Título: Raul Pont responsabiliza política de alianças e Lula pela crise do PT
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Valor Econômico, 03/01/2006, Política, p. A4

O secretário-geral do PT, Raul Pont, disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como responsável direto pela política de alianças que levaram o PT ao poder, não pode se omitir em relação às denúncias de corrupção que assolam o governo federal e o partido. Segundo Pont, a gênese do escândalo está nos acordos políticos do PT com PTB, PP e PL, fechados com a anuência do presidente da República. "Foi ele (Lula) quem nos levou a essa política de alianças. Metade do partido, em 2002, era contra acordos com a direita", disse Pont em entrevista ao Valor. O secretário petista contou que defendeu que as alianças fossem programáticas, mas, segundo ele, a direção partidária deslumbrou-se com a possibilidade de vitória eleitoral. "A política desenvolvida por Lula foi um equívoco", afirmou Pont. Para o dirigente do PT, o preço pago pelas alianças está sendo alto demais diante dos supostos benefícios. Ele acredita que Lula teria sido eleito em 2002 mesmo sem os votos do PL e lembrou que PTB e PP só chegaram ao governo depois - o primeiro no segundo turno e o PP apenas no terceiro ano do mandato de Lula. Por isso, o petista gaúcho defende que Lula seja mais incisivo em apontar quem, de fato, o traiu. Com a ascendência política que tem sobre a legenda, Lula seria, na visão de Pont, fundamental para o processo de depuração interna do PT. "Ele tem que nos ajudar para que todos os envolvidos sejam, de fato, julgados e punidos. A melhor maneira de responder à sociedade seria agir assim. Estamos cobrando isso do presidente e do governo", assinalou o dirigente petista. O deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) concorda com a previsão, feita por Lula, de que o PT vai sangrar muito até as eleições. Ele avalia que apenas uma "refundação", com uma ação interna rigorosa de punição dos envolvidos nos escândalos, poderá fazer com que a legenda volte a ser depositária da confiança do eleitorado. "Não vai ser um processo fácil, vai gerar uma disputa interna intensa, mas é a única saída. O nosso desempenho eleitoral depende disso. Só assim vamos trazer a militância de volta", alertou Cardozo. Integrante da CPI dos Correios, Cardozo sente de perto os efeitos danosos à imagem do partido, mas ele defende que Lula não mergulhe na depuração interna da legenda. Ele disse que Lula deve se preocupar em governar e não em cobrar cabeças do PT. O deoutado acha que os recados dados pelo presidente são inequívocos. "Lula disse que foi traído e cobra do partido que resolva suas questões. Cabe a nós entender esses sinais, essas mensagens presidenciais e fazer o nosso trabalho", declarou Cardozo. O ministro da Coordenação Política, Jaques Wagner, deixou claro ontem como é tênue, na cabeça dos petistas, a noção de responsabilidade. Wagner reconheceu que o ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu, foi o grande mentor da política de alianças do PT, mas afirmou que ele não pode ser responsabilizado pela operacionalização desse processo, que acabou levando às denúncias de corrupção e Caixa 2. "É natural fazer uma concepção de crescimento, buscando metas, como crescer a base aliada ou ampliar o número de prefeituras. Mas, alguns limites precisam ser respeitados. E não foram", disse ele. O ministro avaliou que o "quisto" de corrupção está circunscrito e acha que o sangramento do PT está consolidado e não evoluirá. Wagner admitiu que os danos à imagem já estão presentes e só serão reparados com a demonstração cabal de que o governo quer combater a corrupção. "É evidente que o pecado do pregador é muito maior que o pecado do pecador. O PT sempre pregou a ética. Quando alguns dos seus, que faziam parte dessa pregação, são pegos pecando, o impacto é muito maior." Wagner sustentou que o PT não pode ser acusado de ter rasgado as bandeiras da esquerda, como atestam representantes do PPS, do PDT e do P-SOL. "Não gosto desses carimbos. Um governo que diminuiu a desigualdade social, implementou a reforma agrária, investiu na agricultura familiar não pode ser acusado de neoliberal", ponderou. Para o ministro, é preciso separar ações de ideologia. Ele disse que metas de inflação, bandas cambiais e superávit primário são instrumentos que possibilitarão uma distribuição de renda mais justa. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), aposta que o PT ainda é uma referência e não perdeu o status de maior partido da esquerda. Mesmo Pont, ligado à esquerda do partido, concorda com essa avaliação. "Rompemos com o FMI, o salário mínimo poderá valer US$ 150 em maio. O governo tem conquistas", disse ele. "O Executivo não se resume apenas a Palocci, Meirelles e taxa de juros."