Título: Para professor, política econômica e tecnologia ajudam Ásia
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 13/12/2005, Brasil, p. A3

Os países asiáticos crescem a taxas maiores e mais estáveis que os latino-americanos, em boa medida porque conseguem gerar crescimento robusto a partir do forte dinamismo de suas exportações, avalia o professor Gabriel Palma, da Universidade de Cambridge. Para ele, as diferenças na política econômica e na composição da pauta de exportações explicam boa parte do sucesso asiático e do fracasso latino-americano em transformar expansão significativa das vendas externas em forte avanço do PIB. Além disso, também ajuda o fato de que crises políticas não costumam paralisar os governos da Ásia, o oposto do que ocorre por aqui, afirma Palma. Palma nota que as exportações dos latino-americanos também crescem a taxas robustas. Em 2004, o volume de exportações da América do Sul e da América Central aumentou 13%, próximo dos 14% da Ásia, de acordo com a Organização Mundial do Comércio (OMC). Em termos de valor, as vendas externas do Brasil cresceram 32% em 2005, percentual quase idêntico aos 31% da Coréia do Sul. Para Palma, o problema dos países latino-americanos não é aumentar as exportações, mas sim em como traduzir essa expansão das vendas externas em crescimento do PIB. Enquanto o Brasil tem dificuldades em crescer acima de 3% a China avança algo como 9% ao ano. Na média, os países latino-americanos vão crescer 4,1% em 2005, de acordo com o WestLB. Os asiáticos, excluindo Japão, devem ter expansão na casa de 6,5%. Nos países asiáticos, as exportações equivalem a uma parcela maior do PIB do que na América Latina. Com isso, o impacto do crescimento das vendas externas sobre a economia tende a ser maior. Na China e na Coréia do Sul, elas representam 37% do PIB; no Chile, 34%, no México, 28%, na Argentina, 22%, e no Brasil, cerca de 16%. Desse modo, o aumento das exportações na China tem um impacto maior sobre o PIB do que no Brasil. O México talvez seja o exemplo que mais se adapta ao que diz Palma: as exportações são 28% do PIB, um número razoável, mas o país tem crescido pouco nos últimos cinco anos, a uma média de 2% ao ano. Em 2005, o país deve crescer algo como 3,2%. Para Palma, a composição das exportações dos países asiáticos e dos latino-americanos é um dos pontos fundamentais para explicar desempenhos tão díspares. Uma diferença é que os primeiros aumentaram significativamente a presença de produtos de alta intensidade tecnológica na pauta de vendas externas, como mostra um estudo do professor Luciano Coutinho, da Unicamp. Em 1993, esses produtos respondiam por 15% da pauta chinesa e por 30,4% da coreana. Em dez anos, aumentaram para 34% no caso da China e para 42% no da Coréia do Sul. No Brasil, houve aumento bem mais modesto, de 9,7% para 12,2%. Uma das vantagens de exportar produtos mais sofisticados é que há um encadeamento mais forte com outros setores da economia, diz Palma. Segundo ele, a produção de mercadorias com maior intensidade tecnológica leva a uma integração maior com outros segmentos da indústria, o que tende a se traduzir em crescimento maior do PIB, pois mais setores são impulsionados. Segundo o Credit Suisse First Boston (CSFB), ainda que a participação de produtos considerados básicos esteja na casa de 30% do total das exportações brasileiras, uma análise mais detalhada mostra que nada menos de 50% dos bens vendidos pelo país podem ser classificados como commodities ou quase commodities, como o suco de laranja. Para o chileno Palma, a política econômica é outro fator crucial que explica o desempenho dos asiáticos. Esses países, ressalta ele, mantêm o câmbio desvalorizado e estável, os juros baixos e fazem investimentos públicos em infra-estrutura. É uma receita bem diferente da maior parte dos latino-americanos, e exatamente a oposta da adotada pelo Brasil nos últimos anos, baseada em juros estratosféricos, dólar barato e investimentos públicos muito baixos. Para Palma, é fundamental que haja previsibilidade em relação aos juros e ao câmbio para que o setor privado tenha mais confiança para investir. Com isso, não é difícil entender por que a taxa de investimento por aqui está abaixo de 20% do PIB, bem abaixo dos cerca de 30% do PIB na Coréia. A imprudência quanto ao câmbio não se limita ao Brasil, diz ele. No Chile, o peso se valorizou 40% nos últimos dois anos e meio em relação ao dólar, em termos nominais. Como a inflação chilena é baixa e a dos EUA também, a apreciação real do câmbio não é muito diferente desses 40%, afirma Palma. Para ele, os países latino-americanos parecem muitas vezes lutar "batalhas de ontem": a ortodoxia do Banco Central (BC) brasileiro mostraria que a instituição age como se a hiperinflação estivesse ainda por perto, o que não é o caso. Os asiáticos também têm outros trunfos, ao não ter pudores em adotar políticas industriais e comerciais ativas. Aumentar o grau de processamento de produtos primários e o percentual de insumos domésticos nos bens manufaturados são duas estratégias mais óbvias, diz Palma. No México, por exemplo, o conteúdo doméstico em produtos manufaturados oscila entre 10% e 15%; na China, está na casa de 50%. Outro ponto que atrapalha o crescimento de países latino-americanos é o fato de que crises políticas costumam paralisar totalmente o governo, o que não ocorre na Ásia, avalia Palma. Segundo ele, os países asiáticos são tão ou mais corruptos que os latino-americanos, mas por lá escândalos políticos não provocam letargia governamental. Palma acredita que o nível de profissionalização do setor público ajuda a explicar a diferença, mas ele diz que o peso do setor produtivo é mais forte nesses países. "Os empresários dos países asiáticos não permitem que as lutas políticas afetem a economia ou as decisões do Estado relacionadas à infra-estrutura."