Título: Agressividade cambial do BC surpreende
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 12/12/2005, Finanças, p. C2

A agressividade demonstrada pelo Banco Central nas intervenções cambiais feitas nos últimos três dias da semana passada revela um inesperado grau de despreocupação com os rumos da inflação. Entre quarta e sexta-feira, o BC enxugou dólares do mercado ao ritmo entre US$ 800 milhões e US$ 1 bilhão por dia. A intenção, evidente para todo mundo, é puxar a cotação da moeda para cima. Depois que o dólar esbarrou no preço de R$ 2,17, o BC decidiu encerrar a brincadeira dos especuladores em derivativos. E a cotação disparou. Na sexta-feira, a moeda fechou a R$ 2,2520, valorização de 1,21%. No acumulado da semana, a alta foi de 1,95%. Vendidos em dólar na perigosa quantia de US$ 4 bilhões até terça-feira, os bancos já começam a ficar incomodados com a agressividade do BC. Tanto que, na sexta-feira, já não compraram contratos de swaps reversos - instrumento utilizado pelo BC para adquirir dólar no mercado futuro - com a mesma voracidade com a qual absorviam esses títulos no início do mês. Na sexta, o BC vendeu 68,8% da oferta e retirou US$ 410,9 milhões. O BC vem mostrando ao mercado que poderá elevar a cotação do dólar para o patamar que quiser independentemente da atuação dos estrangeiros, predominantemente vendidos, no mercado de balcão internacional. A puxada do dólar despreza os seus possíveis efeitos negativos sobre a inflação.

Cenário tranqüilo para inflação de 2006

Para o diretor da Modal Asset, Alexandre Póvoa, esse grau inesperado de descontração do BC com as conseqüências inflacionárias de suas atuações cambiais pode indicar a predisposição de o Copom agir, na próxima quarta-feira, de maneira mais ousada do que está sendo esperado pela grande maioria dos analistas. Póvoa não se surpreenderia se o Comitê ampliasse o ritmo de corte da Selic para 0,75 ponto já nesta reunião de dezembro. Se o Copom concentrar-se no comportamento recente da inflação não haverá razão para postergar para janeiro o início do período de baixas mais acentuadas da Selic. O IPCA de novembro, divulgado pelo IBGE na sexta-feira, mostrou que a inflação está muito bem comportada. O índice caiu de 0,75% em outubro para 0,55% em novembro, e sofreu influência quase exclusiva dos itens combustíveis e alimentação. Dezembro e janeiro não devem ser diferentes. O Departamento Econômico do Bradesco, outro banco que prevê redução de 0,75 ponto na quarta-feira, também fez leitura positiva do IPCA de novembro. A instituição enfatiza a tendência e o patamar do núcleo por expurgo. "Este núcleo tem apresentado uma tendência de arrefecimento nas últimas divulgações, além de estar situado em torno de 0,3%. Esta medida sugere que os preços livres sem alimentação estão bem comportados", diz relatório enviado aos clientes. Além da reunião do Copom, as atenções do mercado estarão voltadas para o último encontro do ano do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve, agendado para amanhã. O consenso absoluto é de nova alta de 0,25 ponto. O juro básico americano avançaria para 4,25%. Mas há uma grande expectativa em torno dos termos do comunicado pós-reunião. Parte do mercado aposta que o Fed poderá sinalizar a interrupção do ciclo de aperto monetário iniciado em junho de 2004, quando o juro estava em 1%. A economia americana mostra-se muito sólida e sem pressões inflacionárias. A confiança do consumidor persiste elevada. O indicador da Universidade de Michigan subiu para 88,7 em dezembro frente aos 81,6 de novembro, quando os economistas previam 85,5. Apenas a crença de que o Fed pode parar em breve de subir o juro já foi suficiente para deslocar montanhas de dólares para os países emergentes. O risco Brasil recuou 2,47% na sexta-feira, para 316 pontos-base.