Título: Avançam as propostas para evitar lavagem de dinheiro
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 12/12/2005, Política, p. A6
Corrupção Empresários não serão "Pessoas Politicamente Expostas"
Bancos, empresários e políticos terão de alterar as suas rotinas para seguir metas de controle de lavagem de dinheiro e prevenção à corrupção. Os bancos terão de monitorar as contas de políticos. As empresas deverão sofrer alterações nos prazos de provisionamento de dinheiro (reserva para posterior saque) junto aos bancos. E os políticos sofrerão um acompanhamento mais minucioso de suas contas bancárias válido, inclusive, para os seus familiares. As metas foram decididas, ontem, ao final de encontro de quatro dias em Vitória de 29 órgãos públicos, como a Receita Federal e o Banco Central, e 15 entidades e instituições representativas de segmentos importantes da sociedade, como bancos, o Judiciário e o Ministério Público. Eles fixaram 29 objetivos práticos para o combate ao crime organizado e ao desvio de dinheiro público a serem cumpridos no ano que vem. Foi o terceiro ano consecutivo do encontro. A meta mais inovadora é a transformação de políticos e seus familiares em "pessoas politicamente expostas". As PEPs representam a idéia mais recente do governo para combater a lavagem de dinheiro no Brasil. Trata-se de um novo conceito pelo qual os bancos serão obrigados a fazer um acompanhamento sistemático sobre as movimentações financeiras de uma categoria especial de clientes. É a meta número 1 do encontro. "As PEPs funcionarão como um grande vacina contra a corrupção" , afirmou o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. "Há uma lista de pessoas importantes que merecem um foco mais aceso, um olhar especial", justificou. O problema está na definição da lista. Em princípio, as "pessoas politicamente expostas" serão políticos e funcionários de altos cargos do governo. Isso incluiria deputados, senadores e ministros. Está em discussão a extensão das PEPs para chefes de gabinete de parlamentares, secretários de governo e funcionários do terceiro e do quarto escalão da administração pública. No encontro, também foi discutida a inclusão de empresários na lista de PEPs. A idéia seria incluir os donos de empresas que possuem relacionamentos constantes com políticos e movimentam quantias consideráveis de dinheiro. Mas optou-se por restringir o enfoque a políticos e funcionários públicos. De acordo com Antenor Madruga, diretor do Departamento de Recuperação de Ativos Ilícitos (DRCI) do Ministério da Justiça, o Parlamento Europeu definiu formalmente as PEPs em 25 de novembro passado. São: "pessoas físicas a quem estão ou foram concedidas funções públicas, bem como seus familiares e pessoas a elas relacionadas". A definição de PEPs será coordenada pela Controladoria-Geral da União e deverá estar pronta até 31 de março de 2006. A expectativa é que siga as diretrizes européias, deixando empresários fora da lista. Em seguida, caberá ao BC regulamentar o acompanhamento das PEPs pelos bancos, o que terá de ser feito até 30 de junho. A regulamentação do BC será concluída, portanto, antes do início da campanha eleitoral do ano que vem.
Órgãos públicos e representantes do sistema financeiro fazem acordo para 29 medidas concretas
As empresas e os bancos serão afetados por outras medidas, como regulamentar o provisionamento obrigatório mínimo para saques em dinheiro. Isso significa permitir a notificação de futuros saques ao Judiciário e ao Ministério Público. Segundo Antônio Gustavo Rodrigues, presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda, as peculiaridades de cada setor da economia serão consideradas na regulamentação da meta. O BC terá de avaliar prazos menores para setores que fazem provisionamentos de saques mais constantes junto aos bancos. Empresas e bancos também terão de informar os transportes de dinheiro dentro do Brasil e para fora. Os bancos e as empresas que trabalham com carros-forte - especialmente, as companhias de seguros - terão de comunicar as suas atividades. A regulamentação será feita até 30 de junho próximo pela Receita, BC e pelo Coaf. As empresas poderão ser beneficiadas por metas que prevêem a retirada da guarda de bens apreendidos das mãos do Estado. A Justiça e o governo não querem mais ser responsáveis por bens apreendidos junto ao crime organizado, como carros, aeronaves e até animais, como avestruzes. A idéia, segundo disse Madruga, é incentivar as empresas a ingressarem neste mercado. Aqui, a proposta de regulamentação também terá de ser concluída até 30 de junho. E o DRCI terá de implementar um cadastro dos bens apreendidos. Quanto às pessoas físicas, o governo quer recriar a base de dados sobre a saída e a entrada de brasileiros do país, abolida no governo Collor. Isso deverá ser implementado junto com o novo passaporte até 30 de setembro de 2006. O governo também quer uniformizar os registros de vendas de imóveis para ter amplo acesso ao "caminho do dinheiro". Madruga explicou que o objetivo é uniformizar os registros públicos e informatizá-los. Integrantes do governo negaram aos jornalistas presentes no encontro que as medidas de combate à lavagem sejam uma resposta às investigações de corrupção envolvendo o PT. "Não é uma resposta ao 'Valerioduto'. Faríamos ainda que não tivesse acontecido", enfatizou Antenor Madruga, referindo-se ao escândalo político dos últimos meses. A secretária Nacional de Justiça, Claudia Chagas, explicou que a regulamentação das PEPs decorre de o Brasil ter assinado a Convenção da ONU de Combate à Corrupção, e não de escândalos políticos. O Brasil também terá de definir legalmente o terrorismo, seguindo outra recomendação internacional, completou. Uma meta deverá atingir a imprensa. O Ministério Público terá de aperfeiçoar a proteção de informações sigilosas nos Estados. O problema, segundo Madruga, é que o vazamento de informações está prejudicando acordos de cooperação com outros países, como a Suíça, os Estados Unidos e as Bahamas.