Título: Brasil perde espaço no mercado consumidor dos países ricos
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 10/01/2006, Brasil, p. A3

Relações externas Participação de EUA e UE na pauta brasileira caiu quase 10 pontos desde 2002

A participação dos Estados Unidos e da União Européia nas exportações brasileiras caiu quase 10 pontos percentuais nos últimos três anos. Em 2002, americanos e europeus compravam 51% dos produtos que o Brasil vendia no exterior. Em 2005, esse percentual recuou para 41,6%. No ano passado, as exportações brasileiras para os EUA e para a UE cresceram, respectivamente, 12% e 10%, metade da alta de 23% das vendas totais do país. Os dados também indicam que o Brasil pode estar perdendo espaço nos mercados americano e europeu para concorrentes como China e Índia. As vendas do Brasil para EUA e UE estão crescendo um pouco abaixo das importações totais desses países e significativamente menos que as vendas de China e Índia. Segundo os números mais recentes do Departamento de Comércio dos EUA, as importações totais do país subiram 14% de janeiro a outubro de 2005 ante igual período de 2004, percentual idêntico aos 14% projetados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para o crescimento do comércio global em 2005. No caso da União Européia, as importações aumentaram 11% de janeiro a outubro, conforme o Eurostaat, órgão de estatísticas da UE. Os americanos importaram US$ 1,38 trilhão do exterior nos primeiros dez meses de 2005. As exportações da China para os EUA cresceram 25,7% de janeiro a outubro de 2005 ante igual período de 2004. Pequim embarcou US$ 200 bilhões para o país - 10 vezes mais do que o Brasil, que exportou US$ 22,7 bilhões em 2005. O patamar de exportações da Índia para os EUA é similar ao brasileiro: US$ 15,6 bilhões. Mas o ritmo de alta dos embarques está em 19%. A União Européia comprou US$ 987,2 bilhões do mundo de janeiro a outubro do ano passado. O ritmo de crescimento de suas importações foi fraco por conta do frustrante desempenho da economia do bloco. Mesmo assim, chineses e indianos ganham espaço. A Índia elevou as vendas para a UE em 18% de janeiro a setembro de 2005. Já os embarques da China para a UE cresceram 24% no período. A possível perda de participação do Brasil nos mercados dos países mais ricos suscita críticas à estratégia do governo Lula, que privilegiou a relação com os países pobres. As negociações do Acordo de Livre Comércio das Américas (Alca) e do Mercosul com a União Européia estão paradas. "O Brasil precisa reanimar essas negociações nesse último ano do governo", defende Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O governo argumenta que o Brasil está diversificando mercados. Apesar da perda de participação dos EUA e da UE, as exportações brasileiras totais quase dobraram nos últimos três anos, para US$ 118 bilhões em 2005. Os embarques cresceram 32% para o Mercosul, 27,9% para a Ásia e 41,4% para a África. Com seu grande apetite por commodities, a China contribuiu para a diversificação. A participação do país asiático na pauta de exportação brasileira, que era de 1,97% em 2000, chegou a 6,2% em 2003, para recuar para 5,6% em 2004 e ficar em 5,8% em 2005. Os economistas creditam o fraco ritmo de crescimento das exportações brasileiras para os Estados Unidos à valorização do real, que subiu 14,15% ante o dólar no ano passado, afetando a competitividade dos manufaturados. "Não se sai de um câmbio de R$ 3,5 para R$ 2,3 sem nenhum efeito", diz Júlio Callegari, economista do J.P. Morgan. Para a UE, é forte o impacto da quebra da safra agrícola e da queda do preço das commodities. Os EUA são um grande comprador do produtos manufaturados brasileiros, respondendo por 28,7% do total. Enquanto as vendas totais de manufaturados brasileiros no exterior expandiram 23,5% em 2005, as exportações dessa categoria para os EUA subiram apenas 9,3% de janeiro a novembro de 2005 ante igual período de 2004, conforme a Secretaria de Comércio Exterior (Secex). As vendas de aviões brasileiros para os EUA caíram 15,8% no período, impactando o resultado total, já que o produto representa 8,6% dos embarques. A Embraer mudou sua linha de aviões e a expectativa é de retomada das vendas em 2006. As exportações de calçados - produto sensível ao câmbio e importante na pauta - cederam 6,9%. As vendas de semimanufaturados de ferro e aço recuaram 11,4%. Em compensação, as exportações de celulares foram destaque e subiram 52%. Apesar do câmbio, as exportações de produtos manufaturados para a América Latina cresceram 16,6%. Isolando o Mercosul, a alta foi de 21%. José Augusto de Castro Neves, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que a valorização da moeda brasileira prejudica mais as exportações de manufaturados para os EUA do que para a América Latina. "Os Estados Unidos são o mercado mais competitivo do mundo. Os produtos brasileiros concorrem com os chineses", justifica. Ele diz também que os exportadores brasileiros contam com preferências tarifárias por conta de acordos comerciais no mercado latino-americano e trabalham com risco de crédito menor. Callegari, do J.P. Morgan, ressalta que os países da América Latina cresceram acima da média mundial, o que ajuda as importações. Segundo estimativas do banco, a Argentina expandiu sua economia 9% em 2005, Venezuela em 9,5%, Chile em 6,2%, Peru em 5,5% e Colômbia em 4,5%, enquanto o Brasil cresceu 2,4%. "O crescimento da América Latina ficou acima da média. Foi um bom ano para os países emergentes", concorda Cristiana Sant'anna, da LCA Consultores. A União Européia mantém a liderança de principal parceiro comercial do Brasil ao adquirir o equivalente a US$ 26,5 bilhões do país em 2005 - 22,4% do total , mas é seguida de perto pela América Latina. Os países da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) elevaram sua participação nas exportações do Brasil para 21,5% em 2005. A diferença para a UE é de 0,9 ponto percentual. Em 2004, estava em 5 pontos. Callegari credita a perda de participação da UE nas exportações brasileiras no último ano à quebra da safra agrícola, principalmente de soja. O bloco europeu absorve 40% das vendas de produtos básicos (commodities agrícolas e minerais) do país. Os embarques dessa categoria de produtos para a UE cresceram 9,44% de janeiro a novembro. As exportações brasileiras de produtos agrícolas para a UE crescendo ainda menos, 4,88% no período. A fatia do bloco na exportação do agronegócio caiu de 34,5% de janeiro a novembro de 2004 para 32,6% em 2005, segundo o Ministério da Agricultura.