Título: Caixa aposta na Timemania para reviver o negócio das loterias
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 19/12/2005, Brasil, p. A2

A Timemania é a aposta da Caixa Econômica Federal para dar novo fôlego ao negócio de loterias, que permaneceu praticamente estagnado em 2005, com arrecadação bruta projetada em R$ 4,4 bilhões. A Câmara já aprovou o projeto que cria o novo jogo e o assunto deve ser examinado pelo Senado na convocação extraordinária do Congresso. O crescimento das loterias em 2005 é calculado em apenas 4%, o que não repõe a inflação do período, estimada pelo mercado em 5,7% pelo IPCA. A expectativa da Caixa é que a Timemania se torne uma das três principais loterias do país, com arrecadação bruta superior a R$ 500 milhões. Parte do fraco desempenho se deve à saturação das casas lotéricas, que ficaram sobrecarregadas ao se tornarem correspondentes bancários sem infra-estrutura tecnológica adequada. O gargalo deverá ser superado até maio, quando os atuais terminais serão substituídos por novos, que farão o tempo de cada transação cair de 8 para 2 segundos. Outro problema são os baixos prêmios, cada vez menores devido aos impostos e às obrigações de repasses a programas públicos diversos. Apenas 32% dos recursos arrecadados são distribuídos sob a forma de prêmios. Com a promessa de retorno maior, jogos ilegais (entre eles o bicho, caça-níqueis e bingos) e loterias estaduais - parte delas contestada na Justiça - arrebanham a maior parte do mercado de jogos. Não há estatísticas sobre o segmento, mas estimativas de especialistas na área indicam algo como R$ 12 bilhões anuais. No Brasil, a arrecadação per capita de loterias legais é de US$ 6,80, uma das menores do mundo, segundo dados da World Lottery Association (WLA), a associação mundial de loterias. Em Cingapura, arrecada-se US$ 679 per capita; na Espanha, US$ 371,20; e, nos Estados Unidos, US$ 162. "A experiência mostra que, quanto maior o prêmio oferecido, maior o apetite dos apostadores", diz o superintendente de loterias da Caixa, Paulo Campos. No caso da Mega-Sena, por exemplo, R$ 20 milhões é o valor a partir do qual as apostas crescem de forma exponencial. Repasses diversos e impostos ficam, em média, com 48% da arrecadação das loterias, incluindo clubes de futebol, comitês olímpico e paraolímpico e fundos nacional da cultura e do crédito educativo. A lista, que já é grande, está em contínua expansão, com mais de 30 projetos tramitando no Congresso criado novas destinações. Os 20% restantes da arrecadação das loterias cobrem custos operacionais, incluindo comissão de lotéricos (11%) e despesas de fornecedores. A Timemania não foge à regra. A princípio, seria criada para ajudar clubes de futebol em dificuldade -pelo projeto aprovado na Câmara, 22% da arrecadação serão distribuídos a título de direito de arena, com receita inicial revertida ao pagamento de dívidas fiscais. Mas emendas aprovadas destinaram parte da arrecadação a Santas Casas de saúde (3%) e aos comitês olímpico e paraolímpico (2%). Em outros países, diz Campos, são reservados pelo menos 50% líquidos para o pagamento de prêmios aos apostadores. Para ele, se as alíquotas de impostos e de repasses caírem, a arrecadação bruta da loteria se expandirá, com benefícios para todos os programas públicos. Seria como se nesse mercado se aplicasse uma curva de Laffer, aquela controversa teoria apresentada no início da década de 1980 pelo economista Arthur Laffer. Ele advogava que, a partir de determinado nível, a alíquota de impostos diminuía de tal forma os rendimentos líquidos dos cidadãos que eles não achavam vantajoso trabalhar mais. Alíquotas menores, portanto, incentivam o trabalho, elevando arrecadação. O corte de alíquotas foi implementada pelo governo Ronald Regan, nos anos 1980, e o que se viu foi queda de receitas e déficit público. No caso das loterias, porém, há alguma evidência de que prêmios maiores levariam a mais apostas. A Mega-Sena passou, na década de 1990, a trabalhar com o conceito de "jack pot" - de grandes prêmios - com o acúmulo de parte das arrecadação para ser sorteada nos concursos com final 0 e 5. Prêmios mais vistosos atraíram mais apostadores. "Quando os prêmios estão acumulados, formam-se filas nas loterias", diz Campos. Os maiores interessados na nova loteria, os clubes de futebol, não esconderam a satisfação com a aprovação do projeto pela Câmara dos Deputados. "Pela primeira vez as nossas entidades foram ouvidas e atendidas, sem que desta interação resultasse qualquer concessão de privilégios", escreveu em uma carta de agradecimento ao ministro dos Esportes, Agnelo Queiroz, o presidente do Clube dos 13 - entidade que reúne a elite do futebol brasileiro -, Fábio Koff. A Timemania, continua, "não desvia um centavo do erário público e devolve aos clubes a dignidade de contribuintes adimplentes". Já o presidente do Sindicato do Futebol, Mustafá Contursi, acha que a aprovação na Câmara é apenas "uma primeira etapa" do processo que qualificou de "reorganização financeira e administrativa do futebol brasileiro". Contursi, que diz expressar o sentimento dos clubes, afirma que "o início da Timemania tem sido doloroso", isso porque a aprovação do projeto tem demorado muito, o que provoca "tensão" entre os dirigentes. Contursi, ex-presidente e atual presidente do Conselho Deliberativo do Palmeiras, diz que a expectativa é de que 80% dos clubes consigam se reorganizar no prazo de duração do benefício da loteria, de dez anos. E aguarda ansioso a sanção do presidente Luís Inácio Lula da Silva ao projeto. "A partir daí os clubes já estarão protegidos", justifica. (Colaborou Carlos Motta)