Título: Nas favelas, pequeno empreendedor tem renda superior à dos assalariados
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2005, Brasil, p. A2

Incentivar os moradores das favelas a abrir negócios próprios pode ser uma maneira mais eficaz de ajudá-los a melhorar de vida do que lhes dar um emprego com carteira de trabalho assinada, de acordo com um estudo que comparou pequenos empreendedores e trabalhadores assalariados no Rio de Janeiro. O trabalho foi apresentado ontem por um pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), João Pedro Azevedo, no 33º Encontro Nacional de Economia, uma reunião acadêmica organizada pela Associação Nacional de Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec) nesta semana em Natal. Azevedo usou informações recolhidas por uma pesquisa abrangente que a prefeitura do Rio patrocinou entre 1998 e 2000. Os pesquisadores entrevistaram quase 22 mil famílias em 51 favelas da cidade. Existem atualmente mais de 600 favelas no Rio. De cada cinco cariocas, um vive nessas comunidades. A maioria das pessoas no universo estudado por Azevedo trabalhava como empregado assalariado no período da pesquisa, mas uma parcela expressiva, equivalente a quase um quinto dos moradores ocupados, tirava o sustento do próprio negócio. O pesquisador dividiu os dois grupos de acordo com o vínculo formal de sua atividade econômica. Trabalhadores sem registro em carteira e empreendedores que tocavam seus negócios dentro de casa ou como ambulantes nas ruas, sem um estabelecimento comercial fixo, foram classificados como informais. De acordo com os cálculos de Azevedo, os empreendedores formais tinham em média uma renda 22% superior à dos assalariados com carteira assinada, na época em que a pesquisa foi feita. Empreendedores informais ganhavam 2% a mais do que os empregados do setor formal. Em outra conta, em que tentou eliminar diferenças que podem distorcer essa comparação, como a experiência profissional e os anos de escolaridade de cada indivíduo, o economista descobriu que os empreendedores formais continuariam levando vantagem, com renda em média 15% superior à dos trabalhadores com registro em carteira. " O mercado informal é para muitas pessoas a porta de entrada do mercado de trabalho " , observou Azevedo. " As políticas públicas deveriam criar mecanismos que ajudassem esses empreendedores a se desenvolver e tornar seus negócios formais. " A ausência de títulos de propriedade legais e outros ativos que as pessoas possam usar para tomar dinheiro emprestado e investir em seus negócios é um dos principais entraves que os empreendedores encontram em lugares como as favelas do Rio. Um número crescente de especialistas tem recomendado a adoção de políticas que ataquem esse tipo de problema. Estimular a abertura de pequenos negócios também é uma maneira de combater o desemprego crescente em alguns estratos da população. Como lembra Azevedo, empreendimentos desse tipo são muitas vezes a única ocupação possível para trabalhadores com mais de 40 anos de idade e pouca qualificação. O estudo de Azevedo também apresenta evidências da enorme diversidade existente nas favelas do Rio. Numa mesma comunidade, trabalhadores de qualificação semelhante podem apresentar diferenças de renda expressivas conforme o local de trabalho. Quem tem emprego fora da favela se sai melhor, com ganhos de até 19%. O trabalho de Azevedo sugere que moradores de favelas localizadas perto de bairros mais ricos tendem a conseguir empregos melhores e mais bem remunerados do que os de favelas mais distantes da área central da cidade.