Título: Nota do ministério sobre aftosa acusa falhas do PR
Autor: Marli Lima
Fonte: Valor Econômico, 09/12/2005, Agronegócios, p. B12

Crise sanitária Documento elaborado em novembro acirra discussão

Um documento elaborado em 18 de novembro pelo Departamento de Saúde Animal (DSA) do Ministério da Agricultura (Mapa) obtido pelo Valor lança a suspeita de que o governo do Paraná teria atrasado a notificação de casos suspeitos de febre aftosa no Estado e, antes de torná-los públicos, teria realizado exames em laboratório próprio. O teor da nota técnica traz novos elementos para uma polêmica que se arrasta desde 21 de outubro, quando foi revelada a possibilidade de existência de focos da doença do Paraná. A confirmação veio na terça, mas o governo paranaense se recusa a aceitá-la. A nota técnica de nº 35, de uso interno, é assinada pelo diretor do DSA, Jorge Caetano. Tem cinco páginas e aponta uma série de erros que teriam sido cometidos pelo governo do Paraná. Começa pela descrição de regras internacionais para a área sanitária e, na página 2, mostra a preocupação com os procedimentos adotados pelo Estado. Em seguida, diz que o departamento só foi notificado das suspeitas em 21 de outubro, "apesar dos indícios de que o serviço veterinário oficial do estado tenha tomado conhecimento dos episódios desde (...)16/10/2005". "Evidências apontam para problemas de notificação por parte do serviço veterinário oficial do Estado, com atraso na comunicação e, mais grave, após a execução de procedimentos não autorizados pelo Mapa, contrariando o sistema de informação implantado e colocando em risco os demais estados da Federação", diz o texto. O DSA admite não ter provas para mostrar, mas relata uma cronologia dos acontecimentos. "...fotos digitais de animais com lesões na cavidade bucal, datadas de 16/10, foram encaminhadas ao DSA, por meio eletrônico, após a notificação da suspeita" e "...o estado, sem conhecimento do DSA, colheu 548 amostras de soro sangüíneo e enviou para análise junto ao laboratório estadual (Marcos Enriete), não autorizado para realização de testes para febre aftosa", são algumas revelações. Segundo o documento, o DSA soube das suspeitas pela imprensa. "...havia tanta certeza que o Secretário da Agricultura do Paraná, ao anunciar os episódios pela imprensa, informou ao Sr. Ministro da Agricultura, pelo telefone, que eram de 90% as possibilidades de ser confirmada a febre aftosa". Uma curiosidade está na página 4: "...no dia 14.10.2005 o Serviço de Defesa Sanitária Animal do (...) Paraná procurara insumos para diagnóstico sorológico para febre aftosa (...) no dia 16 foi atendido pela empresa Biobrás". E segue: "Ficou evidenciado que as investigações e os achados de campo subsidiaram a decisão de testar os animais em data anterior ao dia 14 de outubro. As 548 amostras de soro foram coletadas e processadas, sob sigilo, em laboratório estadual. Não se sabe de quais animais e onde estavam". Procurada, a Novo Nordisk, que comprou a Biobrás em 2003, não confirmou nem negou a informação do ministério. O Valor teve acesso ao documento ontem (dia 8), mas já na terça-feira havia apurado que, antes de comunicar a suspeita, o governo do Paraná enviou de fato amostras de soro dos animais com sintomas da febre para o laboratório Marcos Enrietti (o nome foi grafado de forma errada pelo DSA). Os exames teriam sido feitos com material importado, capaz de fornecer resultados em 24 horas. Três dias depois do anúncio oficial das suspeitas, o governo comunicou que liberaria R$ 400 mil para melhoria do laboratório. Na quarta-feira o vice-governador e secretário da Agricultura do Paraná, Orlando Pessuti, admitiu que o Estado fez testes antes do dia 21. "Esse foi um dos elementos que apresentamos ao ministério na ocasião e que poderia ajudar no estabelecimento da suspeita", contou. "Não fizemos nada escondido de ninguém e não somos proibidos de fazer exames de sorologia". Pessuti disse desconhecer a nota e afirmou que só soube da suspeita no dia 21. "Mas suspeitas nós já tínhamos desde que soubemos o que estava acontecendo no Mato Grosso do Sul", garantiu. Pessuti contou que só ontem recebeu o comunicado do ministério sobre a confirmação da aftosa. E continua não aceitando a decisão. Já o governador Roberto Requião (PMDB) reiterou que entrará na Justiça contra o ministério.