Título: Governo da China oferece US$ 2 bi para Norte-Sul e porto de Itaqui
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 12/11/2004, Brasil, p. A4

Relações externas Companhia Vale do Rio Doce e Japão também disputam os dois projetos

A ferrovia Norte-Sul e a ampliação do porto de Itaqui poderão receber financiamento de US$ 2 bilhões do governo chinês, afirmou o vice-presidente da China Internacional Trust & Investment Corporation (Citic) Construction Group, Wang Guoxing, após encontro com os ministros do Planejamento, Guido Mantega, e dos Transportes, Alfredo Nascimento. Wang Guoxing queixou-se, porém, de que as conversas com o governo brasileiro estão em ritmo "muito lento". O Citic, apresentado por Mantega como "uma espécie de BNDES da China", quer financiar a construção e transferência de tecnologia chinesa para a Norte-Sul e o porto de Itaqui em troca de garantia de fornecimento de soja, madeira e minério, explicou Guoxing. Acompanhado por executivos do grupo Brasilinvest, entre eles o diretor-presidente da Brasilinvest & Partners, Fernando Garnero (filho do empresário Mário Garnero), os dirigentes da Citic e uma comitiva de executivos e engenheiros da Citic e de empresas estatais chinesas de comércio de grãos e ferrovias, fizeram uma peregrinação na Esplanada dos Ministérios, que incluiu encontros privados com os ministros dos Transportes e o do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. Nos encontros, foi apresentada uma proposta elaborada pelo Brasilinvest, com a Trevisan Consultores, para mudar o traçado da ferrovia Norte-Sul, hoje em linha quase reta de Itaqui até Anápolis, em Goiás, de forma a desviar o percurso dos trens até o Centro-norte de Mato-Grosso, na cidade de Lucas do Rio Verde. Tanto a ferrovia quanto o porto dependem, porém, da aprovação do projeto de parcerias público-privada (PPP), pelo qual o governo garante a rentabilidade dos projetos de infra-estrutura, ressalvou Mantega. "Agora que a PPP voltou a caminhar no Congresso e esperamos que seja votada, na terça-feira, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, teremos, em breve, um instrumento que viabilizará esses projetos", disse o ministro. Mantega e Nascimento informaram aos dirigentes da Citic que a escolha para a construção e operação dos novos trechos da ferrovia Norte-Sul e para a ampliação do porto maranhense serão objeto de licitação. Concorrem com os chineses a Vale do Rio Doce e o governo japonês, que também apresentaram propostas para as duas obras de infra-estrutura. "Estamos dispostos a financiar e trocar por soja, minério de ferro e madeira", garantiu o vice-presidente da Citic. "Acho que se ganharia dos dois lados, um duplo benefício: de um lado a tecnologia e financiamento ajudam o projeto, e, enquanto isso, aumentariam as vendas externas do Brasil." Os ministros dos Transportes e do Planejamento lembraram que, apesar da demora na definição dos projetos dependentes das PPPs, há empresas privadas interessadas em associações com os chineses, o que já permite a realização de negócios no setor de infra-estrutura em regime de cooperação entre os dois países. Mantega chegou a irritar-se com a insistência dos executivos da Brasilinvest em defender o projeto de mudança do curso da Norte-Sul, que vem ganhando a simpatia dos chineses. O assunto será tratado diretamente pelos governos, insistiu o ministro, no começo da reunião com os representantes da Citic. Estes foram trazidos ao Brasil pela Brasilinvest, assessora do grupo nas decisões de investimento no país. Os técnicos do Ministério do Planejamento têm feito restrições à proposta de mudar o curso da Norte-Sul, que consideram pouco defensável do ponto de vista econômico-financeiro, apesar do estudo da Trevisan apontar vantagens no projeto, como taxa de retorno de 15%, e criação de mais de 500 mil empregos, e receita de impostos superior a R$ 700 milhões com o escoamento da soja daquela região do Mato Grosso. O governo tem franca preferência pelo traçado atual, até Anápolis, que, segundo o ministro Nascimento, torna o projeto da Norte-Sul o mais avançado nas discussões do governo. Os estudos ambientais já foram realizados, e a continuidade do traçado atual não exigiria mudanças na concessão, hoje detida pela estatal Valec. "Há três projetos em discussão, que interessam à CTIC: a Norte-Sul com o novo trajeto, o projeto atual e a Transnordestina", comentou ao Valor Fernando Garnero. "A CTIC está disposta a financiar qualquer um que seja escolhido pelo governo brasileiro." Mantega informou que hoje se reunirão representantes dos ministérios dos dois países e do grupo de trabalho formado para discutir os projetos de colaboração em infra-estrutura. Serão apresentados os projetos de interesse do governo, para avançarem as negociações. "Há uma gama grande de projetos, e o PPP é só uma parte ; há também concessões e outros instrumentos no setor de mineração e transportes", comentou o Mantega. " A Transnordestina, obras nos portos de Suape, Pecém, Santos, o anel viário do Rio, em Sepetiba, todos estarão sendo apresentados e poderão ser objeto de interesse dos empreendedores chineses", afirmou ele. A demora no início dos trabalhos do grupo de trabalho provocou queixas do vice-presidente da Citic, que cobrou uma aceleração nas discussões. "Depois do PPP, há uma série de detalhes a serem acertados; há muito trabalho a fazer", comentou Wang Guoxing. Ele informou que a Citic pode reunir consórcios de empresários e bancos chineses, interessados nos projetos da Norte-Sul e em Itaqui. Segundo Garnero, o projeto que prevê mudança no traçado da ferrovia envolve a organização de um consórcio de produtores de soja, que daria as garantias para o investimento. "Seria uma forma de evitar o risco Brasil", defendeu.