Título: Acordo fixa em R$ 1,05 teto para álcool
Autor: Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2006, Brasil, p. A4
Conjuntura Usinas anteciparão moagem de cana e governo vai estudar programa de estocagem do combustível
Usineiros e o governo federal, reunidos ontem em Brasília para discutir um teto para o álcool carburante, acabaram fechando um acordo. O teto para os preços do álcool ficou estabelecido em R$ 1,05 para esta entressafra (de janeiro a abril), ante os preços de R$ 1,08 cobrados nesta semana. Os usineiros se comprometeram a antecipar a moagem de cana no Centro-Sul de maio para março para garantir o abastecimento no mercado doméstico. O governo, por sua vez, disse que vai estudar um programa de estocagem para o combustível para evitar as flutuações de preços, comum durante a entressafra do produto. A redução de mistura de álcool na gasolina de 25% para 20% está descartada. Na reunião realizada na tarde de ontem, o álcool mobilizou quatro ministérios. Participaram do encontro os ministros da Agricultura, Roberto Rodrigues; da Fazenda, Antonio Palloci; da Casa Civil, Dilma Roussef; e os secretários-executivos Nelson Hubner (Minas e Energia) e Murilo Portugal (Fazenda), além dos empresários do setor sucroalcooleiro. O presidente da Unica (União da Agroindústria Canavieira de São Paulo), Eduardo Carvalho, considerou o encontro de ontem "histórico" porque significa que não vai haver mais pressão das usinas no preço do álcool no período mais crítico da entressafra. O ministro Rodrigues informou que o próximo passo do governo, além de estudar a ampliação dos estoques, é negociar com as distribuidoras de combustíveis que os benefícios do acordo cheguem na mesma proporção ao consumidor. Segundo Carvalho, não houve, durante a reunião, barganha, troca ou até mesmo discussão de valores relativos ao financiamento necessário para ampliar, a partir da próxima safra, a capacidade dos estoques. "Ninguém trabalha para perder dinheiro, mas vamos fazer o sacrifício de garantir o abastecimento nesta apertada entressafra, sem aumentar os preços nas usinas. Sem esse acordo, ninguém saberia o preço amanhã." Na análise do secretário-executivo da Fazenda, Murilo Portugal, o mais importante aspecto do acordo foi a garantia do abastecimento. "Não estávamos preocupados com o pequeno peso do álcool no IPCA, que é de apenas 1%. Foi uma enorme demonstração de maturidade do setor, compreendendo o estresse da entressafra." Quanto à necessidade de ampliar os estoques de álcool, medida que evitaria as flutuações de preços nos momentos de menor oferta, Rodrigues revelou que representantes da Bolsa Mercantil & Futuros (BM&F) já estão conversando com o governo. Rodrigues admitiu que, com o atual nível dos juros, esse financiamento por meio de mecanismos privados fica prejudicado. O ideal, segundo Rodrigues, é alcançar nas entressafras estoques de aproximadamente 3,5 bilhões de litros, suficientes para a demanda de três meses. Durante a reunião ficou decidido que o ministro Palocci vai encaminhar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a recomendação de baixar de 20% para zero a alíquota do imposto de importação do álcool. Para Rodrigues, essa medida tem caráter de desregulamentação do mercado. Segundo Carvalho, o setor não vê essa decisão como uma ameaça. "Não precisamos dessa proteção tarifária." Segundo a Unica, o setor vive uma "fantástica" perspectiva para o etanol, o que exige investimentos para a expansão da produção e obriga a um diálogo permanente com o governo. Para Carvalho, a demanda pelo produto no mundo é "altíssima", até mesmo pelos elevados preços do petróleo. Quanto aos custos, desde o acordo fechado em fevereiro de 2003 - o preço do anidro na usina tinha sido fixado em R$ 1 -, os produtores e o governo reconhecem que eles aumentaram bastante. A variação da inflação nesse período superou os 20%. Hubner também alertou que o governo federal não sabe o impacto do acordo para o consumidor porque o preço nos postos depende de outros fatores como, por exemplo, as diferentes alíquotas do ICMS, as margens das distribuidoras e o frete. Para as usinas, apesar do acordo, a intervenção do governo sobre os preços incomoda. "Mas entendemos que é uma decisão de curto prazo", disse uma fonte das usinas. O setor sucroalcooleiro passou a ser desregulamentado desde 1997, quando os preços e a oferta deixaram de ser controlados pelo governo. Uma fonte do governo argumenta que a intervenção está diretamente ligada ao fato de o álcool ser um combustível, produto estratégico para o governo federal. (Colaborou Mônica Scaramuzzo, de São Paulo)