Título: Palocci supera conflito e prevê mais pressão
Autor: Cristiano Romero e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 29/11/2005, Política, p. A7

Crise Disputa com Dilma foi resolvida, na prática, pela ausência de tempo hábil para gastar o excesso de superávit

O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, considera superado o desentendimento com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, mas não aposta em trégua para as próximas semanas. Preocupa o ministro o comportamento do PT e de integrantes do governo - o chamado "fogo amigo" - em relação ao superávit primário das contas públicas, que continua bem superior ao previsto na meta, e ao desempenho do PIB, que no terceiro trimestre teria sofrido retração. Da CPI dos Bingos e da oposição, Palocci também não espera condescendência. Partiu do ministro a idéia de fazer as pazes com Dilma, com quem não vinha falando desde o dia 9 deste mês. Contrariado com as críticas públicas feitas por ela à política econômica e ao programa fiscal de longo prazo em gestação no governo, Palocci deixou de participar na semana passada de duas reuniões preparatórias da Junta Orçamentária. Na noite de sexta-feira, decidiu tomar a iniciativa de se reconciliar com a ministra. A pedido de Palocci, o secretário particular do presidente, Gilberto Carvalho, procurou Dilma para propor um encontro, que acabou acontecendo na manhã de domingo, na residência da ministra. Pesou na decisão de Palocci o comportamento do presidente Lula, que na semana passada o elogiou em público em mais de uma ocasião e reafirmou que o manteria no cargo, restaurando, pelo menos em parte, a autoridade que o ministro julga ter perdido depois dos ataques de Dilma. O encontro dos ministros não foi um evento social. Foi uma reunião de trabalho. Nela, os dois trataram dos temas que mais os têm distanciado: o superávit primário para este ano e o debate sobre o programa fiscal de longo prazo. A conversa, segundo interlocutores de Dilma e Palocci, avançou nos dois assuntos, embora esteja claro que a relação entre os dois não voltará a ser como antes. A ministra teria reconhecido que cometeu um deslize ao criticar publicamente a política econômica. Palocci teria argumentado que, na questão do superávit, todos no governo tinham consciência que um resultado superior ao previsto na meta - de 4,25% do PIB - seria necessário neste momento para fazer frente à elevação dos gastos do governo com juros. O problema estava resolvido na prática, uma vez que, mesmo que se esforçasse muito, o governo não conseguiria reduzir o superávit neste fim de ano para algo abaixo de 4,7% do PIB, número que já é bastante superior à meta. "Foi um gesto inteligente do ministro, que trabalhou nos últimos dias para reconstruir sua autoridade", comentou um assessor do Palácio do Planalto. Na manhã de ontem, antes da reunião do núcleo de coordenação do governo, Palocci conversou a sós com o presidente Lula. Fez-lhe um relato do encontro que teve com Dilma. Na reunião seguinte, com a presença de Palocci, da chefe da Casa Civil e de outros ministros, Lula sequer abordou o tema da discórdia. Preferiu falar de assuntos mais amenos, como os resultados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAD), do IBGE, que mostrou redução da pobreza no país. Embora esteja mais tranqüilo, Palocci não se ilude. Ele acredita que não há trégua. Ontem, por exemplo, o Banco Central anunciou que, de janeiro a outubro, o superávit primário acumulado foi equivalente a 5,97%, 1,72 ponto percentual acima da meta. Isso é justamente um dos aspectos da política econômica que têm irritado a ministra Dilma Rousseff. Lula planeja realizar, na quarta-feira, reunião da Junta Orçamentária. O temor de assessores palacianos é que, ao puxar demais a corda, Palocci tenha acabado com a margem de manobra para empenho e liberação dos recursos. "O decreto só vai estar pronto lá pelo dia 2 ou 3. Como os ministérios vão ter tempo de celebrar os convênios até o final do ano?", indagou ontem um assessor. Amanhã, o IBGE divulgará o PIB do terceiro trimestre, um resultado que já se espera negativo e que provocará a redução do crescimento em 2005 possivelmente para algo abaixo de 3%. O bombardeio contra a política econômica, apostam assessores do governo, deve voltar.