Título: Um convite às adversárias
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 07/05/2010, Política, p. 3

No primeiro debate antes do início da campanha, José Serra ¿chama¿ PT e PV a participar da administração tucana, caso vença disputa de outubro. Proposta foi apoiada por Marina Silva, mas não teve resposta de Dilma

Belo Horizonte ¿ No primeiro encontro entre os três pré-candidatos à Presidência da República, em Belo Horizonte, o tucano José Serra convidou o PT, da ex-ministra Dilma Rousseff, e o PV, da senadora Marina Silva, para governar com ele, caso seja eleito para suceder o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A ideia veio em resposta a uma fala de Marina, que defendeu um realinhamento histórico entre os partidos, acabando com a guerra entre situação e oposição, que emperram avanços e reformas em todos os governos. Dilma ignorou a proposta dos adversários e não comentou o assunto quando questionada pela imprensa.

Em um debate tumultuado para uma plateia de cerca de 400 prefeitos e políticos, transmitido ao vivo por uma emissora de televisão, os três evitaram ataques. Ao falar sobre a dificuldade de se aprovar a reforma tributária, a senadora Marina Silva afirmou que é preciso aprender com os erros. De acordo com ela, a sistemática política brasileira faz com que governo fique refém de aliados para enfrentar a oposição. ¿O PSDB ficou refém do que há de pior no DEM. E o PT, do que há de pior no PMDB. A história nos ensinou que temos que conversar¿, disse, arrancando aplausos.

Em seguida, Serra concordou com a adversária e afirmou que, se eleito, vai convidar PT e PV para participarem do seu governo. ¿Pode parecer uma heresia o que eu vou falar: se eleito, vou querer PT e PV no governo em função de objetivos comuns, com base em programas. O Brasil vai precisar estar junto nos próximos anos. Hoje e ontem a oposição sempre teve um comportamento que empurra o governo para um lado que não devia¿, justificou. Na saída, Marina completou que é importante que as pessoas estejam dispostas a conversar. ¿Eu coloquei a ideia primeiro¿, disse.

Autonomia Convidados para falar sobre autonomia municipal, Serra e Marina concentraram os discursos na defesa da revisão do pacto federativo e do fortalecimento dos municípios, enquanto Dilma listou realizações do governo Lula, principalmente no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que comandou quando ministra. Dilma foi vaiada quando falou sobre a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para carros e eletrodomésticos como forma de conter os efeitos da crise financeira mundial. A desoneração gerou uma das principais queixas dos prefeitos já que, junto com o Imposto de Renda, o tributo compõe o Fundo de Participação dos Municípios, maior fonte de renda de 60% das prefeituras mineiras.

A pré-candidata do PT afirmou que a desoneração foi uma forma de evitar o desemprego no país e lembrou que o governo federal destinou R$ 2 bilhões para compensar parte da perda sofrida pelas prefeituras, avaliada em R$ 3,5 bilhões. ¿Nós modificamos a relação federativa. Nunca deixamos de dialogar e nem reprimimos a marcha dos prefeitos¿, afirmou. José Serra ressaltou que, enquanto prefeito e governador de São Paulo nunca foi discriminado por ser do PSDB, mas criticou a isenção do IPI, incorporando o discurso dos prefeitos. ¿Não vamos fazer benefícios com chapéu alheio¿, disse, sugerindo que a desoneração deveria ter sido feita de forma gradual, com a criação de um mecanismo automático de reposição de todas as perdas.

Serra e Marina propuseram que as reformas, como a tributária, sejam feitas por meio de uma assembleia constituinte exclusiva para discuti-las. Segundo ambos, os conflitos de interesses sobre os temas são intermináveis e se sobrepõem às votações. ¿A questão tributária precisa ser encarada como algo que não tem a ver com partidos¿, disse Serra. Dilma afirmou que só será feita a reforma tributária se houver um acerto entre perdas e ganhos. ¿Todos vão ter ganhos com a reforma a médio prazo¿, disse.

Royalties A necessidade de uma proposta para a revisão do pagamento de royalties de minério em Minas Gerais foi o único consenso entre os três. Segundo Dilma, as riquezas são de todos. ¿Concordo com o Serra no que se refere aos royalties do minério. É um absurdo o nível de royalties cobrados da mineração porque é um recurso natural. Acho que é uma questão de dívida com a nação¿, disse. Já Marina afirmou que é preciso gerar riquezas para o povo de Minas Gerais.

Serra fez afagos nas adversárias, que chamou de ¿mulheres de valor¿. Segundo o tucano, a senadora foi essencial para a aprovação da Emenda Constitucional nº 29, que trata da desatinação de recursos para a saúde. Serra também elogiou a postura de Dilma enquanto ministra da Casa Civil, por não ter discriminado partidos de oposição. Já Marina elogiou o governo Lula, do qual já fez parte, dizendo que o petista quebrou um paradigma ao mostrar que o crescimento do país poderia vir junto com a distribuição de renda.

Nós modificamos a relação federativa. Nunca deixamos de dialogar e nem reprimimos a marcha dos prefeitos¿

Dilma Rousseff, pré-candidata do PT

O PSDB ficou refém do que há de pior no DEM. E o PT, do que há de pior no PMDB. A história nos ensinou que temos que conversar¿

Marina Silva, pré-candidata do PV

Pode parecer uma heresia o que eu vou falar: se eleito, vou querer PT e PV no governo em função de objetivos comuns, com base em programas¿

José Serra, pré-candidato do PSDB

Confronto entre grevistas e tucanos

O primeiro encontro entre os presidenciáveis foi marcado por um tumulto provocado a partir de um protesto dos professores da rede estadual, em greve desde 8 de abril. Os manifestantes, ligados ao Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE), entraram em conflito com uma claque tucana que aguardava a chegada do ex-governador paulista no Expominas, em evento organizado pela Associação Mineira de Municípios (AMM). Eles furaram o cerco da polícia, jogando panfletos e objetos contra o grupo opositor e contra Serra, que teve de entrar protegido por partidários.

Um grupo de cerca de 200 professores ocupou o acesso à sala onde seria realizado o painel com os presidenciáveis, protestando contra o piso salarial. Eles gritavam palavras de ordem contra o governador Antonio Anastasia (PSDB). Anteontem, a Justiça considerou ilegal a greve dos professores da rede estadual por um aumento no piso salarial, determinando que eles voltassem às salas de aula. De acordo com os manifestantes, a ideia era tentar levar a questão salarial dos professores no estado aos pré-candidatos.

A polícia foi acionada para conter o grupo, que tentou invadir a sala onde acontecia o painel com a presença dos presidenciáveis, prefeitos e parlamentares. Manifestantes e seguranças da organização do evento chegaram a ensaiar uma briga. A polícia chegou na sequência e utilizou spray de pimenta para dispersar as pessoas.

À noite, durante coquetel no Palácio das Mangabeiras, após encontro com o governador Antonio Anastasia, o tucano José Serra comentou: ¿Honestamente não me vi como foco. Hoje tinha um debate muito importante de futuros candidatos a presidência. Então querer perturbar um ato desse também é violência que, na verdade, não contribuiu para a democracia: parece mais o estilo tropa de assalto¿. (DA, IS e JC)

Jarbas candidato

Às 15h01 de ontem, apenas um minuto a mais do que a hora marcada, Jarbas Vasconcelos (PMDB) ¿ foto ¿ entrou no minúsculo auditório do seu escritório político no Recife, no bairro da Ilha do Leite, que àquela altura já estava apinhado de jornalistas e aliados. Depois de um preâmbulo de cinco minutos, o senador e principal líder da oposição em Pernambuco disparou: ¿Vou disputar o governo porque os pernambucanos me pediram¿. Estava aberta a campanha. A entrevista coletiva criada para o senador revelar se seria ou não candidato tomou proporções bem maiores, mais precisamente da altura de um palanque. Ao lado dos líderes e dos principais políticos dos partidos aliados (DEM, PSDB e PPS), o ¿sim¿ de Jarbas aconteceu com o aditivo de outros elementos típicos de início de campanha. Em pouco mais de uma hora, o peemedebista agiu como um verdadeiro candidato: soltou várias frases de impacto e promoveu os primeiros ataques ao governador Eduardo Campos (PSB), com quem vai protagonizar um ¿clássico¿ da política local. Jarbas apoia o pré-candidato tucano, José Serra.

Título de eleitor com foto e digital

» A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou ontem a proposta que determina a inclusão de foto e impressão digital nos títulos eleitorais e o recadastramento de todo o eleitorado brasileiro no prazo de dois anos após a entrada da lei em vigor. Durante o recadastramento, todos os títulos deverão ser trocados pelo novo modelo. O projeto será analisado agora pelo plenário da Câmara. Caso seja aprovado, segue para o Senado. Conforme a proposta, o título de eleitor também deverá conter, além de outros dados de identificação do eleitor: data de nascimento, filiação, o número do CPF e da carteira de identidade expedida pela Secretaria de Segurança Pública, além de impressão digital. Atualmente, o título contém data de nascimento e espaço para impressão digital, que só é utilizado pelo eleitor analfabeto.