Título: Expectativa de ganhos altos no curto prazo ilude investidores
Autor: Danilo Fariello
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2005, EU &, p. D1

Em 1999, um site convenceu 233 investidores australianos a aplicar US$ 4 milhões na empresa Seguradora do Bug do Milênio (MBI, na sigla em inglês), que ofereceria serviços a grandes empresas para garantir sistemas eletrônicos na chegada do ano 2000. Promessas do site indicavam que o valor aplicado seria triplicado em 15 meses. Em um mês, 10.200 pessoas visitaram o site e 1.212 solicitaram informações adicionais. Não havia nenhuma linha explicando riscos. Em 1º de abril daquele ano, a Australian Securities & Investments Commission (Asic), equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) daqui, anunciou a "pegadinha" financeira. "Isso mostrou como as pessoas estão dispostas a aplicar grandes quantias sem saber nada sobre a companhia a quem entregam o dinheiro", disse Alan Cameron, presidente da Asic. A psicanalista Vera Rita Ferreira explica que, por acreditar demais em determinadas propagandas, o investidor ignora riscos inerentes aos processos. "A ganância pode contaminar análises mais profundas, nocauteando a razão." Se uma administradora de cartões pode lucrar 15% ao mês em empréstimos, por que não podemos ganhar algo parecido? Pergunta uma investidora goiana que perdeu R$ 35 mil na Avestruz Master, para quem o povo brasileiro está condenado a lucrar pouco. Esse é um exemplo de análise simplista de investidores, ao ignorar custos operacionais e financeiros do empréstimo tomado. Para Vera Rita, outro fator psicológico que compromete o investidor é a autoconfiança excessiva, presente em todos os humanos. "É natural se achar especial e, portanto, que sua opinião seja a melhor." Esse fato é expresso por uma relutância em assumir prejuízo e no aumento de uma aposta quando se está perdendo. Uma pesquisa com 163 mil contas de uma corretora de ações nos Estados Unidos comprova isso. Ela revelou que investidores realizaram ganhos 68% mais vezes do que perdas, ou seja, quando no prejuízo, relutaram em vender o papel, para liquidar a aplicação quando a conta virasse. Eduardo Jurcevic, responsável pela área de Investimentos do Banco Real, diz que não existe proposta milagrosa. "Há duas receitas para acumular riqueza: disciplina e paciência." Esta segunda, bastante diferente das promessas de lucro rápido. Ele expressa uma opinião comum entre executivos do mercado financeiros, de que não há melhor investimento, pois todos variam segundo a propensão a riscos e o prazo de retorno esperado. Segundo Vera Rita, também é recorrente o fato de investidores simplificarem a análise complexa do mercado financeiro e confiar em suas avaliações. Como no fato de acreditarem que o dólar subirá ou cairá por uma razão específica, quando depende de um conjunto de fatores. Para a psicanalista, nem a tese racional de que a sociedade aprende com experiências anteriores vale para esses casos. "Pode ser até que quem perdeu nesses investimentos nunca mais caia numa história parecida, mas, quanto à população em geral, é praticamente impossível evitar a chegada do próximo caso." (D.F.)