Título: Sob pressão, Supremo decide futuro de Dirceu
Autor: Juliano Basile e Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2005, Política, p. A8

Crise Julgamento, empatado em cinco a cinco, terá voto de minerva do ministro Sepúlveda Pertence

Sob clima tenso e com os ministros sentindo-se bastante pressionados, o Supremo Tribunal Federal (STF) decide na tarde de hoje o destino do processo de cassação do mandato do deputado José Dirceu (PT-SP). O desfecho do julgamento, interrompido semana passada empatado em cinco a cinco, é imprevisível e pode agravar ou atenuar a crise nas relações entre os dois poderes - deputados e senadores acusam o Supremo de interferência indevida em decisões que seriam exclusivas da Câmara e do Senado. Ontem, Dirceu divulgou um manifesto no qual 89 juristas e advogados afirmam que "o exercício de pressão política sobre o Judiciário busca comprometer sua tarefa de limitar e controlar os demais poderes dentro de suas competências específicas". Depois de uma semana de consultas de bastidor entre ministros do STF e congressistas, a avaliação na Câmara é que o Supremo deve adotar a "solução Peluso", pela qual o relator do processo, deputado Júlio Delgado (PSB-MG) apenas excluiria dos autos o depoimento da presidente do Banco Rural, Kátia Rabello: a defesa de Dirceu alega que não pôde responder ao depoimento da banqueira. A "solução Peluso", assim chamada porque teve, até aqui, apenas o voto do ministro Cezar Peluso, permitiria a votação do processo em sessão marcada para esta noite na Câmara e a pacificação dos ânimos Congresso-Supremo. Além disso, deixaria o STF politicamente à vontade para decidir, mais tarde, determinar que a CPI dos Bingos se atenha ao "fato determinado" para o qual foi criada, em ação a ser movida provavelmente pelo PT. Na avaliação dos deputados, essa "solução" só não será adotada se o ministro Sepúlveda Pertence, que vai desempatar o julgamento, vier com uma fórmula inteiramente diferente e conseguir mudar os votos de outros ministros do tribunal. No entanto, mesmo que a "solução Peluso" seja a adotada, é possível que a votação da Câmara seja novamente adiada. A defesa de Dirceu alega que o novo relatório de Delgado terá de ser lido outra vez no Conselho de Ética e que novos prazos de pedidos de vistas devem ser abertos. Assim, a votação ficaria para a primeira ou segunda semana de dezembro. Mas Dirceu já acusa o desgaste sofrido pelas sucessivas manobras protelatórias. Na avaliação do deputado, o momento atual é bom para que o processo seja julgado. Argumenta que durante esse período teria conseguido demonstrar que é vítima da arbitrariedade do Conselho de Ética - o que demonstrariam as decisões do Supremo em seu favor - e receber a solidariedade da sociedade. Ontem, além da carta dos juristas e advogados, na qual se destacam nomes como Aldo Lins e Silva, Dalmo de Abreu Dallari e Hélio Bicudo, Dirceu divulgou dois outros manifestos em defesa de seu mandato: um assinado por sindicalistas, o outro por artistas, intelectuais e profissionais liberais. A carta dos juristas também é assinada pelo ex-ministro da Educação Tarso Genro que, enquanto era candidato à presidência do PT, fez o que pode para retirar José Dirceu da chapa ao Diretório Nacional. Há três hipóteses possíveis para a decisão do STF. A primeira é o STF negar o recurso de José Dirceu e manter a votação sobre a cassação do mandato do petista. Até aqui, cinco ministros aderiram a essa corrente: Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Carlos Velloso. A segunda possibilidade é a "solução Peluso". A terceira, é dar a Dirceu a chance de responder ao depoimento de Kátia. Isso implicaria em anular o relatório aprovado no Conselho de Ética da Câmara. O processo atrasaria. O fim do mandato de Dirceu só seria votado no ano que vem. Quatro ministros foram favoráveis à tese de que é preciso dar ampla defesa ao deputado. São: Marco Aurélio, Celso de Mello, Eros Grau e o presidente da Corte, Nelson Jobim. O Valor conversou informalmente com alguns ministros que falaram se sentir desconfortáveis com as pressões sobre os seus votos. Alegam que estão votando uma questão "eminentemente jurídica": se durante um processo interno de cassação de mandato no Congresso é necessário dar a ampla defesa como ocorre no processo criminal. Mas o julgamento foi amplificado politicamente e a questão tornou-se bastante complexa. Alguns ministros do STF não conseguem esconder o incômodo. Dois deles chegaram a mudar de voto durante as discussões, o que não é comum no dia-a-dia do tribunal.