Título: Lobbies americanos apostam em fracasso
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 12/12/2005, Brasil, p. A4

Os principais lobbies agrícolas em Washington estão relativamente tranqüilos em relação às negociações da OMC. Como a expectativa é que a União Européia não mexa na proposta de abertura dos mercados a produtos agrícolas, os defensores do sistema americano de subsídios acreditam que um fracasso na reunião de Hong Kong facilitaria o trabalho de manter o status quo. No início de novembro, os representantes das culturas mais subsidiadas, como açúcar, algodão e milho pediram que o ministro do comércio exterior, Robert Portman, retirasse a proposta de redução de subsídios agrícolas da mesa de negociações, já que a proposta européia foi considerada insatisfatória. Portman negou-se a isso, dizendo que equivaleria a sair da mesa de negociações. Às vésperas da reunião, contudo, Portman disse que se a UE não mudar a fórmula para redução de tarifas, os EUA talvez não possam manter a proposta atual relativa aos subsídios. As associações de sojicultores e produtores de leite já declararam que sem abertura de mercado substancial vão brigar contra mudanças em subsídios. "Não vejo grande preocupação com uma mudança substancial do sistema", diz um lobista que acompanha os interesses de grupos empresariais nas negociações. O argumento do secretário da Agricultura, Mike Johanns, para mudar o sistema é que sem avanço na Rodada Doha existe a possibilidade de mais perdas para os EUA em processos movidos na OMC contra os subsídios. A vitória do Brasil contra o subsídio do algodão, por exemplo, pode ser usada como base em processos contra de outras culturas - o sistema é basicamente o mesmo para as commodities agrícolas. A redução das expectativas em relação à reunião de Hong Kong foi demonstrada pelo cancelamento de viagens de comitivas do Congresso que iriam acompanhar as negociações. Representantes de indústrias e empresas de serviços, que querem ver avanço na abertura de outros setores em países em desenvolvimento, vêem com apreensão a possibilidade de fracasso nas negociações agrícolas. Para a American Business Coalition for Doha (ABCDoha), grupo criado por empresas americanas para pressionar por bons resultados nas negociações, a retirada da proposta dos EUA para subsídios agrícolas seria desastrosa. "Todos sabem que a agricultura é o pilar da rodada, e se não houver avanço não conseguiremos nada nas outras áreas", diz um dos representantes do grupo. Nos EUA, a negociação é uma corrida contra o relógio. A lei de Trade Promotion Authority (TPA), que dá liberdade de negociação de acordos comerciais ao Executivo, vence em julho de 2007. A negociação da Rodada Doha deve estender-se ao longo de 2006, mas se não houver resultados até o fim do ano que vem fica difícil conseguir aprovar mudanças no Congresso com base na legislação atual. Na última vez em que o TPA venceu, foi possível pedir apenas a extensão do prazo. Mas isso não será possível agora, disse o vice-USTR, Peter Allgeier, ao Valor. Teria de ser negociada uma nova legislação, o que levaria meses de discussão.