Título: "Sangrias" em coligadas minaram a Varig
Autor: Raquel Balarin e Vanessa Adachi
Fonte: Valor Econômico, 20/12/2005, Brasil, p. A3

Especial Auditorias revelam negócios suspeitos, mas investigados dizem que tudo não passa de briga política

As idas e vindas da Fundação Ruben Berta - que contrata executivos e os demite em seguida, que negocia com a TAP e fecha um acordo com o empresário Nelson Tanure - são apenas a ponta visível das ações de uma instituição pautada por brigas políticas e luta por poder. O que poucos vêem são as várias decisões dessas facções que provocaram sangria de milhões de reais dos caixas das companhias do grupo Varig, contribuindo para que elas chegassem à situação falimentar atual. Auditorias indicam que, em apenas quatro anos, do fim dos anos 90 até meados de 2003, a Varig assumiu perdas de R$ 160 milhões decorrentes de negócios danosos realizados por cinco de suas controladas: Varig Travel, hoje em liquidação, Varig Agropecuária (Vagro), atualmente esvaziada, VarigLog, Rotatur e Tropical de Hotéis. O valor pode parecer pequeno diante da gigantesca dívida de R$ 7 bilhões da companhia, mas os casos são considerados emblemáticos da forma de operar do grupo. A checagem dessas operações foi feita a pedido do conselho de curadores da Fundação Ruben Berta que assumiu o comando do grupo após a queda de Yutaka Imagawa, em 2003. Entre os nomes fortes dessa nova fase estava Carlos Luiz Martins, demitido da presidência da Varig neste ano. Imagawa foi afastado em assembléia realizada em 24 de maio de 2003 e retornou ao poder em duas ocasiões por meio de liminares judiciais, para sair definitivamente em julho daquele ano. Ele entrou na Varig nos anos 70 e por sete anos integrou o conselho curador da FRB, tendo sido o seu presidente nos últimos quatro anos e meio em que esteve lá. Ele e seu grupo eram tidos como contrários à pretendida fusão com a TAM. Pessoas próximas ao ex-todo poderoso da FRB dizem que houve perseguição e que a atual operação de venda de VarigLog e VEM é que seria um "golpe de mestre" para transferir linhas da Varig ao novo comprador da empresa e logística. Ao longo de duas semanas, o Valor analisou processos judiciais e entrevistou uma dezena de pessoas. Concentrou o trabalho nas cinco empresas alvo de auditorias conduzidas internamente e pela Ernst & Young, pela Kroll e pelo escritório de advocacia Demarest & Almeida entre 2003 e 2004. Na VarigLog, o sistema de informática custou R$ 14 milhões e foi abandonado em um ano porque não era adequado ao objetivo da empresa. O programa foi feito por um fornecedor que já fora prestador de serviços do presidente da VarigLog, José Carlos da Rocha Lima, em suas passagens pelos Correios e pela Vaspex. As auditorias apontaram indícios de que Rocha Lima seria sócio indireto da Embralog, que desenvolveu o sistema. Ele nega. Na Varig Agropecuária, questiona-se a transferência da Seletto Alimentos e de alguns outros ativos à Aastec, empresa especializada em planejamento tributário. O comprador não desembolsou dinheiro, mas assumiu dívida da Varig com o INSS, que não foi paga. O governo ameaça executar a Varig e os atuais donos da Seletto têm uma ação de indenização contra a aérea e a Fundação Ruben Berta. O negócio mais polêmico é o da Varig Travel, em que a Varig fez uma sociedade com os irmãos Humberto e Walter Folegatti, que eram proprietários da Panexpress. Donos de 8% da empresa, eles ganharam o direito de usar a marca Varig Travel por dez anos, cinco deles em regime de exclusividade. Dizem que têm R$ 11 milhões a receber, quando as auditorias indicam que eles devem à VT, hoje em liquidação sob o nome de NN. O grupo liderado por Yutaka Imagawa está hoje fora da Varig, embora muitas das pessoas que assinaram os contratos continuem na FRB. Imagawa acusa o grupo que o sucedeu de tomar decisões que só ampliaram o rombo da Varig. "Se tem algum executivo dessa empresa que não se locupletou, fui eu. Não tomei nada em benefício próprio." O ex-executivo diz que seu plano para salvar a Varig contemplava a criação de subsidiárias, como VarigLog, VEM e Varig Travel, que teriam participações minoritárias vendidas para capitalizar a empresa mãe. "Esse era o projeto de saneamento, que foi abortado."