantiu, porém, que, por ser muito "complexo", a decisão sobre o assunto teria componentes políticos, e caberia exclusivamente a Lula. Ainda que não seja completamente uma economia de mercado, a China tem setores competitivos, ressalvou o embaixador. É esse o caminho que técnicos do governo buscavam explorar, em reunião ontem á noite, no Palácio do Planalto. Austrália e Nova Zelândia reconheceram o status de economia de mercado para efeito dos acordos firmados pela China quando ingressou na OMC, mas ressalvaram que o reconhecimento não afetaria a aplicação de suas próprias leis anti-dumping. A Austrália ressalvou que não reconhece a China como economia "plena" de mercado, e que o acordo anti-dumping da OMC permite o uso de informação de terceiros países quando o mercado do país acusado (no caso, a China) é considerado pouco confiável, ou atendido de forma monopolística.