Título: Appy admite que mudança em tributos fez inflação subir
Autor: Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2005, Brasil, p. A4

Conjuntura Alteração de regime do PIS/Cofins deveria ser acompanhada de queda do Imposto de Importação

O governo perdeu, no fim de 2003, a oportunidade de reduzir tarifas de importação e, dessa maneira, diminuir o surto inflacionário que o país teve de enfrentar em 2004 e 2005. Essa constatação foi feita ontem pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. A oportunidade perdida ocorreu, segundo ele, quando o governo decidiu mudar o regime do PIS/Cofins, fazendo com que essas contribuições deixassem de ser cumulativas e também estendendo a sua cobrança às importações em 2004. Dando igualdade de tratamento tributário a produtos nacionais e importados, o governo corrigiu uma distorção e atendeu a uma antiga reivindicação dos industriais. Mas Appy disse que fazia a "mea culpa" ao admitir que "faltou clareza naquele momento". "Não é possível dissociar o surto inflacionário que nós tivemos em meados de 2004 até meados de 2005 da mudança na legislação tributária, que exigiu uma reação por parte do Banco Central com efeitos macroeconômicos conjunturais, obviamente, porque o ajuste se faz nos preços relativos e isso tem efeitos macroeconômicos que estamos evidenciando", explicou. Appy e o secretário-executivo da Fazenda, Murilo Portugal, participaram de um seminário na Confederação Nacional da Indústria (CNI) chamado "Agenda Microeconômica: Evidências e Perspectivas". Appy explicou que a mudança no regime do PIS e da Cofins foi um dos pontos mais importantes da agenda microeconômica do governo e teve efeitos sobre a mudança dos preços relativos. Em um ambiente de demanda aquecida e aumento dos preços das commodities internacionais, acabou levando ao surto inflacionário. Sobre a perspectiva de reduzir tarifas de importação, Appy afirmou que essa decisão agora depende de negociações multilaterais - no âmbito da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) - e bilaterais, com os parceiros do Brasil. "O ajuste dos preços relativos nessa mudança de PIS e Cofins, ao que tudo indica, já está completado. Existe espaço para reduzir tarifas de importação e essa situação tende a ser melhor aproveitada se houver disposição dos nossos parceiros comerciais", disse Appy. Se as mudanças no regime de PIS e Cofins tivessem sido acompanhadas da redução das tarifas de importação, isso teria dado um desenho mais eficiente à economia, segundo Appy. "Hoje vemos que perdemos essa oportunidade. Isso é, de fato, uma 'mea culpa´ que faço. Foi uma falta de clareza naquele momento, não só do governo. Não vi, exceto alguns ´papers´ muito localizados, comentários nem mesmo no meio acadêmico." Murilo Portugal voltou a defender a proposta de ajuste fiscal de longo prazo que tanta polêmica vem provocando. Ele disse que essa é uma discussão que "envolve tempo e prazo", mas tem de ser feita. Para ele, a posição do Ministério da Fazenda é conhecida e "há menos divergência do que parece". Para assegurar uma trajetória cadente da dívida pública, a equipe econômica defende um compromisso de longo prazo mantendo o atual nível do superávit primário (4,25% do PIB) e limitando o crescimento das despesas primárias correntes. Isso permitiria, segundo Portugal, antecipar parte dos ganhos desse esforço, com redução do risco-país e ampliando o espaço para aumentar os investimentos públicos. Como exemplo desse esforço, Portugal citou o fato de o governo ter incluído na proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) o limite de 17% do PIB para as despesas correntes. Quanto ao fato de os empresários apontarem os juros e os impostos como obstáculos ao investimento, Portugal afirmou que o governo tem feito um grande esforço de redução da carga tributária. "É uma redução seletiva para melhorar a poupança de longo prazo e o investimento. É uma agenda que o governo continua tendo." Sobre os juros, Portugal disse que eles já começaram a cair e acredita que vão continuar caindo. "Esse é um tema do Banco Central sobre o qual nós não nos manifestamos no Ministério da Fazenda."