Título: Governo ajusta cálculo do preço de transferência à variação cambial
Autor: Josette Goulart
Fonte: Valor Econômico, 03/01/2006, Legislação & Tributos, p. E1

Tributário Empresas exportadoras podem elevar em 35% suas receitas de 2005 em reais

O ministro interino da Fazenda, Murilo Portugal, assinou na semana passada uma portaria que vai adequar significativamente o cálculo do preço de transferência das empresas exportadoras. O governo autorizou um ajuste de 35% das receitas em reais para compensar a forte desvalorização do dólar frente ao real que, segundo o Valor Data, caiu 34,41% desde o início do governo Lula. A medida foi necessária porque as empresas sujeitas ao preço de transferência, aquelas que importam ou exportam de empresas coligadas, registraram em seus balanços receitas aquém da base de comparação de outros anos, pois os preços em dólar dos produtos exportados continuaram os mesmos enquanto o faturamento em reais caiu. O preço de transferência é um mecanismo criado pela Receita Federal para evitar que as multinacionais transfiram parte dos resultados tributáveis no país para o exterior por meio da manipulação de preços de importação e exportação ou de taxas de juros. Basicamente, uma empresa paga mais tributos a título de preço de transferência quanto menor for seu lucro ou receita e quando comparado, por exemplo, ao preço praticado em outras exportações ou até mesmo a uma média de receita em reais e preço praticado no mercado interno. As regras foram criadas para evitar que do exportar para uma coligada a empresa simule um lucro menor e, portanto, pague menos imposto. Mas a forte desvalorização do real causou um efeito perverso nesses cálculos, pois deu a impressão de que as empresas estavam vendendo mais barato para suas coligadas, segundo os consultores tributários da Deloitte Touche Tohmatsu, Marcelo Natale e Carlos Eduardo Ayub. Eles explicam que o ajuste de 35% poderá ser feito em três casos. O primeiro deles é para as empresas que fazem o cálculo pelo custo de aquisição mais o lucro, método conhecido por CAP. Podem também fazer uso do ajuste as empresas que usam como base de cálculo o preço médio praticado no mercado interno. De acordo com regulamentação da Receita Federal, as empresas ficam isentas do pagamento caso o valor médio das exportações seja de pelo menos 90% dos preços internos. Ainda poderão se beneficiar aquelas que usam a dispensa de comprovação, pois conseguem demonstrar uma lucratividade média constante nos últimos três anos de pelo menos 5% e, portanto, ficam isentas do preço de transferência. Pela Instrução Normativa nº 602 - assinada pelo secretário da Receita Federal, Jorge Rachid - , que regulamenta a portaria do Ministério da Fazenda, há ainda um outro benefício previsto: as empresas que optarem pela dispensa de comprovação poderão usar a lucratividade de 5% registrada apenas no ano de 2005. O ajuste de 35% das receitas em reais valerá apenas para o ano-calendário de 2005. A previsão legal para que Fazenda e Receita pudessem alterar os cálculos está na Lei nº 11.196, aquela oriunda da MP do Bem. A medida foi muito bem aceita pelos contribuintes que poderiam ter que pagar milhões a mais em impostos em função da desvalorização cambial. De acordo com o tributarista Wilson Alves Polônio, da WAP Consultoria, apesar de o dólar ter caído 12,4% neste ano, o governo pode ter considerado a desvalorização do dólar em todo o governo Lula que chega muito próximo dos 35% - ajuste agora concedido. O sócio da Deloitte, Marcelo Natale, elogia a medida, mas lembra que o governo precisa ficar atento agora para um efeito inverso, ou seja, da desvalorização do real que atingiria então o cálculo de preço de transferência nas importações.