Título: A performance asiática e as exportações brasileiras
Autor: Ana Claudia Alem, Fabrício Catermol e Patrícia Zen
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2005, Opinião, p. A10

Brasil tem saldo comercial superavitário com a região

A Ásia se destaca na recente diversificação dos destinos das exportações brasileiras. O Brasil registrava um saldo comercial deficitário com os países asiáticos até 2001. A partir de 2002, a balança comercial entre Brasil e Ásia se reverteu, passando a apresentar superávit anual superior a US$ 2 bilhões. O principal elemento dessa reversão foi o aumento das exportações para a China, atualmente o principal parceiro comercial do Brasil na Ásia e o terceiro mercado importador de produtos brasileiros, depois dos EUA e da Argentina. Os países asiáticos destacam-se por alta renda per capita, pela manutenção de taxas de crescimento superiores aos demais países em desenvolvimento e pela elevada abertura de suas economias. A combinação dessas características contribui para elevação das vendas brasileiras para estes mercados. Nos anos 1960, entretanto, alguns países asiáticos possuíam níveis de renda similares aos de países africanos. O desenvolvimento econômico da Ásia, que gerou taxas de crescimento extraordinárias entre os anos 1970 e meados dos anos 1990, foi liderado pela forte expansão das exportações. Como resultado, além da forte elevação da proporção das vendas externas sobre o PIB, houve uma importante mudança estrutural da pauta de exportações: atualmente a participação de bens de alta e média-alta intensidade tecnológica respondem por mais de 60% do total exportado. Por outro lado, também a participação das importações no PIB é muito expressiva, pouco mais de 85% em 2003, frente pouco menos de 60% em 1983. Após a crise asiática, com o objetivo de reduzir a dependência das exportações, buscou-se a adoção, por parte dos policy makers asiáticos, de um espécie de "estratégia dual": estímulo ao mercado interno, simultaneamente à promoção do setor externo. O elevado crescimento de China e Índia tem impulsionado o comércio intra-regional mediante a geração de demanda por produtos asiáticos. As exportações do Sudeste Asiático para China cresceram 37% nos últimos dois anos e para a Índia se expandiram 26%. A China absorve cerca de 6% das exportações da região, segundo o Asian Development Bank (ADB). No ano de 2004, as economias em desenvolvimento da Ásia atingiram o maior crescimento desde a crise asiática. A expansão média real de 7,3% foi liderada pela demanda interna, combinada com um ambiente externo favorável. O desempenho da demanda doméstica foi importante para a expansão da região, como vem ocorrendo nos últimos dois anos. Em 2004, também se observou o melhor cenário externo em muitos anos. As economias da região se beneficiaram da expansão vigorosa dos países industrializados, em especial dos Estados Unidos, e do resto da Ásia, como China e Índia. A região exporta, principalmente, produtos eletrônicos e de tecnologia da informação, cujas demandas apresentaram recuperação expressiva em 2004. Por fim, a continuidade do crescimento chinês e o avanço da integração no Sudeste Asiático impulsionaram o comércio intra-regional, que registrou expansão de 25,5% em 2004. Como visto anteriormente, a China é o principal parceiro comercial do Brasil na Ásia. Em 2004, houve recorde histórico de exportações brasileiras àquele país (US$ 5,4 bilhões). Naquele ano, o saldo comercial brasileiro foi de US$ 1,7 bilhão. Durante a década de 1990, o Brasil em geral apresentou déficits comerciais com a China, apesar de não serem muito elevados. Após a China, os países do extremo oriente com as maiores importações provenientes do Brasil são Japão, Coréia do Sul, Tailândia e Hong Kong. O crescimento das exportações para a China não é elevado em 2005, mas deve ser considerado o desempenho em anos anteriores: crescimento de 80% de 2002 para 2003 e mais 20% em 2004.

Aumentar as vendas de produtos de maior conteúdo tecnológico à Ásia ainda é um desafio relevante para o Brasil

O Brasil exporta para mais de 30 países na Ásia e as vendas para a região, em 2004, responderam por 15% das exportações brasileiras. Os principais produtos exportados do Brasil para os países asiáticos são os classificados como básicos. Nesta categoria, a Ásia é o segundo destino das vendas brasileiras, com 26% de participação em 2004, atrás somente da União Européia. O próprio crescimento vigoroso das vendas para a China deve-se às exportações de minério de ferro e soja. Os dez principais produtos exportados pelo Brasil para os países asiáticos selecionados são básicos ou semimanufaturados - que representaram 55% das importações totais desses países do Brasil entre 2002 e 2004. Todos apresentaram expressivas taxas de crescimentos nos últimos anos. Os bens intermediários representam cerca de 80% das exportações brasileiras para os referidos países. Nesta categoria estão incluídos os básicos que ocupam as primeiras posições na pauta de importações de produtos brasileiros pelos países da Ásia. Cerca de 10% da pauta é composta por bens de consumo, em grande parte do setor de alimentos. Estas vendas para Ásia se expandiram em 47% entre 2003 e 2004, com destaque para o crescimento das vendas para China: 145% em 2004 e 97% no acumulado em 2005 até julho. Os bens de capital representam pouco mais de 4% nas exportações para Ásia e são constituídos principalmente por caminhões, máquinas agrícolas e aviões. Os países que possuem maior participação de bens de capital brasileiros na pauta de importações são Malásia, Indonésia, Cingapura e Coréia do Sul. Japão, Hong Kong e China são os que importam menos bens de capital proporcionalmente. O predomínio de produtos de baixo valor agregado manifesta-se claramente quando analisado o conteúdo tecnológico das exportações brasileiras para a Ásia. Do total das exportações brasileiras para esses países, 90% são produtos de baixa intensidade tecnológica ou commodities primárias. As manufaturas de alta e média intensidade tecnológica respondem por cerca de 10% das vendas externas para Ásia. Indonésia, Malásia, Cingapura e Coréia são os países que mais importam bens de maior conteúdo tecnológico. O Japão, embora compre apenas cerca de 8% de bens mais sofisticados, possui uma demanda expressiva por bens de alta intensidade tecnológica, figurando como segundo país que mais importa bens desta categoria (atrás somente de Cingapura). Os principais produtos exportados são automóveis, caminhões, máquinas agrícolas, aviões e produtos químicos. As perspectivas para as exportações brasileiras para a Ásia são positivas. O crescimento da Ásia deverá continuar robusto nos próximos anos, apesar de uma redução em relação ao desempenho em 2004. A expansão chinesa deve continuar forte, estimulando todos os países integrados à sua economia, e a maior contribuição da demanda doméstica nos países asiáticos tende a reduzir o impacto de eventuais condições adversas no mercado externo. Já a crescente integração regional, impulsionada por acordos de livre comércio e de investimento, vem aumentando a competitividade das cadeias produtivas asiáticas e elevando suas exportações. Isto aumentará a necessidade de importações - seja para atender o mercado doméstico, seja para atender a produção para exportação -, criando oportunidade para expansão das exportações brasileiras. Um desafio relevante para o Brasil continua sendo o aumento das vendas externas para a Ásia de produtos de maior conteúdo tecnológico, que agregam mais valor à pauta e cujo comércio é mais dinâmico em nível internacional. Isto assume ainda maior importância quando consideramos o comércio com a China: a permanência de uma pauta de exportações brasileiras para aquele país extremamente concentrada em commodities poderia levar a uma reversão do saldo comercial positivo nos próximos anos.