Título: Brasil negocia com EUA venda de aviões à Venezuela
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2006, Internacional, p. A9

O chanceler Celso Amorim disse que o governo brasileiro abriu negociações com a Casa Branca para tentar liberar a venda de 36 aviões militares da Embraer para a Venezuela. Preocupados com a transferência de tecnologia americana, presente no sistema de comunicação das aeronaves, os EUA comunicaram a intenção de barrar o negócio, confirmou Amorim. "Há indicações nesse sentido, mas espero que elas não sejam definitivas", afirmou o chanceler, demonstrando inconformismo com a ingerência. Ele disse que conversará sobre o assunto "em detalhes" com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que anunciou a transação com a Venezuela em visita a Caracas, em fevereiro do ano passado. "Uma restrição desse tipo, caso venha a se confirmar, seria contraproducente", acrescentou. A tentativa americana de vetar o negócio foi anunciada pelo presidente Hugo Chávez na terça-feira. O negócio é estimado em US$ 500 milhões e inclui a venda de 12 AMX-T, de treinamento de combate, e de 24 turboélices Super Tucano. Chávez quer a transferência da tecnologia utilizada pela Embraer para o desenvolvimento de uma indústria aeronáutica venezuelana. Amorim cobrou "um pouco de visão" dos EUA para o tratamento da questão e alertou que, se a compra não for feita do Brasil, a Venezuela buscará outro fornecedor. Essa hipótese foi levantada pelo próprio Chávez, que cogitou a aquisição de aeronaves chinesas se Lula não conseguir reverter a indisposição americana em permitir a venda pela Embraer, na forma desejada pela Venezuela. O chanceler disse que o Brasil é contra restrições à transferência de tecnologia, "sobretudo quando não há nenhum tipo de sanção internacional, como não há no caso da Venezuela". Complementou ainda que a proibição americana pode atrapalhar desnecessariamente o já complicado diálogo Washington-Caracas. O ministro brasileiro aproveitou para alfinetar a postura americana de enfrentamento com o país vizinho. "Não achamos que a Venezuela represente uma ameaça para ninguém, é um país pacífico", avaliou o chanceler. "A questão de concordar ou não com a política interna de um país não deve ser razão para criar restrições à transferência de tecnologia, principalmente no caso de um avião que é basicamente defensivo e pode ser útil até no combate ao narcotráfico, mas não representaria desequilíbrio [militar] na região", disse. Chávez afirmou que a restrição americana à compra de aviões da Embraer é semelhante à tentativa da Casa Branca, em novembro do ano passado, de bloquear a aquisição de 12 aeronaves militares e oito barcos de patrulha da Espanha. O governo espanhol teria ignorado a Casa Branca para oficializar a transação. Os modelos Super Tucano vendidos pela Embraer à Venezuela foram negociados também com a Força Aérea Colombiana, no fim de 2005, que adquiriu 25 aeronaves de combate tático. Os primeiros cinco aviões serão entregues neste ano. A Casa Branca já havia demonstrado preocupação com a compra de fuzis russos AK-47 pela Venezuela. O medo dos americanos era que as armas fossem indevidamente transferidas para rebeldes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).