Título: Princípio da virtualidade no processo penal
Autor: João Ibaixe Jr.
Fonte: Valor Econômico, 17/11/2004, Legislação, p. E2

"Há um novo princípio de ordem processual no ordenamento jurídico que aprimora o princípio da oralidade, arejando-o"

O Poder Judiciário deve ter como instrumento fundamental de trabalho a lei, que deve ser moderna a fim de refletir os verdadeiros anseios e atingir as reais finalidades para as quais ela foi elaborada. Em 1995 foi dado início a um processo de modificação do Poder Judiciário, enxugando-o de excessos formalistas desprovidos de sentido. Graças à Lei nº 9.099/95, criaram-se, em nível estadual, os juizados especiais, os quais se fizeram acompanhar de um novo rito processual mais rápido. Em continuidade, foi promulgada a Lei nº 10.259, de 2001, que instituiu os juizados especiais no âmbito federal. Objetivando trazer a Justiça para mais perto da população, o artigo 1º da Lei nº 10.259/01 remete o intérprete aos dispositivos constantes na Lei nº 9.099/95, podendo-se falar que os princípios processuais presentes nesta se aplicam necessariamente à primeira. O legislador consagrou textualmente (artigo 2º da Lei nº 9.099/95) os princípios da oralidade, da simplicidade, da economia processual e da celeridade. Tais princípios também se aplicam na esfera federal. Os princípios fundamentais nem sempre se encontram expressos na lei, mas aqui se preferiu sua positivação, com a intenção de exigir fiel observação. O princípio da oralidade opõe-se ao princípio da escritura ou da escrituralidade e determina a prevalência da comunicação oral sobre a escrita, devendo ser reduzidos a termo apenas os atos essenciais ao processo. Objetiva a simplificação procedimental. Em sendo a palavra o meio de diálogo entre o juiz e as partes, o entendimento passa a ser direto, permitindo uma apreensão global do litígio. Decorrentes deste princípio, são os da simplicidade, informalidade e celeridade, posto que, se a comunicação deve ser franca, o procedimento deve ser singelo e não exigir formalismos acentuados ou rígidos para permitir tal comunicação. Enfim, a linguagem processual deve ser direta e livre de toda burocracia possível. A simplicidade relaciona-se à singeleza dos atos, enquanto a informalidade, à inexigibilidade de formalidade rigorosa. O princípio da celeridade é resultado dos acima enumerados. Lastreados em atos simples, sem forma determinada ou definida, o processo tende a caminhar mais rapidamente. De acordo com o princípio da economia processual, procura-se obter o máximo rendimento da lei com o mínimo possível de atos, evitando-se dispêndio desnecessário de meios e recursos. É o mais destacado dos princípios, porque jamais o meio (para obtenção do justo) pode ser mais importante que o próprio justo. É este sempre o eterno fim almejado, porque não é a lide que traz a paz social, mas a decisão final, que concede ao legítimo titular o bem a que faz jus.

O princípio da virtualidade traz ao corpo judiciário os mecanismos tecnológicos para o verdadeiro cumprimento do processo

Além dos mencionados, há uma outra determinação legal de não menos importância. É o dispositivo contido no artigo 8º, parágrafo 2º da Lei nº 10.259/01, que determina a organização, pelos tribunais, de serviço de recepção de petições por meio eletrônico. Significa aceitar-se a possibilidade do processo ter um formato virtual. Todos os atos e documentos do processo são digitados ou escaneados, usando-se tecnologia digital, o que implica andarem ou tramitarem na memória de um computador. Não há papéis, nem carimbos, nem certidões de juntada ou desentranhamento. Tudo é virtual. Respeitam-se, deste modo, os princípios já citados. E mais, com a determinação legal e o reconhecimento do legislador de que a tecnologia deve ser serventuária do Poder Judiciário. Em julgamento recente, o Tribunal de Alçada Criminal (Tacrim) do Estado de São Paulo se utilizou de um recurso digital para proferir uma decisão. Trata-se do uso de lap tops para a elaboração e a leitura dos votos prolatados, permitindo-se decisões mais ágeis e um trânsito mais acelerado dos processos. A instalação de tal sistema pelo Tacrim vem ao encontro de um anseio social, expresso há pouco pela legislação e que é um gesto inicial da necessária modernização do Poder Judiciário. Diante de todo o exposto, afirma-se o advento de um novo princípio de ordem processual em nosso ordenamento jurídico, a aprimorar o princípio da oralidade, arejando-o. Fala-se do princípio da virtualidade, aquele que traz ao corpo judiciário os mecanismos tecnológico-eletrônicos para o verdadeiro cumprimento do processo, com efetiva solução da lide, sem burocracia excessiva e com a celeridade necessária a uma organização judicial contemporânea. Com efeito, ele significa a utilização dos adequados meios eletrônicos para o alcance mais rápido, efetivo e menos formal da jurisdição. Transforma o processo em um instrumento tecnológico a serviço de um Poder Judiciário moderno, de cunho realista, de visão progressista e realmente preocupado com a manutenção do equilíbrio social e a segurança jurídica, visando sempre à luta contínua pelo aprimoramento da Justiça.