Título: Morte de Arafat cria expectativa e incerteza
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Fonte: Valor Econômico, 12/11/2004, Especial, p. A12

Oriente Médio Europa pressiona por retomada das negociações de paz, mas teme-se pela sucessão palestina

Morreu ontem em Paris, aos 75 anos, o líder palestino Iasser Arafat. Ele estava internado havia 14 dias no hospital militar Percy. Era o último dos líderes históricos ainda na ativa no Oriente Médio. Sua morte deve permitir um novo período de negociações na região, mas cercado de muita incerteza. Seu corpo foi levado por um avião francês ao Cairo (Egito), onde, por questão de segurança, será realizado hoje o funeral, com a presença de líderes internacionais. De lá, será transportado para Ramallah (Cisjordânia), para o enterro amanhã. A Autoridade Palestina (AP) decretou 40 dias de luto. A doença que vitimou Arafat é um mistério. Nem o hospital nem a AP divulgaram a causa da morte. Dirigentes palestinos procuram atribuir parte do problema de saúde aos quase três anos de confinamento do líder no QG em Ramallah, por determinação de Israel. No Oriente Médio, milhares de pessoas foram às ruas lembrar o líder morto. Houve comoção nos campos de refugiados palestinos. Esperada havia dias, a notícia repercutiu pelo mundo. O presidente russo, Vladimir Putin, descreveu Arafat como "líder político de valor internacional". A Casa Branca, em texto ambíguo, disse que "a morte de Arafat é um momento significativo na história palestina". O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, exortou palestinos e israelenses a trabalharem pelo sonho de Arafat de um Estado palestino. O Brasil será representado no funeral pelo ministro da Casa Civil, José Dirceu. Em nota, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que "certo de que as lideranças palestinas saberão manter vivos os ideais de seu incansável representante, o governo brasileiro reafirma o apoio à criação de um Estado palestino livre e soberano e à construção de um futuro de paz e prosperidade para o Oriente Médio." O ex-premiê Mahmoud Abbas foi eleito ontem mesmo líder da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), sucedendo a Arafat. Rawhi Fattouh, presidente do Parlamento palestino, assume interinamente a Presidência da AP, até que eleições sejam convocadas em até 60 dias. Farouk Kaddoumi assumiu a direção da Fatah, o grupo fundado por Arafat em 1958. O futuro palestino, porém, fica em suspenso. O centralismo de Arafat deixou a AP sem um claro sucessor, o que gera incerteza. Se os palestinos conseguirem uma sucessão tranqüila, poderão transformar a transição em oportunidade. Mas há grupos extremistas, como o Hamas que rejeitam o diálogo com Israel, e a unidade palestina sem Arafat terá de ser testada. Sem Arafat, os palestinos podem transferir a Israel o peso da paralisação do processo de paz. Até agora, o premiê israelense, Ariel Sharon, conseguiu convencer israelenses e os EUA de que Arafat era o principal obstáculo à paz. Os EUA, que se recusavam a negociar com Arafat, estão agora sob pressão da Europa para apoiar uma nova conferência internacional. Com ajuda internacional, o processo de paz pode ser retomado. Mas obter um acordo é outra história. O futuro líder palestino precisará de tempo para consolidar seu poder na AP e ter a autoridade para fazer concessões a Israel.