Título: Eleição de 2006 inaugura novo ciclo
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 03/01/2006, Política, p. A4

Por tudo o que está em jogo, a eleição de outubro pode se transformar no início de um novo ciclo da redemocratização, lá se vão 21 anos. Além de referendo sobre o primeiro governo dito de esquerda do país, a vigência da cláusula de desempenho deve enxugar o quadro partidário e talvez estabelecer, a partir de 2007, novos parâmetros nas relações entre o Executivo e o Legislativo. É uma boa notícia para o próximo presidente da República, seja ele do PT ou da oposição. Aprovada há dez anos, a cláusula de desempenho - também chamada cláusula de barreira -determina que, a partir das eleições de 2006, somente terão direito a horário de televisão e rádio, fundo partidário e a regalias parlamentares os partidos que obtiverem 5% dos votos a deputado federal. Atualmente, há deputados de 16 legendas na Câmara. Tomando por base as eleições de 2002, hoje apenas sete partidos estariam representados: PT, PSDB, PFL, PMDB, PSB, PDT e PP. Pelos cálculos do presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), entre quatro e sete partidos devem superar a cláusula de desempenho nas eleições. PT, PSDB, PFL e PMDB, com certeza. As vagas restantes devem ser disputadas por seis legendas: PSB, PDT, PTB, PL, PP e PPS. Siglas históricas, como o PC do B, charmosas como o PV e recém-criadas como o P-SOL sumiriam do mapa - pelo menos até a próxima eleição, quando teriam nova oportunidade nas urnas. Dos três partidos mensalistas, apenas o PP conseguiu 7,8% dos votos contados das urnas em 2002. PTB (4,6%) e PL (4,3%) se adaptaram em seguida à legislação incorporando outras legendas minúsculas. Uma idéia do grau de dificuldade para atender à cláusula de desempenho é o exemplo do PSB: mesmo com o bom desempenho de seu candidato a presidente nas eleições passadas, o ex-governador do Rio Anthony Garotinho, o partido ficou no limite, com 5,27% dos votos apurados para deputado federal. O PDT (5,1%) é uma incógnita, mas a empreitada do PPS (3,06%) parece bem mais difícil. Com os partidos que não cumprirem a cláusula de barreira sem direito a programa semestral de rádio e TV, recursos do fundo partidário (as quatro maiores siglas receberam entre R$ 17 milhões e R$ 22 milhões ano passado) nem a um lugar na mesa diretora da Câmara e nas comissões técnicas, a tendência é que seus deputados migrem para aqueles que saltaram a barreira dos 5% dos votos nacionais.

Cláusula enxuga número de partidos

Um golpe em um negócio lucrativo que prosperou em várias eleições: a chamada legenda de aluguel. É certo que também pode ser fatal para as siglas históricas, como o PC do B e o PPS. Muito por culpa delas próprias, que em vez de votar a Federação de Partidos, que permitiria aglutinar semelhantes que não atingiram o percentual exigido, preferiram tentar derrubar ou minimizar de 5% para 2% a cláusula de desempenho. Após a redemocratização, houve época, no final dos anos 80 e início dos 90, que se contavam mais de 40 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral. Hoje eles são 30. Compreensível para a seqüência de um período em que a atividade partidária era engessada pelos militares. Com apenas seis ou sete legendas representadas, como se espera a partir de 2007, são evidentes as vantagens para a governabilidade, sobretudo no caso de presidentes forçados a negociar maioria a cada votação no Congresso ao preço de emendas parlamentares, cargos no Executivo e, ultimamente, mensalão. O senador Jorge Bornhausen, aliás, acredita que ficará mais fácil fazer a reforma política, prioridade declarada de todo presidente que se apossa do Palácio do Planalto que nunca sobrevive ao primeiro ano de mandato. É evidente que essa mudança não se dará do dia para a noite. É um processo talvez tão longo quanto o ciclo que se encerra com a eleição de 2006, quando os maiores partidos - PMDB, PSDB e PT - já terão passado pela experiência de ser governo. Jogo zerado, partidos aprumados por uma minirreforma realizada de baixo para cima, o presidente do PFL acredita que Executivo e Legislativo estarão prontos para tratar do que realmente é inadiável e está no centro de sucessivas crises: "Mexer no pacto federativo, a reforma do Estado, que tem um tamanho desnecessário e um custo elevadíssimo".