Título: Com Telemig, Opportunity volta à carga
Autor: Heloisa Magalhães e Talita Moreira
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2005, Empresas &, p. B3

Telefonia Operadora de celular mantém briga judicial em torno das operações da Claro em Minas Gerais

Uma disputa judicial entre a Telemig Celular e a Claro em Minas Gerais pode, indiretamente, abrir novo campo de batalha para o Opportunity e um flanco de resistência do banqueiro Daniel Dantas no setor de telecomunicações. No início deste mês, a Telemig Celular obteve liminar na Justiça do Distrito Federal que obrigou a Claro a suspender suas recém-inauguradas operações em Minas Gerais. As lojas da empresa foram fechadas e as estações radiobase foram lacradas. O argumento é de que Telemig e Claro são empresas coligadas - o que, segundo as regras do mercado de telefonia, impede que atuem na mesma área. De acordo com a operadora mineira, administrada pelo Opportunity e controlada pelos fundos de pensão e Citigroup, haveria cruzamento societário por meio da Telos, fundação previdenciária dos funcionários da Embratel. O raciocínio é o seguinte: a Telos é acionista da Telemig e, simultaneamente, o fundo é patrocinado pela Embratel. Essa empresa, por sua vez, tem o mesmo acionista controlador que a Claro. O mexicano Carlos Slim é o principal acionista da América Móvil e da Telmex, que são majoritárias na operadora de celular e na de longa distância, respectivamente. "Como é que eu posso permitir que um acionista participe do meu conselho de administração e leve informações para outra empresa? É desleal", declarou ao Valor o presidente da Telemig, Ricardo Grau. Numa tentativa de contornar o problema, a Telos obteve na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) autorização para transferir à Angra Partners a gestão suas ações na Telemig. A Angra é a mesma empresa que administra os investimentos dos fundos na Brasil Telecom. A decisão foi publicada ontem no "Diário Oficial da União", mas ainda depende de um ato do órgão regulador. A medida, entretanto, não deve representar o fim da disputa. Segundo a Telemig, a Anatel descumpriu uma decisão judicial, porque a empresa não teve o direito respeitado de ter vista ao processo. No entanto, a operadora não quis revelar qual será seu próximo passo. O primeiro alerta referente à suposta coligação com a Claro foi feito pela Telemig em setembro do ano passado, quando as duas operadoras participaram de um leilão de licenças de telefonia móvel promovido pela Anatel. A Telemig arrematou a autorização para atuar no Triângulo Mineiro e a Claro ficou com o restante do Estado. A agência homologou o resultado, mas alertou que, se fosse comprovada a coligação, as empresas teriam seis meses para desfazê-la. Após a Telemig ter recorrido à Anatel contra a homologação, o órgão mudou de posição. Em outubro deste ano, a agência concluiu que havia, sim, coligação. Mas, em seguida, após questionamento feito pela Claro, a Anatel recuou e voltou à sua posição inicial. O aspecto mais imediato da disputa revela uma estratégia da Telemig - maior operadora de Minas - para defender seu mercado diante da chegada de um rival. Na avaliação do presidente da Claro, Luís Cosio, a Telemig está preocupada porque "a luta vai ficar mais forte nesse mercado". Mas, para o executivo, a estratégia também pode ter como objetivo preservar o valor da Telemig, que está à venda. "Somos um concorrente agressivo. Eles temem isso, para mim é muito óbvio", disse. Outra hipótese considerada por ele é de que os acionistas da Telemig poderiam ter interesse em vender a empresa à Claro e, quanto mais forte ela estiver no Estado, menor será o interesse no ativo. "É obrigação dos administradores preservar valor para os acionistas. Agora, se por algum motivo a Claro está se sentindo pressionada a comprar a Telemig, isso é patético", disse Grau.

Para encerrar conflito, Telos abriu mão de direito de voto na operadora mineira, mas Telemig pode recorrer

Além dessas questões comerciais, fontes que acompanham a longa briga entre o Opportunity e os fundos de pensão avaliam que pode se tratar de uma nova cartada de Dantas para voltar à Brasil Telecom (BrT) e evitar sua destituição da Telemig Celular. Neste ano, o Opportunity foi afastado da gestão das empresas controladas pelos antigos fundos CVC nacional e estrangeiro, que têm como cotistas fundos de pensão e o Citigroup. A jóia da coroa nessa carteira de ativos é a BrT. Segundo esses interlocutores, com o argumento de que o patrocinador de um fundo de pensão é também seu controlador - como a Embratel em relação à Telos -, cria-se uma situação de participações cruzadas em outras empresas do setor de telecomunicações. "O Opportunity poderia alegar que há participações cruzadas, por exemplo, do Banco do Brasil e da Previ na Telemar e na BrT", afirmou fonte ligada a um investidor. Embora o Banco do Brasil já tenha manifestado que abre mão de seu direito de voto na Telemar, a decisão ainda não foi homologada pelo conselho diretor da Anatel. Na prática, a situação potencialmente conflitante continua valendo - pelo menos, há brecha para isso se essa interpretação prevalecer. Os fundos são grandes investidores do setor e essa interpretação sobre suas patrocinadoras só havia sido invocada uma vez, e pelo próprio Opportunity. A Newtel, empresa da cadeia societária da Telemig, alegou no passado que havia cruzamento entre a Telemig e a Telemar, que passou a operar no mercado de telefonia móvel em Minas, por meio da Oi, em 2002. A Previ desistiu de seu direito de voto na Telemar em abril. "Somente aí entramos em operação no Triângulo Mineiro", disse Grau. Mas, segundo ele, a Telemig concluiu que a sobreposição persistia por meio do Banco do Brasil, o que levou a instituição a também abrir mão de seus direitos na Telemar. O presidente da Telemig frisou que o embate com a Claro nada tem a ver com os acionistas da empresa. "Quem está conduzindo o processo é a companhia", afirmou. Procurado, o Opportunity não quis se manifestar sobre o assunto. Por meio da assessoria de imprensa, a Anatel informou que não poderia se pronunciar porque o processo corre em sigilo. Mas, segundo fonte da agência, com o afastamento da Telos a questão pode ser resolvida em curto prazo. "Só entramos em operação porque tínhamos certeza de que não havia nenhum impedimento", disse Cosio. Para ele, a operadora tem recebido da Anatel tratamento diferente do que o órgão regulador deu a outras operadoras em situação de participação cruzada. O presidente da Claro afirmou que a agência deu apenas seis meses para a empresa resolver uma potencial situação de conflito, quando em geral o prazo é de 18 meses. "Além disso, determinaram que não começássemos a operar quando já havíamos começado. Como podemos cumprir isso?" Segundo ele, um episódio como esse refreia o interesse do grupo em investir no Brasil, onde desembolsou mais de US$ 6 bilhões nos últimos dois anos. Carlos Slim estará no país amanhã e a expectativa é de que converse com autoridades brasileiras sobre o caso. Fonte ligada à Anatel reagiu quanto à interpretação de que teria sido concedido à Claro prazo para o descruzamento inferior ao habitual. De acordo com esse interlocutor, os 18 meses são estipulados para concessionárias. No caso das empresas autorizadas, a agência pode definir o período que julgar adequado. "A Anatel primeiro vende as licenças e depois examina a existência de cruzamentos societários", disse. O setor de telecomunicações convive com um emaranhado de participações acionárias cruzadas quase desde a privatização da Telebrás, em 1998. O primeiro caso surgiu quando o Opportunity adquiriu as ações da Inepar na Telemar, embora já estivesse no bloco de controle da Brasil Telecom.