Título: Aéreas estrangeiras poderão assumir rotas
Autor: Janaina Vilella
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2005, Brasil, p. A9

Está pronto e tem sido permanentemente atualizado, no Departamento de Aviação Civil (DAC), um plano de contingência para lidar com a eventual paralisação da Varig. Funcionários do governo que tiveram acesso ao plano relataram que os cenários mais prováveis excluem o fim abrupto das atividades da empresa aérea, mas o trabalho contempla todas as possibilidades e tem especial preocupação sobre a forma como as companhias concorrentes assumirão os vôos feitos pela Varig. No cenário mais pessimista, em caso de falência, as aéreas estrangeiras serão chamadas a assumir temporariamente as rotas internacionais. Isso ocorreria até que as empresas nacionais, como TAM e Gol, tenham tempo de importar aeronaves para suprir a demanda. Nesse caso, toda a estrutura do DAC ficaria voltada para inspeção e liberação dos aviões trazidos pelas aéreas brasileiras. Até que isso acontecesse, entretanto, companhias estrangeiras seriam autorizadas a operar na "janela" das brasileiras. Pelos acordos bilaterais em vigor, existe um limite recíproco para o número de vôos semanais e passageiros transportados por companhias de cada país. Essa cláusula sofreria uma interrupção temporária. As autoridades brasileiras estão convencidas de que algumas empresas estrangeiras, com taxas de crescimento superior a 20% no número de passageiros embarcados em Guarulhos e no Galeão, só em 2005, não se recusariam a assumir rotas da Varig por um período determinado. O principal problema, nas condições atuais da aviação, é a pouca sobra de aeronaves para entrega imediata, com o reaquecimento do setor após o baque sofrido com o 11 de setembro. O governo teme que o ajuste, com a quebra da Varig, leve algum tempo e gere confusão para quem precisar viajar ao exterior em certas rotas. "Não é um processo ágil", disse uma fonte que teve acesso ao plano. "Não gosto nem de cogitar isso, mas é uma possibilidade que devemos estudar. Vai trazer uma enorme turbulência para nós, principalmente nos vôos para o exterior, onde haveria o maior problema", avaliou o ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia. Segundo o ministro, as estatais credoras da Varig - Infraero, Banco do Brasil e BR Distribuidora - receberam total autonomia para votar na assembléia a ser realizada no dia 19, no Rio. Apesar de ninguém desejar o fim da Varig na Esplanada dos Ministérios, frisou Walfrido, "as estatais se pronunciarão seguindo seus estatutos e as recomendações do Tribunal de Contas da União". As rotas nacionais seriam distribuídas a TAM, Gol e BRA - não por licitação, mas de acordo com a disponibilidade de aviões para atender a demanda causada pela hipotética saída de uma companhia que ainda detém 24% do mercado. Nos vôos domésticos, o plano do DAC prevê menos problemas com o rearranjo da malha aérea. As concorrentes não assumiriam exatamente as mesmas rotas e horários hoje feitos pela Varig, mas elaborariam com o órgão regulador uma nova tabela de vôos para aproveitar as aeronaves disponíveis, otimizando as rotas já realizadas e determinando escalas para suprir as cidades desabastecidas. Tudo isso não passa de cenário, mas pelo menos uma medida já foi adotada na prática. Silenciosamente, desde meados de 2004, o DAC intensificou a fiscalização dos vôos e dos reparos dos aviões da Varig. Trata-se de um reflexo direto do agravamento da crise da companhia, que levou a um crescimento significativo do número de denúncias sobre a segurança dos equipamentos. Fontes oficiais dizem que foi registrado um aumento significativo na quantidade de vôos em que um técnico em aeronavegabilidade (especialista em manutenção) e um aviador do DAC embarcam aleatoriamente vôos da Varig para checar as condições de segurança da aeronave e dos equipamentos. As mesmas fontes afirmam, no entanto, que o procedimento é preventivo, dada a situação da empresa, mas que a Varig tem prezado pela segurança dos vôos e que os problemas não podem, "em nenhuma hipótese", serem comparados com o caos predominante na Vasp, antes de ter parado de voar. Segundo os funcionários responsáveis pela segurança de vôo, os passageiros podem continuar viajando tranqüilamente. Eles elogiam a colaboração dada pela Varig no aspecto operacional e de manutenção. "Desde que a crise apareceu, o DAC vem trabalhando junto com a empresa em prol da segurança de vôo", afirmou o coronel Jorge Brito Velozo, subdiretor da entidade reguladora, aprovado ontem na Comissão de Infra-Estrutura do Senado como um dos futuros diretores da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Velozo não quis comentar, com a reportagem, o plano de contingência do DAC. No entanto, questionado pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS), que quis saber qual seria o impacto de uma eventual saída da Varig do mercado, ele respondeu: "O DAC tem um trabalho de contingência em relação a um problema mais vertical, para não deixar o mercado eventualmente desabastecido". "Acompanhamos muito de perto a situação", acrescentou Velozo.