Título: Serasa apura alta no crédito mercantil
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2005, Finanças, p. C1

Financiamentos Empréstimos bancários a empresas perdem terreno

Relatório concluído esta semana pela Serasa sobre a evolução do crédito mercantil, com base em 60 mil balanços de empresas de todos os ramos e portes, mostra um crescimento dessa modalidade de crédito, em contrapartida a uma perda de espaço dos bancos no financiamento da atividade empresarial no país. De janeiro a junho de 2005 o crédito mercantil, que aparece nos balanços na conta "fornecedores", totalizou R$ 185,8 bilhões, com crescimento de 21% em comparação com os R$ 153,5 bilhões registrados no mesmo período de 2004. Comparado a dezembro de 2004, a expansão foi menor, de 0,34% em termos reais (descontada a inflação do período). Ao mesmo tempo o crédito bancário - que aparece nos balanços como "financiamentos bancários" - de curto e longo prazos, registrou uma queda real de 6,62%, totalizando R$ 306,8 bilhões, se comparado com o mesmo valor registrado nos balanços de dezembro de 2004. Comparado ao 1º semestre de 2004, a queda é de 11,5%. Os relatórios do Banco Central têm mostrado crescimento dos empréstimos dos bancos às pessoas jurídicas mas a diferença em relação ao levantamento da Serasa é a correção monetária, explica Marcio Torres, Gerente de Análise de Crédito da Serasa e um dos autores do estudo. Ou seja, em termos reais, o crédito bancário vem caindo. O objetivo do estudo da Serasa é avaliar o desempenho do crédito mercantil. Segundo Torres, essa modalidade de financiamento cresceu em uma velocidade muito menor este ano que nos anos anteriores, apesar do avanço nos últimos dez anos ter sido muito superior ao crédito bancário. Entre janeiro de 1994 e junho de 2005, o nível de endividamento bancário das empresas (definido pela relação dívida total sobre o patrimônio líquido) subiu 11% reais, ao mesmo tempo em que o crédito mercantil registrou expansão de 72%. Mas não é só a busca por outras modalidades de financiamento que traçou esse perfil de endividamento, explica Torres. "No primeiro semestre, com o dólar mais baixo e a expansão da atividade econômica, as empresas quitaram suas dívidas bancárias e partiram para outras formas de financiamento, de mais longo prazo e de menor custo como o crédito mercantil e o mercado de capitais", afirmou o analista da Serasa. Em sua edição de 29 de novembro, o Valor mostrou que as captações das empresas através de instrumentos de mercado de capitais vão superar R$ 70 bilhões este ano, R$ 20 bilhões acima dos desembolsos previstos pelo BNDES (o maior financiador de longo prazo do país) para todo o ano. O setor que mais utiliza o crédito mercantil é o comércio. Em 30 de junho de 2005, os estabelecimentos comerciais tinham R$ 40 bilhões em créditos mercantis, o que representava quase duas vezes o volume de empréstimos bancários do setor. "O maior ativo do comércio ou é estoque ou são os clientes, daí porque o crédito mercantil é uma questão de sobrevivência para estas empresas", analisa Torres. Ele se refere à ausência de ativos tradicionalmente aceitos pelos bancos como garantia aos empréstimos (imóveis próprios, máquinas, equipamentos e fiadores). No caso das indústrias e das prestadoras de serviços, o perfil é oposto ao do comércio. Os balanços do 1º semestre mostraram que os financiamentos bancários das indústrias representavam 1,4 vez os créditos mercantis. As obrigações com fornecedores eram de R$ 92,8 bilhões, contra R$ 131,9 bilhões de dívidas bancárias. Nas prestadoras de serviços a relação era 2,9 vezes, com dívidas bancárias de R$ 153,4 bilhões para R$ 52 bilhões em dívidas mercantis. Segundo a Serasa, esse perfil é explicado pela necessidade de investimentos em ativos fixos de ambos os segmentos. "Devido à natureza de seus investimentos, essas empresas são, em geral, tomadoras de recursos bancários de longo prazo, notadamente do BNDES", afirma o relatório. Apesar da escassez e do encarecimento das modalidades tradicionais de crédito bancário, as empresas praticamente dobraram seu nível de endividamento entre 1994 a 2005. Enquanto em dezembro de 1994 o nível de endividamento era de 70% (na relação dívida total sobre patrimônio líquido), em junho a relação passou a 132%. Para a Serasa, esse dado reflete a "confiança dos empresários na estabilidade econômica e o maior volume de negócios, tanto no mercado interno quanto no externo". Um dos destaques do levantamento da Serasa é a evolução do financiamento bancário de curto prazo. As empresas diminuíram essa conta de R$ 131,1 bilhões em dezembro de 2004 para R$ 116,8 bilhões em junho de 2005. A Serasa vê esse movimento como "confirmação de que as empresas estão buscando alternativas diante das dificuldades com altas taxas de juros e prazos apertados nos bancos". O crédito mercantil não só cresce em volume mas também viabilizou uma ampliação de prazos de pagamento de produtos e serviços, condição essencial para alavancar vendas e vencer a concorrência, explica Antonio Sergio de Almeida, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos Financeiros (Ibef).