Título: Sem margem de manobra, Serra usa vantagem em pesquisas como trunfo
Autor: Cristiane Agostine e Raquel Salgado
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2006, Política, p. A7

Sem margem de manobra para se movimentar com a mesma liberdade do governador Geraldo Alckmin, o prefeito de São Paulo, José Serra, trata de fazer a manutenção da vantagem obtida até agora na corrida pela indicação do candidato do PSDB à Presidência da República. Se a decisão a ser tomada por um colégio de cardeais tucanos fosse hoje, Serra certamente seria o escolhido, não só por sua posição privilegiada nas pesquisas de opinião, mas também pelo paciente trabalho de bastidor que desenvolve há pelo menos dois anos e que intensificou desde que se tornou a opção mais viável para bater o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições. Com Alckmin em situação tática mais favorável, em condições de criar fatos políticos que o prefeito está impedido de criar - como o anúncio de que deixará o cargo no prazo determinado pela legislação, resta a Serra trabalhar "por dentro". O lance mais eficiente, segundo integrantes do colégio de cardeais, se deu em outubro do ano passado: Serra foi conversar com o senador Tasso Jereissati (CE) sobre sua sucessão no PSDB e antes mesmo que o interlocutor dissesse alguma coisa afirmou que o considerava o melhor candidato para a função. Tasso era partidário da candidatura Alckmin, mas, além disso, era anti-Serra. Em 2002, como se recorda, o senador cearense era cotado para ser o candidato do PSDB, foi atropelado por Serra e acabou apoiando a candidatura de seu conterrâneo Ciro Gomes, pelo PPS. Desde que voltou ao Brasil, após um período de estudos em Princeton (EUA), Serra desencadeou um trabalho para se reaproximar de Tasso. Com o apoio a seu nome para a presidência do partido deu o xeque-mate: Tasso ainda é Geraldo Alckmin, mas deixou de ser anti-Serra, segundo tucanos graduados. Outro problema em potencial para Serra poderia ser o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, também eventual candidato à indicação tucana. Só nos últimos meses de 2005 ele esteve pelo menos quatro vezes no Palácio da Liberdade, sede do governo mineiro, pública ou secretamente. Aécio, que não deve ter dificuldades para se reeleger governador, tem a intenção de se candidatar a presidente em 2010. Serra então acionou seus aliados no Congresso, que trataram de ressuscitar uma proposta de emenda constitucional que prevê o fim da reeleição e a ampliação do mandato do presidente de quatro para cinco anos. A proposta parece ter sido feita sob medida para o figurino de Aécio, mas interessa também a outros tucanos que pensam disputar o Palácio do Planalto. O compromisso evidente de Serra é em votar a emenda, de vez que não tem como garantir a aprovação. É um trunfo que o prefeito de São Paulo tem, pois Alckmin, pelo menos até agora, não assumiu qualquer compromisso com a proposta. Outro cardeal tucano ouvido pelo Valor diz que talvez essa venha a ser uma condição a ser exigida pelo colégio aos pré-candidatos lançados. Hostilizado pelo PFL em 2002, Serra tratou de reconstruir as pontes. Hoje um de seus principais interlocutores é o presidente do partido, Jorge Bornhausen (SC), que nas eleições passadas dizia que iria "para a praia pescar" se o candidato tucano fosse Serra. Atualmente, é cotado até para vice na chapa PSDB-PFL. Além de Bornhausen, o prefeito se reaproximou também de Antonio Carlos Magalhães e há bem pouco tempo recebeu o neto do cacique baiano, ACM Neto, para uma conversa. Por enquanto, apenas o clã Sarney ainda é arredio, muito embora já tenha ocorrido uma reaproximação com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. É a essa costura que Serra dá "manutenção", segundo expressão de seus aliados mais próximos, cunhada aliás por ele mesmo. Não é descartada a hipótese de o prefeito também criar fatos políticos, como as declarações de Cesar Maia empenhando o apoio do PFL ou dizendo que, se o candidato for Alckmin, os pefelistas lançam um nome próprio. A solução dos sonhos do PFL, aliás, é Serra candidato a presidente, e Geraldo Alckmin ao Senado - levaria sem menor esforço o governo e a Prefeitura de São Paulo. O esforço de "manutenção" é justificado pelas pesquisas. Segundo os números em poder de São Paulo, à exceção da região Sudeste, onde Alckmin está bem situado, a vantagem de Serra para Lula é de 60 a 25 no Sul, 59 a 28 no Norte e no Centro Oeste e a diferença no Nordeste caiu para três pontos. Em outra sondagem, 48% dos eleitores de São Paulo opinam que ele não deve deixar a prefeitura para concorrer, contra 45% que aprovam. Mantendo essa posição ou crescendo, Serra é o favorito. Se Alckmin no entanto mostrar que pode igualmente bater Lula e evitar que Anthony Garotinho passe para o segundo turno, no lugar do PSDB, todas as dificuldades de Serra passam a ser potencializadas. O governador vira favorito.