Título: Sentimento anti-EUA não prejudica múltis americanas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 19/12/2005, Internacional, p. A11

Desde a irrupção da guerra no Iraque, as empresas dos americanas vinham se preparando para uma reação negativa dos consumidores de outros lugares do mundo. Pesquisas de opinião demonstraram um surto de sentimento antiamericano na Europa e no Oriente Médio depois do início da guerra, em 2003. Mas um dos primeiros estudos empíricos detalhados, realizado por Peter Katzenstein, da Universidade Cornell, e Robert Keohane, da Universidade Princeton, desmascara a idéia de uma reação contrária às companhias americanas. O fato de que as vendas de companhias intimamente identificadas com os EUA não caíram no exterior é, sob alguns aspectos, surpreendente. Katzenstein e Keohane citam uma pesquisa de 2004, conduzida pelo Global Market Insite, na qual foram feitas duas perguntas a milhares de consumidores em oito países (Canadá, China, França, Alemanha, Japão, Rússia, Reino Unido e EUA) sobre 53 companhias americanas: iriam eles evitar produtos americanos por causa da recente política externa e ações militares americanas? E em que medida viam eles determinadas empresas como "extremamente americanas"? No total, 20% dos europeus e canadenses disseram estar evitando conscientemente produtos americanos. Entre as companhias mais vulneráveis a boicotes de consumidores estão a American Airlines, United Airlines, General Motors, Wal-Mart, CNN, American Express, McDonald´s, Coca-Cola, PepsiCo e Marlboro. A Nike não ficou muito atrás. Imediatamente após a invasão do Iraque, diversas reportagens na imprensa falavam de boicotes a produtos americanos na Europa. Will Hutton, um jornalista econômico britânico, afirmou que o centro do movimento de boicote estava na Alemanha e que "os boicotes e a avalanche de publicidade negativa em torno dele são uma tempestade de advertências sobre o que pode vir pela frente". Inúmeras empresas de mídia anunciaram que companhias como a Coca-Cola e o McDonald´s estavam registrando quedas em suas vendas na Alemanha e em outros países na Europa. Os professores Katzenstein e Keohane empenharam-se em um exame mais sistemático dos dados. Eles estudaram as receitas de três grandes companhias americanas produtoras de bens de consumo - e três de suas concorrentes européias - na Europa e no Oriente Médio, entre 2000 e 2004. As empresas americanas foram Coca-Cola, McDonald´s e Nike. As três companhias européias - Adidas-Salomon, Cadbury Schweppes e Nestlé - foram escolhidas porque competem nos mesmos setores de atividade. Como anotam Katzenstein e Keohane: "Se o antiamericanismo tivesse produzido um impacto significativo sobre as vendas, teríamos detectado quedas nas vendas de companhias dos EUA na época em que o sentimento antiamericano cresceu acentuadamente na Europa, em comparação com 2000-01. Essa queda nas vendas das empresas americanas deveria ter ocorrido tanto em termos absolutos como em relação ao desempenho de companhias européias". Na realidade, aconteceu o contrário (veja a tabela). Entre 2000-01 e 2003-04, todas as seis empresas incrementaram suas vendas na Europa. As companhias americanas também cresceram pelo menos com a mesma rapidez que suas concorrentes européias. Por que teria isso acontecido? Pode ser que as empresas americanas empregaram estratégias de marketing inteligentes que se contrapuseram a qualquer surto de antiamericanismo. Ou o fato talvez se deva simplesmente a que os consumidores europeus continuam capazes de distinguir claramente entre o presidente Bush e um Big Mac.