Título: Resistência do Senado bloqueia CPI da carne
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 09/12/2005, Agronegócios, p. B12

Concentração

Uma briga entre deputados e senadores ameaça enterrar a proposta de criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a formação de cartel dos frigoríficos na compra de bois. Pressionado pelo lobby das empresas, o Senado bombardeia a CPI para restringir as ações à assinatura de um termo de ajuste de conduta entre pecuaristas e frigoríficos. "Aqui, não sai essa CPI", resume o senador Jonas Pinheiro (PFL-MT). "A repercussão seria péssima". Segundo ele, as investigações prejudicariam a imagem do produto brasileiro no exterior. "Vamos aproveitar o momento para encerrar as divergências com um compromisso entre as partes". Precipitada por uma gravação de vídeo onde o presidente do Friboi, José Batista Júnior, admite combinação de preços entre frigoríficos, a CPI era dada como certa. Até ontem (dia 8), as assinaturas de 211 deputados e 35 senadores garantiam a criação da comissão. Os ventos parecem ter mudado. O boicote silencioso à CPI é comandado pelo presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Pratini de Moraes, e por parlamentares ligados a frigoríficos. O presidente da Comissão de Agricultura do Senado, Sergio Guerra (PSDB-PE), apóia a resistência. Na quarta, Guerra acompanhou a visita de Pratini a líderes partidários no Senado. "A CPI é uma medida extrema. Não pode ser a primeira", disse. "Nossa prioridade, agora, não é a CPI, mas resolver os problemas do setor". Embora afirme haver "sinais claros de manipulação de preços", Guerra afirma ter convencido dez senadores a retirar apoio à CPI. Assim, a comissão não teria os 27 votos necessários à sua instalação. O senador diz que o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), Antonio Ernesto de Salvo, está de acordo com seus argumentos. Mas o presidente da Comissão de Pecuária de Corte da CNA, Antenor Nogueira, informa não haver decisão interna nesse sentido. A oposição às investigações ganhou corpo na Câmara. Dono de frigorífico, o deputado Vadão Gomes (PP-SP) atua nos bastidores para convencer os colegas a retirar as assinaturas de apoio à comissão. "Há interesses eleitorais de deputados de Goiás por trás dessa CPI", ataca. "A CPI é mais para o pegar o Friboi. Daqui a pouco também tem uma CPI da 'cibalena', do arroz...". Vadão refere-se à briga política entre Ronaldo Caiado (PFL-GO) e José Batista Júnior, pré-candidato tucano ao governado de Goiás. As famílias de ambos disputam o poder político em Anápolis, segunda maior cidade de Goiás. "Existe política no meio. Parece briga paroquial", reforça o deputado Sandro Mabel (PL-GO), apontado como um dos líderes da "bancada frigorífica". Ele sugere a criação de uma subcomissão da Câmara e defende deixar as investigações pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça. Presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, Caiado nega mover-se por interesses eleitorais. "É uma questão nacional, que começamos a mostrar não agora, mas desde o início deste ano". Mas assume a disputa com o dono do Friboi. O governo acompanha de forma discreta os bastidores dos acordos, mas teme os efeitos das divergências. O Ministério da Agricultura rechaça a CPI e torce por uma solução negociada, segundo um dirigente da Pasta. A SDE deve concluir a análise do caso até abril, segundo o secretário Daniel Goldberg. As conclusões serão enviadas ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que decidirá sobre as questões e provas levantadas pela SDE. Goldberg já disse haver "indícios fortíssimos" de cartelização.