Título: Superávit de 4,25% garante redução da dívida, avalia mercado
Autor: Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 05/12/2005, Brasil, p. A4

O tamanho ideal do superávit primário é assunto que preocupa mais o governo do que o mercado financeiro. A pesquisa de expectativas feita pelo Banco Central mostra que, na ótica dos analistas, o superávit de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) é suficiente para garantir uma queda consistente da dívida líquida. Pelo consenso de mercado, a dívida, que em outubro fechou em 51,08% do PIB, cairia, em média, 1,55 ponto percentual por ano entre 2006 e 2009, quando chegaria a 45,4% do PIB. A queda gradual do endividamento seria possível, segundo a mesma pesquisa, com superávit de 4,3% em 2006, de 4,25% nos dois anos seguintes e de 4,2% em 2009. Outro pressuposto é que a expansão do PIB ficará em 3,5% em todo o período. Nas projeções de mercado, porém, 2005 seria uma exceção. O endividamento ficará estável, oscilando de 51,67% para 51,6% do PIB entre dezembro de 2004 e 2005, com superávit de 4,7%. Um superávit ainda maior faria a dívida cair, mas não é essa a variável que está por trás da estabilidade do indicador. O que pesa desfavoravelmente é uma inflação menor que a esperada no IGP-DI, usada pelo Banco Central para deflacionar o PIB. Se a inflação menor tivesse sido antecipada, não haveria prejuízo, pois a inflação atua de duas formas na dívida, uma positiva e outra negativa. De um lado, eleva os juros nominais, já que os credores do governo exigem remuneração maior a título de correção monetária; de outro, turbina o crescimento nominal da economia, fazendo a dívida parecer menor relativamente ao PIB. Inflações não esperadas, porém, afetam o endividamento, para o bem ou para o mal. Em 2002, por exemplo, a inflação não esperada foi decisiva para que o PIB nominal provocasse queda de 11 pontos percentuais na dívida líquida. Este ano ocorre o contrário: o índice de inflação é menor que o esperado. No inicio do ano, o mercado previa IGP-DI de 6,5% e, no dia 25 de novembro, a projeção havia despencado para 1,47%. Assim, o efeito do PIB na redução da dívida é de apenas 1,7 ponto, de janeiro a outubro. A inflação é um dos fatores principais que determinam a dinâmica da dívida, ao lado de câmbio, juros, PIB real, esqueletos e privatizações. Com tantas variáveis em jogo, não é de estranhar que os analistas errem tanto nas projeções. O BC já chamou a atenção para isso em nota técnica. O mercado esperava, no início de 2004, que a divida encerrasse aquele ano em 56% do PIB. Ficou em 51,67%. Projetar a dívida é um exercício puramente aritmético, lembraram os economistas Delfim Netto e Fábio Giambiagi na nota técnica "O Brasil Precisa de uma Agenda de Consenso", que está servindo de subsídio para discussões dentro do governo sobre o nível de superávit primário adequado. O que faz a diferença são os parâmetros para juros, crescimento, cambio etc. Os dois economistas explicam a aritmética por trás da dívida de maneira relativamente simples. De um lado, a dívida líquida, excluindo a base monetária (47% do PIB), cresce devido ao pagamento de juros reais; de outro, o crescimento da economia faz a dívida encolher. Assim, pelas projeções dos dois economistas a dívida cresce 13% ao ano, devido aos juros reais, e cai 3%, devido ao crescimento real do PIB. Subtraindo um número do outro, a dívida aumenta 10%. Ou seja: o débito oneroso de 47% do PIB cresceria 4,7 pontos percentuais. O superávit primário necessário para manter o débito constante seria de 4,7% do PIB. "Nas condições atuais, portanto, o superávit de 4,25% ampliaria a relação dívida/PIB e tornaria mais difícil reduzir a taxa de juros", assinalam Delfim e Giambiagi. A aritmética é inquestionável, mas os parâmetros não são estáticos. Os dois economistas trabalham com crescimento de 3%, que pode ser entendido até como exagerado para 2005. Mas, para os anos seguintes, o mercado enxerga 3,5%. Os juros reais tendem a cair. Para 2006, o mercado espera uma Selic média de 16,38%, o que dá juros reais de 11,36% . Usando esses parâmetros, a divida ficaria estável em 2006, com um superávit primário de 3,75%.