Título: Governo libera verbas e dá novo impulso às ferrovias
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2005, Brasil, p. A4

Infra-estrutura Obras da Norte-Sul serão aceleradas no ano que vem

Com a reestruturação da Brasil Ferrovias e a assinatura do protocolo de intenções para construir a Nova Transnordestina, o setor ferroviário pode assistir a um salto nos investimentos. O próximo passo para revitalizar as estradas de ferro no país deverá vir com a aceleração das obras da Norte-Sul, resultado da promessa do governo de liberar recursos para o projeto em velocidade recorde, e uma emenda bilionária inédita, que pode ser incluída no Orçamento Geral da União de 2006. Na próxima segunda-feira, serão conhecidas as empreiteiras vencedoras da licitação para construir o trecho Babaçulândia-Araguaína (TO). São 50 quilômetros de trilhos, além de um pátio ferroviário, que permitirão a integração da Norte-Sul com a BR-153, rodovia conhecida como Belém-Brasília, dando uma alternativa para o escoamento da produção agrícola via porto de Itaqui, no Maranhão. A equipe econômica acaba de liberar mais R$ 140 milhões para o avanço da ferrovia, verba que não estava prevista no Orçamento federal e se soma aos recursos que já haviam sido destinados neste ano para o empreendimento. Na proposta orçamentária que o governo enviou ao Congresso, pediu R$ 110,9 milhões para a Norte-Sul em 2006. Com uma novidade: a inclusão da ferrovia no projeto-piloto de investimentos acertado com o FMI, indicação de que os recursos não sofrerão contingenciamento. De acordo com o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, Paulo Sérgio de Oliveira Passos, o governo pretende inaugurar o novo trecho da Norte-Sul até o fim de 2006. "Agora estamos no ritmo que gostaríamos", diz o secretário, que durante meses defendeu junto à equipe econômica a liberação de recursos para acelerar a obra. "Não temos problemas ambientais nem licitatórios", acrescenta. Passos afirma que o governo já trabalha no edital de licitação que oferecerá à iniciativa privada a construção de mais 359 quilômetros da ferrovia, por meio de parceria público-privada (PPP), até Palmas. Ele afirma que as obras, no valor aproximado de R$ 1 bilhão, serão licitadas no ano que vem. O ganhador, além de se encarregar da expansão da Norte-Sul, ficará com a subconcessão do trecho Açailândia-Araguaína, hoje operado pela Valec, uma estatal ligada ao ministério. Quando a ferrovia chegar até Araguaína, e posteriormente a Palmas, a idéia é ajudar a desafogar os portos do Sudeste. Por meio da Norte-Sul, os produtores poderão transportar as cargas até a Estrada de Ferro Carajás, da Companhia Vale do Rio Doce, e levá-las a São Luís. As estimativas do governo indicam que a Norte-Sul transportará 11,6 milhões de toneladas em 2011 (principalmente soja e fertilizantes), volume que subirá a 17 milhões de toneladas em 2016. A ferrovia estatal abocanhará metade do orçamento previsto pelo Ministério dos Transportes para o setor. A pasta também programa investimentos de R$ 30,1 milhões no contorno ferroviário São Félix-Cachoeira (BA), de R$ 14,7 milhões na adequação do ramal ferroviário do Rio de Janeiro, no perímetro urbano de Barra Mansa, e de R$ 11,3 milhões no contorno de São Francisco do Sul (SC). Esses três projetos também integram o projeto-piloto do FMI, que retira tais gastos do cálculo das contas públicas. Os empresários do setor acham pouco e queriam mais. "Reivindicamos recursos para institucionalizar o Programa Nacional de Segurança Ferroviária em Áreas Urbanas", afirma o diretor-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça. Dados da entidade apontam a existência de 1,2 mil passagens de nível extremamente críticas e 824 focos de invasão, envolvendo 200 mil famílias. Por lei, a área de segurança de uma linha férrea é fixada em 6 metros de distância de cada lado da via. Para solucionar o problema da invasão das faixas de domínio, é preciso investir R$ 720 milhões, segundo Vilaça. As concessionárias estão desobrigadas, por contrato, a fazer esse tipo de investimento. Na tentativa de melhorar o diálogo com o poder público e viabilizar recursos para o setor, os presidentes das sete concessionárias de ferrovias terão encontro, no dia 7 de dezembro, com os presidentes Aldo Rebelo (Câmara dos Deputados ) e Renan Calheiros (Senado Federal), além do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento. O lobby das ferrovias já teve pelo menos um resultado prático. A Comissão de Viação e Transportes da Câmara aprovou uma emenda coletiva que destina R$ 1 bilhão ao setor no Orçamento de 2006. Para garantir os recursos, o relator Carlito Merss (PT-SC) terá que apontar a fonte de receita para esse investimento. O Ministério dos Transportes apóia a emenda, que beneficia a Valec, mas deve ser redirecionada ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT). Não se acredita que a Fazenda liberará tamanha quantidade de recursos, mas os parlamentares apostam que pelo menos uma pequena parte dessas verbas pode ficar de fora de um provável contingenciamento. "Queremos eliminar os gargalos da malha ferroviária", diz o ex-ministro e deputado Eliseu Resende (PFL-MG), membro titular da Comissão de Viação e Transportes, referindo-se às passagens de nível e contornos de grandes áreas urbanas. "É preciso investir nessas áreas, onde existem problemas concretos para as comunidades locais", observa Fabiane Cunha, assessora de relações governamentais da Brasil Ferrovias. "Isso pode reduzir bastante o custo operacional das empresas, com o aumento de produtividade e a conseqüente redução dos fretes ferroviários, facilitando inclusive que as concessionárias refaçam os investimentos", acrescenta Resende. O problema, diz Vilaça, é que o dinheiro público não tem saído no ritmo desejado. As concessionárias têm investido entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões anuais na compra de material rodante e na conservação dos trilhos. Neste ano, conta o executivo, a produção do setor ferroviário (medida em toneladas transportadas por quilômetro) subirá 9,2%. Com esse desempenho, a participação das ferrovias na matriz de transportes aumentará um ponto, para 26%. Um ganho comemorado, mas visto também com preocupação pelas empresas do setor. "O crescimento pelos investimentos que aumentam a produtividade se esgota em 2010", avisa Vilaça. "Depois disso, o único caminho para aumentar essa participação é construindo mais quilômetros de ferrovias." A Transnordestina, cujo protocolo de intenções com a iniciativa privada foi assinado na sexta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevê investimentos de R$ 4,5 bilhões. Para viabilizá-la, o governo publicou no "Diário Oficial da União" uma alteração das normas dos fundos oficiais que financiarão as obras. A intenção é começar o empreendimento em 2006.